terça-feira, 25 de outubro de 2011

Ou as civilizações aventuram-se no mundo exterior ou tornam-se extintas. ~ Carl Sagan ~


A humanidade deve subir acima da Terra, para o topo da atmosfera e mais além, para só então compreender o mundo em que vivemos. ~ Sócrates, 500 aC ~


Nota do Blog: citações importantes numa era em que precisamos reconhecer, cada ser humano, cada setor de atividade, cada nação e a humanidade como um todo, nosso lugar e como nos conectamos com o todo. Pensando na disputa entre ruralistas e ambientalistas, falta olhar o mundo do outro lado da cerca!

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

O futuro da comida

A sustentabilidade é o maior desafio global. Por isso, o desenvolvimento de um país, por mais exemplar que venha a ser, só poderá ser realmente sustentável quando a pegada ecológica mundial deixar de ultrapassar a capacidade de regeneração da biosfera. Não é diferente em termos setoriais. O setor agropecuário só será sustentável se também o forem o industrial, o terciário e a mineração. 


Por que, então, a bandeira da “agricultura sustentável” passou a ser tão brandida e cada vez mais legitimada? Porque é o melhor slogan para as práticas que menos contribuem à insustentabilidade global. Elas vinculam a busca de rentabilidade econômico-financeira ao compromisso ético da responsabilidade socio-ambiental. Na versão popularizada pelo famoso consultor britânico John Elkington, elas combinam os já célebres “três pilares”, que em inglês começam com a letra “p”: lucro (profit), justiça social (people) e conservação ambiental (planet). 

Apesar da multiplicação de admiráveis esforços nessa direção, o agronegócio brasileiro ainda está muito distante desse roteiro. Compactua com o profundo atraso educacional que nutre as históricas desigualdades sociais, e causa a maior parte das emissões brasileiras de gases de efeito estufa, anulando a vantagem de o Brasil contar com a mais limpa matriz energética dos países de alto e médio desenvolvimento. Provém de seus desmatamentos maisde 76% das emissões de dióxido de carbono. E a atividade que mais os induz, a imensa pecuária bovina, ainda contribui com mais de 63% das emissões de metano e mais de 43% das de óxido nitroso. 


Essa gigantesca expansão da pecuária não é impulsionada apenas pelo bem-vindo acesso ao consumo de proteínas animais por contingentes populacionais que logram sair da pobreza. Ela também resulta de nocivo exagero carnívoro nas dietas das classes médias e altas, que contraria princípios básicos de alimentação saudável, mas continua a ser fortemente instigado pelas grandes corporações da cadeia: frigoríficos, indústrias de processamento e redes de supermercados e de fast-food. Tudo isso mostra que avanços na direção de uma agricultura sustentável dependerão de cruciais mudanças nos atuis padrões de consumo alimentar, que, por sua vez, sofrerão resistências de natureza cultural e psicológica. Um processo que sópoderá exigir muito mais tempo do que se costuma imaginar. Daí o grande mérito da escolha temática para este número da revista GR, sobre a qual duas referências são indispensáveis: o opúsculo de Eduardo Ehlers O que é agricultura sustentável e O novo manual de negócios sustentáveis, de Roberto Smeraldi. 


Para Ehlers, a agricultura sustentável será uma nova fase na longa história da dinâmica do uso da terra, na qual o uso abusivo de insumos industriais e de energia fóssil será substituído pelo emprego intensivo de conhecimen- to ecológico. Já o capítulo do novo manual de Smeraldi intitulado “O futuro da comida” realça as oportunidades de investimentos que poderão transformar as herdadas vantagens comparativas do Brasil em vantagens competitivas de longo alcance. 


A tendência será a produção de qualidade que tenha como protagonista a população local e a diversidade. Com uso de tecnologia avançada para aprimorar tradicionais processos artesanais, fortalecimento do cooperativismo e formação de consórcios de indicação geográfica. Bases da futura marca Brasil de alimentos saudáveis, fornecidos por uma agropecuária cada vez menos insustentável. 


JOSÉ ELI DA VEIGA é professor da pós-graduação do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo e e do mestrado profissional em sustentabilidade do Instituto de Pesquisas Ecológicas




MPF pode ir ao STF contra o novo Código Florestal

02/09/2011
Notícia do Diário do Pa

A aprovação do novo Código Florestal Brasileiro, ainda em trâmite no Senado, poderá levar o Ministério Público Federal (MPF) a recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). O motivo é que o projeto do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator do novo código, estaria recheado de inconstitucionalidades. “Vamos ter de trabalhar nesse contexto. Acreditamos que o Poder Legislativo esteja aberto às discussões. Não queremos, mas talvez tenhamos de ir ao STF”, disse o procurador da República José Leônidas Bellem.

O procurador coordenou ontem pela manhã a mesa-redondaO Novo Código Florestal em perspectiva”, durante o IX Encontro Nacional de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, realizado pelo Ministério Público Federal em Belém.

O Código Florestal, do jeito que está sendo levado ao Senado, é inconstitucional por tratar desigualmente os cidaos, beneficiando quem descumpriu a lei, beneficiando aqueles que praticaram o desmatamento ilegal, dispensando a recuperação de áreas e o pagamento de multas, além deo trazer qualquer benefício concreto para quem cumpriu a lei. É uma licea para desmatar, porque, na hora que você perdoa quem fez errado, incentiva outros a fazerem o mesmo”, diz o advogado Raul Telles do Valle, membro da organizaçãoo governamental Instituto Socioambiental (ISA).

Valle participou da mesa-redonda e apresentou uma serie de problemas que envolvem o novo Código Florestal. Entre esses problemas estão o fato de que há uma dispensa da recuperação de áreas de proteção permanente que tenham sido desmatadas até 2008. “Também dispensa de recuperação de reserva legal para imóveis de até quatro módulos fiscais, ou seja, mais de 90% dos imóveis rurais”.

Segundo Raul Valle, o novo código também incentiva novos desmatamentos. Isso porque o desmatador pode compensar essa derrubada em reservas legais em outro Estado, usando espécies exóticas em até 20 anos. Ou seja, se um produtor decidir desmatar uma área com uma vegetação diversificada, pode, em outro Estado, plantar eucaliptos, por exemplo, que estaria isento de qualquer cobraa legal.

Outro ponto destacado negativamente foi a retirada do direito da sociedade de participar da gestão ambiental e o enfraquecimento do legítimo controle social sobre assunto de interesse comum. É que a legislação ambiental brasileira foi feita com base no princípio constitucional de que a sociedade civil tem o direito de tomar parte nos processos de decisão que dizem respeito à qualidade ambiental.

Sociedade aindao absorveu o novo código

A lei atual dá tanto ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) como aos Conselhos Estaduais Ambientais - órgãos que contam com a participação de representantes de trabalhadores, empresários e ambientalistas, dentre outros membros da sociedade - a competência necessária para definir os casos excepcionais em que se é permitido desmatar áreas de preservação permanente (APPs) a título de interesse social, utilidade pública ou baixo impacto. A partir do relatório de Aldo Rebelo, essa decisão pode ser tomada unilateralmente por governadores estaduais ou pelo governo federal. “É um retrocesso”, diz José Mauro Ó de Almeida, consultor jurídico do Ministério do Meio Ambiente.

Segundo Valle, há um discurso implícito no texto do novo código, de que a conservação de florestas só interessa aos concorrentes comerciais do Brasil, que gostariam de limitar a expansão da produção brasileira. “É uma ideia falsa”, diz ele. “Isso porque sem desmatar nenhuma área podeamos dobrar a produção agrícola e manter o nosso poder de fogo bovino”. Atualmente, segundo o ISA, há 67 milhões de hectares destinados à agricultura no Brasil e 211 milhões de hectares destinados às pastagens.

Aprovado pela Câmara Federal no dia 24 de maio, dia do assassinato do casal de ambientalistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, em Nova Ipixuna, o novo Código Florestal aindao foi absorvido pela sociedade brasileira, segundo os procuradores da República. “Ele visa abrir uma nova fronteira agrícola na Amazônia”, diz José Mauro. “A mensagem que o governo federal manda é que é um estado letal ao meio ambiente”, diz o procurador da República no Mato Grosso, Patryck Ayala. “A chance desse código ser aprovado é grande e a sociedadeo está percebendo a importância desses impactos”, avalia José Leônidas (Diário do Pará)

Ministério Público Analisa Alterações no Código Florestal, e conclui:


47. CONCLUSÃO E ENCAMINHAMENTOS 

Por todos os argumentos expostos acima, é forçoso concluir que o PL 1876/99 apresenta diversas violações à Constituição da República, omissões, deficiências de técnica legislativa e representa grave retrocesso na Política Nacional de Meio Ambiente, não trazendo aperfeiçoamentos relevantes

Aprofunda distorções e mergulhará o país em grande insegurança jurídica, por conta de ações diretas de inconstitucionalidade, ações civis públicas, descumprimento de compromissos internacionais, por exemplo, além dos gravíssimos e irreparáveis danos aos ecossistemas e recursos naturais. 

Por essa razão, a melhor solução deveria ser a rejeição total do referido projeto de Lei e a constituição de uma comissão de especialistas nos diversos campos do conhecimento humano, inclusive o Direito, para identificar de forma técnica e fundamentada quais são as imperfeições e virtudes do atual Código e propor as alterações necessárias. 

O NOVO CÓDIGO FLORESTAL E A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, 4a CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃ, GT ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, Brasília, 09 de setembro de 2011, 177 p.

domingo, 23 de outubro de 2011

Moratória da soja não detém desmatamento

Gustavo Vieira
21 de Outubro de 2011
Soja plantada e colhida na Amazônia brasileira. Foto: Gustavo Vieira
Por pressão de organizações da sociedade civil, em julho de 2006 empresas e governo se uniram a ambientalistas para boicotar produtores rurais que desmatavam a floresta para plantar soja. Nascia a moratória da soja. O Grupo de Trabalho da Soja (GTS) foi composto pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e Associação Brasileira dos Exportadores de Cereais (Anec) que, juntas, detém 90% dos compradores do grão. Também fazem parte do Grupo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ministério do Meio Ambiente e as organizações World Wild Foundation (WWF), The Nature Conservancy (TNC), Conservação Internacional (CI), Amigos da Terra, Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém e Greenpeace.

Juntos, decidiram monitorar imagens de satélite e tirar mercado de quem plantava soja destruindo a Amazônia. A moratória é bem vista no mercado internacional, que estava deixando de comprar o produto que viesse de áreas amazônicas desmatadas. No dia 7 deste mês um grupo de empresas internacionais consumidoras da soja brasileira - McDonald's Europa, Mark and Spencer, Carrefour, entre outras - enviou carta de apoio à iniciativa reforçando sua intenção de que indústria, governo e sociedade continuem a atuar juntos para modificar a cadeia produtiva agrícola brasileira neste momento em que as leis ambientais estão sob ameaça no congresso nacional.


Apesar do acordo, no entanto, desde que a moratória foi firmada 11.698 hectares de floresta foram derrubados para dar lugar ao grão, conforme informações do relatório anual do GTS que, semana passada, estendeu a moratória até janeiro de 2013. Esta cifra equivale a apenas 0,39% da área total de soja plantada em todo o país. Na Amazônia, ocupa 1,94 milhões de hectares.


Nos monitoramentos de 2007 a maioria das propriedades escolhidas tinha apenas vestígios de queimadas e corte-raso. Nas imagens de 2010 muitas já se encontram com plantio de arroz, cultura que antecede a soja.

Imagens do monitoramento 2010-2011 sobre fazenda no município de Claudia, no Mato Grosso: de 229,86 hectares, 40,60 ha são de plantação de soja. Fonte: Abiove
Nas imagens monitoradas ainda não é possível saber quem são os responsáveis pelo desmatamento, uma vez que poucos produtores fizeram o Cadastro Ambiental Rural (CAR). “Vamos estimular a adesão para um dia poder responsabilizar quem desmatou para plantar”, afirma Carlo Lovatelli, da Abiove. O CAR é parte do Programa Mais Ambiente do governo federal e é o documento onde o proprietário rural regulariza a posse de sua propriedade, declara quais são suas áreas de preservação permanente (reconhecidas como de utilidade pública, ficam dentro do imóvel rural e devem ser preservadas conforme o atual Código Florestal). O CAR permite que multas ambientais sejam revertidas em prestação de serviços e também é um instrumento de fiscalização, pois o cadastro da propriedade permite que a mesma seja monitorada.

Programas federais como o Terra Legal e o próprio Mais Ambiente – onde encontramos o Cadastro Ambiental Rural - são voluntários e têm baixíssima adesão entre os produtores. Ainda assim o monitoramento feito pelo GTS melhorou - o Inpe subiu seus monitoramentos de plantio de soja de 49 para 375 mil hectares nos últimos quatro anos. Aumentou a sinergia de informações in loco e dos órgãos ambientais estaduais, mas sem o cadastro fica difícil identificar os proprietários. "Há uma necessidade de mudar a escala de aplicação dos instrumentos de governo para a preservação do meio ambiente, mas estamos investindo nas estruturas. O apoio dos compradores de soja ao CAR é fundamental”, disse a ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira.

 


Atuação conjunta

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) discorda do trabalho do GTS e em nota oficial desta semana desqualifica a legitimidade dos participantes. “As ONGs internacionais envolvidas na dita Moratória da Soja não têm qualquer legitimidade para usar instrumentos criados pelo poder público, a exemplo do CAR, com o claro objetivo de achacar os produtores rurais brasileiros, assumindo funções que não lhes competem”, assina a nota a presidente da CNA, senadora Kátia Abreu.

O Brasil é o segundo maior exportador de soja do mundo atrás dos Estados Unidos. A safra do país entre 2011-2012 está oficialmente estimada entre 72,18 e 73,29 milhões de toneladas, abaixo do recorde de 75,3 milhões do ciclo anterior (2010-2011) por conta da expectativa de menor produtividade, segundo a Secretaria de Comércio Exterior.
Já para o presidente da Abiove, Carlo Lovatelli, a iniciativa é uma missão bem sucedida, pois melhorou a imagem dos associados e foi além do histórico confronto entre produtores rurais e ambientalistas. "Hoje a soja não é mais o principal vetor de desmatamento da Amazônia. Quem desmatar para plantar vai ficar sem mercado para vender seu produto. O apoio de nossos compradores internacionais prova isso."

"A decisão da indústria vai além da lei. Atinge empresas que não querem comprar soja de desmatamento, pois seus consumidores não querem comer a destruição da Amazônia", diz Paulo Adário, do Greenpeace. "Vamos ter que decidir juntos qual é a melhor lei para preservar a nossa biodiversidade e os mercados mundiais para nossos produtos", complementa a ministra Izabella Teixeira. A moratória da soja não tem data para acabar.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Sinceridade nas florestas, por favor

ÉPOCA (Opinião)

O fogo é usado para transformar Florestas em pasto na Amazônia. Não é só o Brasil que regula esse tipo de prática em terras privadas, segundo um novo estudo

Um estudo feito por duas respeitáveis entidades Ambientalistas, o Proforest e o Imazon, derruba um dos principais argumentos da bancada ruralista no debate sobre o Código Florestal brasileiro. A tese dos ruralistas, que serviu de inspiração ao projeto do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), é que o Brasil seria um dos poucos países do mundo onde o Estado teria o direito de limitar o Desmatamento em terras privadas e de impor punições a quem descumpre a lei. Realizado a pedido do Greenpeace, o estudo mostra uma realidade diferente.

Na França, a conversão de qualquer área de reserva com mais de 4 hectares requer permissão do governo. Ela só pode ser concedida se comprovadamente não causar prejuízos ambientais. O Japão também proíbe o Desmatamento das Florestas tanto estatais como privadas , exceto em circunstâncias excepcionais. Dos 11 países analisados, o único que não realiza nenhuma forma de controle é a Indonésia, que não é modelo ambiental nem mesmo entre os campeões da motosserra. Mesmo na China, uma referência para o desenvolvimento acelerado em condições que guardam semelhanças entre os países emergentes, como o Brasil, a lei proíbe o uso de Florestas para projetos de mineração e infraestrutura. Ali também é proibido destruir encostas íngremes, Florestas e zonas pantanosas.

Nada mais equivocado do que opor a defesa do Meio Ambiente ao desenvolvimento econômico. Só resolvendo o impasse entre Ambientalistas e ruralistas, o Brasil terá uma lei que dê segurança para a produção rural e para a preservação ambiental. Quanto menos hipocrisia e manipulação de dados houver no debate, maior a chance de um acordo sensato e realista, de que o Brasil precisa com urgência.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Juízes pela Democracia também pede rejeição de reforma do Código

A AJD (Associação dos Juízes para a Democracia) divulgou uma nota pública em que também critica o PLC nº 30/2011, considerando-o inconstitucional. O texto pede que os argumentos elencados pela SBPC e a ABC sejam discutidos pelos senadores e que seja dado um prazo para a elaboração de pesquisas que possam embasar um novo Código Florestal (leia abaixo).
NOTA PÚBLICA SOBRE O PROJETO DE LEI DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL


A ASSOCIAÇÃO JUIZES PARA A DEMOCRACIA - AJD, entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade trabalhar pelo império dos valores próprios do Estado Democrático de Direito e pela promoção e a defesa dos princípios da democracia pluralista, a propósito do PLC 30/2011, em trâmite no Senado Federal (PL 1876/99, aprovado na Câmara), vem a público manifestar o seguinte:

A tutela (“PRESERVAÇÃO E RECUPERAÇÃO”) do meio ambiente e dos “processos ecológicos essenciais” e a provisão de manejos ecologicamente sustentáveis são deveres incondicionais do Poder Público por determinação expressa da Constituição Federal, a teor do disposto em seu artigo 225. E um meio ambiente ecologicamente equilibrado é, por disposição constitucional, essencial à sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações, motivo pelo qual induvidosa a condição de DIREITO FUNDAMENTAL da tutela socioambiental, instrumento que é de efetividade da DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, sendo essa, por sua vez, fundamento da República Federativa do Brasil (art. 1, III da CF/88).

É por isso que Constituição brasileira exige estudos prévios de impacto ambiental para qualquer obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, o que implica, inexoravelmente, a mesma exigência quando se trata da alteração de toda uma legislação protecionista das florestas brasileiras. Contudo, esse estudo, oficialmente, não existe.

O que existe é a tentativa desesperada da comunidade científica em ser ouvida para tentar impedir a aprovação do PLC 30/2011, que acarretará (a) riscos à própria continuidade da Floresta Amazônica, que tem influência na regulação do clima e na preservação dos recursos hídricos de todo o país, (b) a extinção de mais de 100 mil espécies em risco de extinção e de biomas inteiros, (c) a escassez dos recursos hídricos, (d) a desertificação, (e) a potencialização das enchentes e (f) desmoronamentos em áreas urbanas. Além disso, a aprovação desse projeto implicará a impossibilidade do cumprimento da obrigação internacional que o Brasil JÁ ASSUMIU, na COP15 de Copenhagen, de redução de emissão de CO2 na atmosfera.

Essas conclusões vêm dos estudos do grupo de trabalho formado pela SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e ABC - Academia Brasileira de Ciência , das cartas publicadas por cientistas, em julho e setembro de 2010, na Revista Science (“Legislação brasileira: retrocesso em velocidade máxima?” e “Perda de Biodiversidade sem volta”), e, ainda, do Comunicado n. 96 do IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo Federal .

E os cientistas também garantem que, paralelamente aos impactos insanos do PLC 30/2011, os recursos naturais de que (ainda) dispomos têm grande valor econômico, havendo inúmeras alternativas sustentáveis - e ainda mais rentáveis - à sua exploração, bastando, para isso, a implementação de políticas públicas de manejo sustentável, notadamente junto à agricultura familiar, tal como determina a Constituição Federal.

Além disso, esses cientistas garantem, ainda, que a produção alimentícia brasileira só estará, de fato, ameaçada, se os recursos a ela imprescindíveis (solo, água, clima, biodiversidade) não forem preservados. Ou alguém duvida de que sem água e solos férteis faltará alimentos ao ser humano?

Não há tempo para prosseguir com esse sistema de produção agropecuária que se desenvolve às custas das máquinas, dos venenos e, notadamente, da degradação ambiental.

A hora de refletirmos é agora!

A hora de ouvirmos as advertências alarmantes da ciência é agora!

A AJD diz NÃO ao PLC 30/2011, por sua patente inconstitucionalidade material, à luz dos dados científicos desvelados, e protesta por sua rejeição, ou, por ora, ao menos, que o Senado Federal conceda à ciência o prazo solicitado (mínimo de dois anos) para elaboração aprofundada de estudos técnicos de impactos ambientais, que sirvam de subsídios técnicos e públicos às alterações legislativas pretendidas.


Mais informações:
ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA
Rua Maria Paula, 36 - 11º andar - conj. 11-B - tel./ FAX (11) 3105-3611 - tel. (11) 3242-8018
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ASSOCIAÇÃO JUÍZES PARA A DEMOCRACIA/AJD

SBPC e ABC propõem ao Senado mudanças no projeto de reforma do Código Florestal


[13/10/2011 18:59]
 
Principais associações científicas do País voltam a se manifestar contra proposta que desfigura lei ambiental, mas agora detalham críticas e soluções para pontos específicos. Pesquisadores reafirmam que legislação não é entrave para expansão agropecuária e reforçam importância da conservação das matas de beira de rio. Associação Juízes para a Democracia também rejeita reforma do Código

A SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e a ABC (Academia Brasileira de Ciências) encaminharam aos senadores, na terça-feira (11/11), um documento com propostas de mudança para o PLC (Projeto de Lei da Câmara) Nº 30/2011, que tramita no Senado e desfigura o Código Florestal, abrindo caminho para a ampliação do desmatamento no País.

As duas instituições afirmam que os senadores precisam “corrigir os equívocos verificados na votação da matéria”, aprovada pela Câmara em maio (veja aqui). A CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado referendou o projeto no dia 21/9 sem avaliar seus aspectos constitucionais, razão de ser do colegiado (saiba mais). O PLC passará por mais três comissões antes de chegar ao plenário.

O documento apresentado agora complementa o livro lançado em abril pelas duas associações. A publicação avaliava que a proposta de mudança do Código Florestal, então em tramitação na Câmara, carecia de base científica (veja o livro).

A novidade é que agora os cientistas debruçaram-se sobre os principais problemas do texto em tramitação no Senado e apontam soluções para cada um deles.

“Nosso primeiro trabalho foi mais de cunho científico, mostrando como a ciência poderia colaborar. Mas nas vezes em que fomos ao Congresso, nos cobraram propostas concretas. Esse documento tem esse objetivo”, explica o professor José Antônio Aleixo, coordenador do grupo de trabalho sobre Código Florestal da SBPC e da ABC.

Aleixo está mais otimista com relação à votação do projeto no Senado e considera que a casa é mais receptiva às posições da ciência. “No Senado, a discussão está mais tranquila, sem aquele clima de embate entre ambientalistas e agronegócio”.

Proteção para APPs

Ao contrário do relatório do senador Luiz Henrique (PMDB-SC), o documento da SBPC e da ABC defende, entre outros pontos, que “todas as Áreas de Preservação Permanente (APP) de beira de cursos d’água devem ter sua vegetação preservada e naquelas em que essa vegetação foi degradada elas devem ser integralmente restauradas” (leia a íntegra do documento).
O texto afirma que a delimitação dessas APPs precisa ser feita de acordo com a lei vigente, ou seja, desde o leito maior do curso de água, medido na época da cheia. O relatório vindo da Câmara prevê que essa medição seja feita a partir do leito médio, o que significa na prática uma redução linear de todas as APPs de beira de rio, independente da largura que a nova legislação venha a adotar para essas áreas.

O documento da SBPC e ABC critica ainda a compensação de RL (Reserva Legal) dentro do mesmo bioma prevista no relatório. De acordo com o texto vindo da Câmara, um produtor rural que não tenha RL poderia compensá-la em locais distantes, até em outros estados, pagando por “áreas que não têm equivalência nem em termos de composição e estrutura, nem de função” ecológica. Os cientistas defendem que a compensação seja feita dentro do mesmo ecossistema ou, se no mesmo bioma, em áreas prioritárias para conservação que tenham a mesma importância ambiental daquelas que estão sendo compensadas.

Logo em seu primeiro tópico, o texto das duas organizações científicas desmistifica o argumento dos defensores do novo Código Florestal de que a lei vigente impede a expansão da produção agrícola. Segundo SBPC e ABC, o principal obstáculo a essa expansão é a ausência de uma política agrícola capaz de garantir assistência técnica, preços, insumos, estoques reguladores, armazenamento e infraestrutura – e não a legislação ambiental.

O texto volta a afirmar que “bastaria um aumento marginal da produtividade da pecuária brasileira, que é notoriamente ineficiente e ocupa 2/3 das áreas agrícolas disponíveis hoje no Brasil, para disponibilizar em torno de 60 milhões de hectares para a agricultura, o que mais do que dobraria a área agrícola atual”.

Todas as propostas estão referenciadas em trabalhos científicos. Além dos presidentes das duas instituições, assinam o texto cientistas renomados nacional e internacionalmente, como Carlos Nobre, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do MCT (Ministério de Ciência e Tecnologia); Tatiana Deane de Abreu Sá, pesquisadora e ex-diretora da Embrapa; e Maria Manuela Carneiro da Cunha, professora emérita da Universidade de Chicago.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

NOVAS CONSIDERAÇÕES DA SBPC E DA ABC ACERCA DA REFORMA DO CÓDIGO FLORESTAL

Nota do Blog: o Grupo de Trabalho da SBPC e ABC continuou a trabalhar na proposta legislativa de alteração do Código Florestal, agora para atender demanda especifica dos Senadores. O documento resultante da analise do projeto de lei pode ser encontrado no site da SBPC (aqui). Abaixo reproduzido o sumario executivo do documento.

SUMÁRIO EXECUTIVO

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) concordam com a necessidade de reformulação do Código Florestal vigente (Lei 4.771/1965) para adaptá-lo às mudanças no uso e ocupação do solo do território brasileiro. No entanto, a atualização do Código Florestal precisa ser feita à luz da ciência e tecnologia hoje disponíveis. O Brasil tem a oportunidade de dar um exemplo ao mundo de uma nova forma de convivência harmoniosa da conservação ambiental com a produção agrícola.

O Senado Federal tem o importante papel de corrigir os equívocos verificados na votação da matéria na Câmara dos Deputados (“substitutivo” ao PL 1.876/1999 e demais PLs àquele apensados e, atualmente denominado Projeto de Lei da Câmara nº 30/2011).

Para auxiliar os Senhores Senadores e Senhoras Senadoras na apreciação da matéria, a SBPC e a ABC vêm ressaltar alguns dos pontos que precisam ser revistos no PLC 30/2011. Cada um desses pontos é analisado em maior detalhe e com a bibliografia pertinente no documento completo, anexo a este sumário executivo. Este documento vem se somar ao livro “O Código Florestal e a Ciência. Contribuições para o Diálogo” publicado pela SBPC e a ABC, em abril de 2011.


1. NÃO EXISTE O DILEMA ENTRE CONSERVAR/PRESERVAR O AMBIENTE E PRODUZIR ALIMENTOS

• O Brasil tem enorme vocação agrícola e deve continuar aumentando a produção de alimentos para o consumo interno e para exportações, mas precisa fazer isso de forma ambientalmente sustentável, permitindo diferenciar os produtos agrícolas brasileiros e atender à demanda atual de mercado. O Brasil já dispõe de área agrícola suficiente para isso, desde que devidamente tecnificada, e ainda dispõe de área natural suficiente para a conservação/preservação de nosso patrimônio biológico.

• A grande limitação para a expansão da agricultura brasileira é a falta de adequação de sua política agrícola, com tecnificação dos pequenos produtores, políticas de preços agrícolas, incluindo insumos, política de estoques reguladores, infraestrutura de escoamento e armazenamento dos produtos agrícolas etc., e não as restrições ambientais colocadas pelo Código Florestal brasileiro. Bastaria um aumento marginal da produtividade da pecuária brasileira, que é notoriamente ineficiente e ocupa 2/3 das áreas agrícolas disponíveis hoje no Brasil, para disponibilizar em torno de 60 milhões de hectares para a agricultura, o que mais do que dobraria a área agrícola atual.

2. ÁREAS DE PROTEÇÃO PERMANENTE (APP) DE BEIRA DE CURSOS D’ÁGUA

• A conservação das vegetações ripárias é condição sine qua non para se manter os serviços ambientais, principalmente, aqueles relacionados com a quantidade e qualidade dos recursos hídricos, e garantir ganhos econômicos. Como destaque dos serviços ambientais característicos das áreas ripárias ocupadas com florestas nativas se podem citar: a filtragem da água e amortecimento de enchentes; a prevenção da erosão e do assoreamento; a manutenção da pesca e da navegação, a conservação da biodiversidade remanescente, o papel de interligação das formações naturais na paisagem (corredores ecológicos) dentre outros. Por isso deve-se considerar que:

• Todas as Áreas de Proteção Permanente (APP) de beira de cursos d’água devem ter sua vegetação preservada e naquelas em que essa vegetação foi degradada elas devem ser integralmente restauradas;

• Deve ser mantida a definição de APP de cursos d’água do Código Florestal atual (“...desde o seu nível mais alto em faixa marginal...”(Art. 2°, a) - redação dada pela Lei nº 7.803 de 18.7.1989);

• A situação existente entre o menor e o maior leito sazonal (as várzeas, os campos úmidos, as florestas paludícolas e outras) deve receber na lei, o mesmo status de proteção das APPs;

• Os usos ribeirinhos das APPs na Amazônia devem receber tratamento diferenciado no Código Florestal, de forma a respeitar a cultura agrícola local e preservar a agricultura de vazante e a produção de várzea, já que se caracterizam como de baixo impacto ambiental;

• Os usos de comunidades tradicionais em APPs de áreas úmidas devem ter reconhecimento específico no Código Florestal como também em outras instâncias federais, dada sua relevância e especificidade;

• A definição dos limites das APPs nas áreas úmidas deve ser calculada a partir do nível mais alto da cheia conforme definição da Convenção de Ramsar (Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional);

• A definição de APP em áreas urbanas deve ser regulada pelo Plano Diretor da cidade.

3. ÁREAS RURAIS CONSOLIDADAS EM APPs

• É um equívoco se considerar que APPs desmatadas até a data de 22 de julho de 2008, para uso alternativo do solo, sejam definidas como atividades consolidadas e por isso possam ser mantidas e regularizadas pelo Plano de Regularização Ambiental (PRA). A maioria dessas APPs foi desmatada em desacordo com a legislação ambiental vigente na época: não há justificativa plausível para adotar a data da publicação da versão mais recente do regulamento da Lei de Crimes Ambientais;

• O termo área rural consolidada no PLC 30/2011 representa, na prática, o uso consolidado das áreas de preservação permanente, o que dispensaria a aplicação da legislação ambiental, garantindo a continuidade de uso agrícola dessas áreas e ignorando os serviços ambientais das APPs nessas áreas de uso consolidadas, serviços esses que foram tão destacadamente valorizados em outros artigos do próprio PLC 30/2011. Além de impedir a continuidade do uso agrícola das APPs, a legislação deve explicitar a necessidade de ações de restauração integral dessas áreas, para o cumprimento desses serviços;

• O pousio, que no PLC 30/2011 pode ser considerado como área consolidada, deve ser redefinido, estabelecendo um limite de área e um período máximo, devidamente ajustado para cada bioma. O pousio em APPs, conforme conceituado no PLC 30/2011, deve ser aplicado apenas para a regulamentação das práticas agrícolas de comunidades tradicionais, respeitando as suas peculiaridades;

• A Constituição Federal Brasileira expressa claramente que não há direito adquirido na área ambiental, pois o meio ambiente pertence à coletividade e, desta forma, os interesses da sociedade se sobrepõem ao direito particular, o que certamente levaria à inconstitucionalidade na regulamentação dessa norma, por ter definido 22 de julho de 2008, como referência para a consolidação de atividades agrícolas em áreas protegidas pela legislação ambiental brasileira;

• A definição de área rural consolidada deve ser retirada do texto, visto não poder haver consolidação de áreas sobre áreas legalmente protegidas, pois não há direito adquirido na área ambiental, principalmente, considerando que essa definição inclui “atividade agrossilvopastoril”. Com isso fica evitada a continuidade das atividades agrícolas em APPs e possibilitada a adoção de ações de restauração;

• A produção de arroz de várzea, pecuária extensiva no pantanal, agricultura de várzea na Amazonas, produção de café, maracujá e uva nas encostas devem ter um tratamento diferenciado e especial na legislação ambiental brasileira, em função dessas culturas serem específicas desses ambientes, ocuparem pequena extensão territorial e pela possibilidade das mesmas serem adequadas tecnicamente para um menor impacto ambiental.

4. MANGUEZAIS E APICUNS COMO ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

• Em função da importância ecológica dos manguezais e apicuns e de todo o gradiente entre eles e, considerando que a conservação/preservação de apenas um deles não vai garantir a conservação/preservação do outro, nem a manutenção da integridade e da funcionalidade dos manguezais, propõe-se a inclusão dos mangues e apicuns como Áreas de Preservação Permanente no texto do PLC 30/2011. As áreas de manguezais que, por algum motivo, tenham sido degradadas historicamente, tendo sua função ecológica comprometida, devem passar por um processo de recuperação ambiental, baseado em várias iniciativas já exitosas nesse sentido.


5. COMPENSAÇÃO DE RESERVA LEGAL

• A compensação não deveria ser prevista no âmbito do BIOMA indistintamente, pois devido a sua heterogeneidade física, biológica e ecológica, poderá levar à compensação de áreas que não têm equivalência nem em termos de composição e estrutura, nem de função. Estudos mostram que, em termos funcionais, os serviços ecossistêmicos prestados pela vegetação natural são muitas vezes restritos ao seu entorno imediato;

• A compensação da Reserva Legal deve ser em áreas mais próximas possíveis, dentro da mesma unidade fitoecológica (mesmo ecossistema), de preferência na mesma microbacia ou bacia, para que haja a desejada equivalência ecológica, de composição, de estrutura e de função;

• A justificativa de que não existem remanescentes naturais na microbacia ou mesmo na bacia hidrográfica para essa compensação e por isso permitir a compensação no BIOMA não é verdadeira, pois essa compensação pode ser feita na legislação atual, em áreas já disponibilizadas historicamente para a agricultura na microbacia ou mesmo da bacia, mas que são áreas de baixa aptidão agrícola e por isso estão atualmente, abandonadas ou ocupadas com atividades agrícolas marginalizadas, na maioria pastagem degradadas sem sustentabilidade econômica, desde que essas áreas sejam devidamente restauradas. Essa compensação seria um excelente instrumento de distribuição de renda no setor agrícola, já que uma área agrícola já consolidada, de alta aptidão, geralmente de propriedade de empresas agrícolas ou grandes produtores, continuaria no processo de produção e seria compensada, por sistema de pagamento de servidão florestal, por essas áreas marginalizadas no sistema de produção, geralmente de propriedade de pequenos agricultores;

• Não deveria ser aberta a possibilidade de compensação indistintamente no âmbito de todo o BIOMA, mas caso isso seja mantido, que seja acrescentado no texto, que essa compensação deve ser feita em áreas com a mesma equivalência ecológica, de composição, de estrutura e de função, e estabelecendo um limite de distância geográfica, o que garantiria que essa compensação fosse feita dentro do mesmo ecossistema da área degradada, exercendo assim o papel da Reserva Legal de proteção dos serviços ecossistêmicos regionais;

• A compensação fora do BIOMA, por tudo que já foi dito, não deve ser sequer considerada nessa discussão, não só por motivos ambientais, que a tornam inaceitável, mas também por razões econômicas, já que praticamente anulará a efetividade desse mercado de compensação e, portanto, de distribuição de renda.

6. CÔMPUTO DE APP E RL DEVE SER MANTIDO SEPARADO

• Não se justifica cientificamente a inclusão das Áreas de Preservação Permanente (APPs) no cômputo das Reservas Legais (RLs) já que APPs e RLs apresentam estruturas e funções distintas e comunidades biológicas complementares;

• A somatória de APP e RL em áreas agrícolas consolidadas, fora da Amazônia Legal, permite a manutenção de cobertura de vegetação nativa em torno de um de um limiar de 30% da área, que vem se mostrando como um patamar mínimo de cobertura natural para se evitar a extinção massiva de espécies na paisagem.

7. USO DE ESPÉCIE EXÓTICA EM RL APENAS NAS FASES INICIAIS DE RESTAURAÇÃO

• A permissão do uso de espécies exóticas em até 50% da RL é extremamente prejudicial para as principais funções da RL: conservação da biodiversidade nativa e uso sustentável de recursos naturais, que são as motivações originais para a instituição da RL, abrindo a possibilidade de um diferencial a favor da agricultura brasileira, como agricultura com sustentabilidade ambiental. O uso de espécies exóticas na RL vai anular esse diferencial;

• Vale destacar que o uso temporário de espécies exóticas, permitido apenas nas fases iniciais de restauração de uma área de RL, combinado com o uso de espécies nativas regionais, com o objetivo de aliar restauração com obtenção de um ganho econômico, pode ser uma alternativa interessante de viabilização econômica da restauração dessas áreas com espécies nativas, principalmente para o pequeno proprietário.

8. AGRICULTURA FAMILIAR (AF) NÃO É EQUIVALENTE A SIMPLESMENTE QUATRO MÓDULOS FISCAIS

• O tratamento diferenciado no Código Florestal deve ser atribuído à Agricultura Familiar que deve receber contribuição direta do conhecimento científico para a redução dos impactos ambientais da atividade agrícola, e também prioridade na transferência de tecnologia de produção e no recebimento dos benefícios viabilizados pelo pagamento dos serviços ambientais e/ou ecossistêmicos, tanto para as florestas remanescentes, como para as restauradas.

• A Agricultura Familiar (AF) é definida na Lei 11.326/2006, art.3, com quatro critérios que devem ser simultaneamente observados e dizem respeito a tamanho, mão de obra, renda e gestão. Esses critérios não podem ser reduzidos na lei apenas ao tamanho da propriedade (4 Módulos Fiscais).

9. CUSTO DE RESTAURAÇÃO É BEM MENOR DO QUE O APREGOADO EM DEFESA DO PLC 30/2011

• O custo de restauração de áreas degradadas varia conforme as diferentes situações de degradação, que podem demandar desde o simples abandono da área (restauração passiva, sem custo de implantação), até o plantio de mudas em área total, de custo elevado.

• Felizmente, no Brasil, em função da história recente da expansão agrícola em várias regiões (Amazônia e Brasil Central e as áreas de transição), a grande maioria das situações de APPs e mesmo de RLs poderão ser restauradas tendo como primeira ação o isolamento e a retirada do fator de degradação dessas áreas (restauração passiva), que pode ser acompanhada ou não da condução da regeneração natural, dependendo da intensidade de expressão dessa regeneração. Isso permitirá uma ocupação inicial (primeiros 2-3 anos) da área degradada com espécies nativas colonizadoras, formando uma capoeira, que poderá nos anos seguintes ser objeto de enriquecimento com espécies nativas da floresta madura, como por exemplo, espécies de outras formas de vida que não as arbóreas, espécies em risco de extinção local ou mesmo de espécies de interesse econômico, dependendo das características da paisagem regional e dos objetivos dessa restauração, o que é definido tecnicamente como manejo adaptativo. O enriquecimento desses fragmentos pode ser custeado por programas públicos visando à restauração e conservação da biodiversidade. O plantio total vai ficar restrito às regiões muito intensamente degradadas na história agrícola brasileira, onde praticamente todos os bons fragmentos remanescentes foram eliminados da paisagem regional, que não devem representar mais que 25% da restauração de APPs e RLs no Brasil;

• Portanto, a questão de custo da restauração não deve ser usada como impeditivo da proposição de ações de restauração das APPs e RLs e sim como enorme possibilidade de retorno econômico dessas áreas restauradas, por exemplo, com o uso sustentável das áreas de reserva legal, com o pagamento por serviços ambientais das APPs, com a agregação de valor do produto agrícola por meio da certificação ambiental, com o pagamento por créditos de carbono, com a importância da cadeia produtiva da restauração na geração de trabalho e renda para populações mais marginalizadas, etc. Para uma aproximação da melhor metodologia de restauração e do valor real do custo dessa restauração para fins de regularização ambiental deve-se analisar caso a caso, considerando as características da paisagem regional e a intensidade de uso da área a ser restaurada, temas esses que o Brasil tem grande conhecimento científico disponível.

10. ALGUNS SERVIÇOS AMBIENTAIS ESSENCIAIS DA VEGETAÇÃO RIPÁRIA POR SI SÓ JUSTIFICAM A IMPORTÂNCIA DE SUA PRESERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO

• A faixa ripária ocupada por vegetação nativa promove vários serviços ambientais fundamentais para a própria agricultura e para a qualidade de vida da sociedade em geral. Esses serviços são fundamentais no processo de tecnificação da agricultura brasileira, colaborando na polinização da maioria das culturas agrícolas e evitando danos e perdas que contribuem para o insucesso financeiro da atividade de produção agrícola. Devido ao histórico de ocupação feito em nosso país é difícil entender que preservando certas áreas os ganhos são maiores que a substituição dessas áreas por culturas agrícolas. Abaixo são citados, com o devido suporte da literatura científica disponível, alguns serviços ambientais característicos das áreas ripárias:

• Infiltração de água e amortecimento de enchentes;
• Retenção de partículas de solo, erosão e assoreamento;
• Retenção de nutrientes provenientes de áreas agrícolas;
• Retenção de agroquímicos (inseticidas e herbicidas) provenientes de áreas agrícolas;
• A vegetação ripária como grande conservadora da biodiversidade remanescente;
• A vegetação ripária como elemento de ligação (corredor ecológico) na paisagem;
• As áreas ripárias como fonte de alimento e proteção para organismos aquáticos.