Número 500 - 01 de agosto de 2010
Car@s Amig@s,
Este boletim completa 500 edições na semana em que a Justiça suspendeu a decisão da CTNBio que liberou o milho transgênico da Bayer e que a principal entidade científica brasileira aprovou por unanimidade de sua assembleia uma moção por mais participação e transparência nas decisões sobre biossegurança.
A reunião anual da SBPC realizada em Natal na semana que passou estreou o “Ciência em Ebulição”, espaço para debates sobre temas controversos. A questão da biossegurança de organismos transgênicos foi debatida em três momentos diferentes. Só pelo destaque dado para a discussão sobre o tema já é possível ver o quão longe da realidade estão aqueles que tentam convencer que a aprovação dos transgênicos é consenso no meio acadêmico.
O presidente da CTNBio Edílson Paiva, em debate com ex-membro da comissão, negou e taxou de mentirosos os dados oficiais e da literatura científica apresentados para mostrar que os transgênicos foram aqui liberados de forma açodada e dispensando os estudos necessários, bem como dados da literatura especializada que justificariam maior precaução.
Um minicurso para 40 participantes abordou com riqueza de informações e exemplos concretos os procedimentos adotados para avaliação e liberação de um organismo transgênico no Brasil.
E a conferência com Terje Traavik, coordenador do centro de pesquisa sobre Ecologia do Gene da Universidade de Tromso, Noruega, evidenciou o fato de que quando se trata de riscos dos transgênicos sequer sabemos qual a exata dimensão dos problemas que já se sabe que poderão ocorrer. Sua conclusão é que os governos precisam investir em pesquisas independentes e que é anticientífica a posição dos que negam a realização de estudos para desanuviar áreas onde predomina a dúvida.
Para o bom entendedor fica claro que não é bem essa a prática adota pela CTNBio, que, na dúvida, libera. Ou dito nas palavras de seu presidente, entende que seja o princípio da precaução um princípio da obstrução, debochando do conceito fundador da legislação que rege a comissão por ele presidida.
Mas a Justiça mostrou-se eficiente para corrigir esse tipo de desvio, reforçando a importância de a sociedade se organizar para atuar na fiscalização da lei e exigir seu cumprimento.
O milho transgênico da Bayer foi liberado na ausência de dados sobre seu comportamento na amazônia e caatinga, desconsiderando-se que as condições ambientais são determinantes para a avaliação de risco. No mesmo embalo a CTNBio eximiu-se de explicitar as medidas de segurança e restrições ao uso do OGM, como manda a lei, e negou acesso às informações sobre o processo.
Diante dessas irregularidades, a sentença exarada pela Juíza Federal Pepita Durski Tramontini concluiu que “(...) não se justifica a liberação de [um OGM] anteriormente à definição destas regras [de monitoramento pós comercialização e de coexistência]”. Além disso, “As informações que instruem o pedido da empresa são de interesse público, devendo ser a todos os interessados disponibilizadas (...) [sendo que seu acesso] é essencial ao acompanhamento por aqueles que se preocupam com o tema”. A sentença tem efeitos imediatos.
Parte da dispensa da lei pode se explicar pela soberba, e parte por acreditar a maior parte daqueles que decidem sobre transgênicos que a contaminação não é um problema já que o milho crioulo não existe, ou que, se existe, não deve ser usado porque produz pouco. Para estes, vale conhecer o caso da família Kunze, contado mais abaixo, que conseguiu se livrar das dívidas após adotar sementes crioulas, que lhes abriram as portas para um manejo eficiente e de baixo uso de insumos e, portanto, de custo reduzido.
Daí destaca-se a relevante manifestação da Vara Ambiental do Paraná ao afirmar a necessidade de medidas de coexistência como forma de se garantir não só a biodiversidade, como também o direito de agricultores e consumidores.