Amazonia.org.br
O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) divulgou hoje os dados de novembro de 2010 do desmatamento e degradação florestal na Amazônia. O SAD, satélite utilizado pelo ONG, registrou um aumento de 548% na degradação florestal, somando 188 quilômetros quadrados. Em novembro de 2009 a degradação somou 29 quilômetros quadrados.
A maior parte (51%) da degradação florestal ocorreu no Pará seguido por Mato Grosso (39%). Segundo o Imazon, degradação florestal são áreas florestais intensamente exploradas pela atividade madeireira ou por queimadas. É diferente do desmatamento, que é a supressão total da floresta com exposição do solo.
A degradação florestal acumulada no período de agosto de 2010 a novembro de 2010 totalizou 2.805 quilômetros quadrados. Isso representou um aumento expressivo (256%) em relação ao período anterior (agosto de 2009 a novembro de 2009), quando a degradação florestal somou 789 quilômetros quadrados.
Desmatamento
O SAD detectou 65 quilômetros quadrados de desmatamento, uma redução de 13% em relação a novembro de 2009, quando o desmatamento somou 75 quilômetros quadrados. Em novembro de 2010, os Estados com maior área desmatada foram Mato Grosso (38%), Pará (29%) e Rondônia (20%). O restante do desmatamento ocorreu em Roraima (5%), Amazonas (5%) e Acre (3%).
Os dados podem estar subestimados, já que só foi possível monitorar 30% da área florestal na Amazônia Legal. Os outros 70% estavam cobertos por nuvens, o que dificultou o monitoramento na região, principalmente no Amapá, Rondônia, Pará e Mato Grosso, os quais tiveram mais de 70% da área florestal coberto por nuvens.
O desmatamento acumulado no período de agosto de 2010 a novembro de 2010 somou 598 quilômetros quadrados. Em comparação com o período anterior (agosto 2009-novembro 2009), quando o desmatamento somou 757 quilômetros quadrados, houve redução de 21%.
Segundo o boletim, em novembro de 2010 o desmatamento detectado comprometeu 4 milhões de toneladas de CO2 equivalente, o que representa uma queda de 21% em relação a novembro de 2009. No acumulado do período (agosto - novembro 2010) o desmatamento comprometeu 36 milhões de toneladas de CO2 equivalentes. Isso representa uma redução de 23% em relação ao período anterior (agosto de 2009 a novembro de 2009) quando o carbono florestal afetado pelo desmatamento foi cerca de 47 milhões de toneladas de CO2 equivalente.
Coletânea de artigos selecionados por sua veracidade e importância para as questões ambientais no Brasil e no Mundo.
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
Complexo como o fim da escravidão
José Eli da Veiga
VALOR 21/12/2010
As evidências sobre o aquecimento global começaram a ser consolidadas em 1971 no primeiro evento internacional sobre o tema, em Estocolmo: "Study of man's impact on climate". Vinte anos depois, a ONU montou o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC). Decisão que saiu de um grande conclave cujo título enfatizava "as implicações das mudanças atmosféricas para a segurança global" (Toronto, 1988).
Quatro anos depois foram adotados no Rio os fundamentos do complexo processo institucional posterior: a Convenção do Clima. Ainda outros cinco anos se passaram até que fosse assinado o autista Protocolo de Kyoto, em 1997. Mais oito para que ele pudesse entrar em vigor, em 2005, com a ratificação da Rússia. Pior: as posteriores conferências das partes foram paupérrimas em decisões que efetivamente contribuíssem para a descarbonização.
A rigor, há um único precedente histórico que ajuda a encarar com otimismo tanta morosidade na busca de solução que encurte a agonia da era fóssil e acelere a passagem à economia de baixo carbono: o processo que pôs fim à escravidão. Se não houver guerra nuclear, cujas consequências são absolutamente imprevisíveis, com certeza as emissões de gases de efeito estufa serão minimizadas no século 21 em circunstâncias sociais e políticas comparáveis às da emancipação dos escravos no século 19.
São duas feridas essencialmente éticas, cuja lentidão das cicatrizações se deve a inércias culturais só superáveis por obra de oportunismos econômicos capazes de engendrar rupturas políticas tão corajosas quanto traumáticas. Por isso, é aconselhável aos que se empenham contra o aquecimento global que revisitem a história dos movimentos sociais pela libertação dos escravos, dando particular atenção às razões de suas derrotas e sucessos parciais durante o meio século que precedeu as abolições, só desencadeadas em 1833 pelo império britânico.
Os lucros das plantações das Índias estavam no coração da economia como hoje estão os do petróleo e do carvão
Os pioneiros do abolicionismo, principalmente "quakers" ingleses, sabiam que a tarefa que tinham se proposto parecia impossível. Praticamente todos os britânicos, de peões a bispos, aceitavam a escravidão como algo inteiramente normal. Afinal, viviam num país em que os lucros das plantações das Índias Ocidentais estavam no coração do sistema econômico, como ocorre hoje com os lucros do petróleo e do carvão. As taxas alfandegárias sobre o açúcar cultivado pelos escravos constituíam imensa fonte de renda para o governo e a vida de centenas de milhares de marinheiros, mercadores e construtores de navios dependia do tráfico de escravos. Comércio cuja expansão na segunda metade do século 18 tornara prósperos diversos portos britânicos, inclusive o de Londres.
Em tais circunstâncias, como levar a opinião pública a pressionar o parlamento, se nem tinham direito a voto todas as mulheres e 95% dos homens? Manchester já era a segunda maior cidade do país, mas não tinha sequer um representante na Câmara dos Comuns, enquanto uma quase desabitada colina (Old Sarum) contava com dois. Enfim, chega a ser inacreditável que os abolicionistas tenham conseguido a proibição do tráfico apenas 20 anos depois de sua primeira reunião. E com mais 30 anos o fim da própria escravidão.
Foi decisiva nesse processo a contribuição de James Stephen, um dos principais advogados marítimos do império. Sua experiência no mundo do comércio internacional lhe deu a ferramenta crucial para a luta em favor da abolição. Sua grande aversão ao escravismo foi cuidadosamente mantida em segredo, e seus argumentos eram práticos e impecavelmente patrióticos. Atraiu, de forma sub- reptícia, o apoio de um poderosíssimo lobby com o projeto de que também os navios com bandeiras neutras se tornassem atacáveis. Sob o sistema de "recompensa", tanto militares da marinha como tripulações de navios particulares tinham o direito de compartilhar o valor dos navios e das cargas que capturassem. Essa era a maneira com que os oficiais sonhavam ficar ricos e seus marinheiros imaginavam poder complementar seus magros vencimentos. Com grande habilidade, Stephen evitava se referir à natureza da carga que quase todos esses navios carregavam: escravos.
Muitos outros episódios desse tipo estão minuciosamente descritos no empolgante livro do jornalista Adam Hochschild: "Enterrem as correntes; profetas e rebeldes na luta pela libertação dos escravos (Record, 2007). Todos reforçam a hipótese de que o processo de transição ao baixo carbono só receberá um decisivo empurrão quando deputados e senadores do congresso dos Estados Unidos forem convencidos por argumentos práticos e patrióticos a mudar radicalmente a atual estratégia de segurança energética baseada no petróleo e no carvão, mesmo que a peça legislativa nem mencione a ruptura climática. Seria o término da já longa agonia da era fóssil, mesmo que ainda fossem
necessários alguns anos para que ela se tornasse global. Sem um fato dessa natureza, nada de realmente importante poderá resultar das negociações multilaterais.
José Eli da Veiga é professor titular da USP (FEA e IRI) e autor de "Sustentabilidade" (Ed. Senac, 2010), escreve mensalmente às terças. Página web: www.zeeli.pro.br
VALOR 21/12/2010
As evidências sobre o aquecimento global começaram a ser consolidadas em 1971 no primeiro evento internacional sobre o tema, em Estocolmo: "Study of man's impact on climate". Vinte anos depois, a ONU montou o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC). Decisão que saiu de um grande conclave cujo título enfatizava "as implicações das mudanças atmosféricas para a segurança global" (Toronto, 1988).
Quatro anos depois foram adotados no Rio os fundamentos do complexo processo institucional posterior: a Convenção do Clima. Ainda outros cinco anos se passaram até que fosse assinado o autista Protocolo de Kyoto, em 1997. Mais oito para que ele pudesse entrar em vigor, em 2005, com a ratificação da Rússia. Pior: as posteriores conferências das partes foram paupérrimas em decisões que efetivamente contribuíssem para a descarbonização.
A rigor, há um único precedente histórico que ajuda a encarar com otimismo tanta morosidade na busca de solução que encurte a agonia da era fóssil e acelere a passagem à economia de baixo carbono: o processo que pôs fim à escravidão. Se não houver guerra nuclear, cujas consequências são absolutamente imprevisíveis, com certeza as emissões de gases de efeito estufa serão minimizadas no século 21 em circunstâncias sociais e políticas comparáveis às da emancipação dos escravos no século 19.
São duas feridas essencialmente éticas, cuja lentidão das cicatrizações se deve a inércias culturais só superáveis por obra de oportunismos econômicos capazes de engendrar rupturas políticas tão corajosas quanto traumáticas. Por isso, é aconselhável aos que se empenham contra o aquecimento global que revisitem a história dos movimentos sociais pela libertação dos escravos, dando particular atenção às razões de suas derrotas e sucessos parciais durante o meio século que precedeu as abolições, só desencadeadas em 1833 pelo império britânico.
Os lucros das plantações das Índias estavam no coração da economia como hoje estão os do petróleo e do carvão
Os pioneiros do abolicionismo, principalmente "quakers" ingleses, sabiam que a tarefa que tinham se proposto parecia impossível. Praticamente todos os britânicos, de peões a bispos, aceitavam a escravidão como algo inteiramente normal. Afinal, viviam num país em que os lucros das plantações das Índias Ocidentais estavam no coração do sistema econômico, como ocorre hoje com os lucros do petróleo e do carvão. As taxas alfandegárias sobre o açúcar cultivado pelos escravos constituíam imensa fonte de renda para o governo e a vida de centenas de milhares de marinheiros, mercadores e construtores de navios dependia do tráfico de escravos. Comércio cuja expansão na segunda metade do século 18 tornara prósperos diversos portos britânicos, inclusive o de Londres.
Em tais circunstâncias, como levar a opinião pública a pressionar o parlamento, se nem tinham direito a voto todas as mulheres e 95% dos homens? Manchester já era a segunda maior cidade do país, mas não tinha sequer um representante na Câmara dos Comuns, enquanto uma quase desabitada colina (Old Sarum) contava com dois. Enfim, chega a ser inacreditável que os abolicionistas tenham conseguido a proibição do tráfico apenas 20 anos depois de sua primeira reunião. E com mais 30 anos o fim da própria escravidão.
Foi decisiva nesse processo a contribuição de James Stephen, um dos principais advogados marítimos do império. Sua experiência no mundo do comércio internacional lhe deu a ferramenta crucial para a luta em favor da abolição. Sua grande aversão ao escravismo foi cuidadosamente mantida em segredo, e seus argumentos eram práticos e impecavelmente patrióticos. Atraiu, de forma sub- reptícia, o apoio de um poderosíssimo lobby com o projeto de que também os navios com bandeiras neutras se tornassem atacáveis. Sob o sistema de "recompensa", tanto militares da marinha como tripulações de navios particulares tinham o direito de compartilhar o valor dos navios e das cargas que capturassem. Essa era a maneira com que os oficiais sonhavam ficar ricos e seus marinheiros imaginavam poder complementar seus magros vencimentos. Com grande habilidade, Stephen evitava se referir à natureza da carga que quase todos esses navios carregavam: escravos.
Muitos outros episódios desse tipo estão minuciosamente descritos no empolgante livro do jornalista Adam Hochschild: "Enterrem as correntes; profetas e rebeldes na luta pela libertação dos escravos (Record, 2007). Todos reforçam a hipótese de que o processo de transição ao baixo carbono só receberá um decisivo empurrão quando deputados e senadores do congresso dos Estados Unidos forem convencidos por argumentos práticos e patrióticos a mudar radicalmente a atual estratégia de segurança energética baseada no petróleo e no carvão, mesmo que a peça legislativa nem mencione a ruptura climática. Seria o término da já longa agonia da era fóssil, mesmo que ainda fossem
necessários alguns anos para que ela se tornasse global. Sem um fato dessa natureza, nada de realmente importante poderá resultar das negociações multilaterais.
José Eli da Veiga é professor titular da USP (FEA e IRI) e autor de "Sustentabilidade" (Ed. Senac, 2010), escreve mensalmente às terças. Página web: www.zeeli.pro.br
Um sonho possível: universalização do saneamento1
A situação do saneamento brasileiro é trágica. De acordo com o IBGE, somente 44% da população brasileira tem acesso à rede de esgotamento sanitário e 79% tem acesso a água tratada. Do total de esgoto gerado, apenas 29% é tratado. Cento e sete milhões de brasileiros não têm acesso à rede de esgotamento sanitário, 134 milhões não têm os esgotos de suas casas tratados e 40 milhões não têm acesso a água tratada. Oito milhões não têm nem sequer banheiro. Como mudar este quadro? Como e quando será possível universalizar os serviços de saneamento?
A universalização do saneamento é um sonho possível, mas para o conjunto do país não é realizável da noite para o dia. Não é para a Copa de 2014, nem para as Olimpíadas de 2016. Mas dá para fazer em menos de 15 anos. Isso representaria uma das maiores contribuições deste século para a saúde e para o meio ambiente.
Estimamos que o investimento total para a universalização seja da ordem de R$ 255 bilhões. Colocamos quatro cenários para a universalização do saneamento no Brasil sob diferentes hipóteses.
Num primeiro cenário, a hipótese de manutenção do atual nível de investimento. De acordo com dados oficiais, o investimento em saneamento caiu a partir de 1999 e se manteve entre R$ 4 bilhões e R$ 6 bilhões até 2008, último ano disponível da série. Mantidos os atuais patamares de investimentos e de produtividade, a universalização da água ocorreria em 2039 e do esgoto (coleta e tratamento) apenas em 2060. É inaceitável esperar mais meio século para serviços básicos, disponíveis em vários países desenvolvidos desde meados do o século passado!
Num segundo cenário, supõe-se a duplicação do atual patamar de investimentos sem aumentar a produtividade. O horizonte de tempo para a universalização do saneamento ainda é muito distante: 2031.
1 Este artigo faz parte de trabalho inédito mais amplo apresentado no Encontro Nacional de Economia de 2010.
Numa terceira situação, trabalha-se com a manutenção do investimento, mas introduz o aumento da produtividade. Isto é, o mesmo real passa a gerar mais ligações de água e esgoto mediante melhores projetos e técnicas. Estudos recentes sugerem que um aumento de 30% na produtividade é ambicioso, porém factível. Mas só o aumento da produtividade ainda não permite obter prazo aceitável para a universalização. Neste cenário, a universalização de água se daria em 2028 e a de esgoto em 2042.
E uma última hipótese serve de referência para a formulação de metas de saneamento. Para universalizar em um intervalo de tempo aceitável (até 2024) será preciso ambos: mais investimento (duplicar os valores atuais) e maior produtividade (30% a mais).
A universalização não ocorrerá simultaneamente em todas as regiões do Brasil. A cobertura de saneamento varia muito conforme nas unidades da federação. As únicas com mais da metade dos domicílios atendidos em coleta de esgotos são Distrito Federal (86,3%), São Paulo (82,1%), e Minas Gerais (68,9%); as menores coberturas são Amapá (3,5%), Pará (1,7%) e Rondônia (1,6%).
O último cenário citado só será possível com mudanças macro e microeconômicas.
Do ponto de vista macro, destaquem-se três aspectos. Em primeiro lugar, é preciso reduzir a tributação. Os prestadores de serviços de água e esgoto pagam cerca de R$ 2 bilhões em PIS/PASEP-COFINS por ano, quase um terço do investimento do setor! Essa situação foi agravada a partir de 2003 com a elevação do PIS/PASEP-COFINS. O projeto original da Lei do Saneamento previa a isenção deste tributo para investimentos, mas o artigo foi vetado pelo Executivo.
Em segundo lugar, é preciso resgatar o planejamento do setor. A Lei do Saneamento obriga o Governo Federal a editar um Plano Nacional de Saneamento Básico. Passados quase quatro anos da aprovação da norma, tal plano ainda não existe.
Em terceiro lugar, é preciso estimular as parcerias, tanto as Parcerias Público-Privadas (PPP), como as Parcerias Público-Público e outras modalidades, como a locação de ativos.
O modelo de Parcerias Público-Público vem sendo aplicado, por exemplo, em transferência de tecnologia e conhecimento na formatação de editais e modelagens contratuais entre empresas estaduais de saneamento.
Do ponto de vista microeconômico, também três aspectos podem ser destacados. Em primeiro lugar, as empresas devem ter um planejamento voltado para a geração de valor.
Em segundo lugar, é indispensável reduzir as perdas de água. De acordo com o Ministério das Cidades, a perda média brasileira é próxima a 40%. O combate às perdas de água posterga a necessidade de investimentos em novos sistemas e aumenta a receita das companhias. Além disso, reduz custos operacionais, uma vez que é possível atender a mesma quantidade de pessoas, sem ampliar a produção de água.
Em terceiro lugar, é importante melhorar a gestão de projetos de forma a reduzir o tempo e o custo dos empreendimentos.
Por fim, a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação devem ser incorporados tanto como estratégia empresarial, quanto como política pública no saneamento.
A universalização do saneamento constitui grande desafio. O binômio investimento e inovação pode torná-la realidade para a atual geração. Um sonho possível.
Gesner Oliveira, presidente da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), economista e professor da FGV-SP Fernando S. Marcato, secretário-executivo de Novos Negócios da Sabesp, advogado Pedro Scazufca, assistente executivo da Presidência da Sabesp, economista
A universalização do saneamento é um sonho possível, mas para o conjunto do país não é realizável da noite para o dia. Não é para a Copa de 2014, nem para as Olimpíadas de 2016. Mas dá para fazer em menos de 15 anos. Isso representaria uma das maiores contribuições deste século para a saúde e para o meio ambiente.
Estimamos que o investimento total para a universalização seja da ordem de R$ 255 bilhões. Colocamos quatro cenários para a universalização do saneamento no Brasil sob diferentes hipóteses.
Num primeiro cenário, a hipótese de manutenção do atual nível de investimento. De acordo com dados oficiais, o investimento em saneamento caiu a partir de 1999 e se manteve entre R$ 4 bilhões e R$ 6 bilhões até 2008, último ano disponível da série. Mantidos os atuais patamares de investimentos e de produtividade, a universalização da água ocorreria em 2039 e do esgoto (coleta e tratamento) apenas em 2060. É inaceitável esperar mais meio século para serviços básicos, disponíveis em vários países desenvolvidos desde meados do o século passado!
Num segundo cenário, supõe-se a duplicação do atual patamar de investimentos sem aumentar a produtividade. O horizonte de tempo para a universalização do saneamento ainda é muito distante: 2031.
1 Este artigo faz parte de trabalho inédito mais amplo apresentado no Encontro Nacional de Economia de 2010.
Numa terceira situação, trabalha-se com a manutenção do investimento, mas introduz o aumento da produtividade. Isto é, o mesmo real passa a gerar mais ligações de água e esgoto mediante melhores projetos e técnicas. Estudos recentes sugerem que um aumento de 30% na produtividade é ambicioso, porém factível. Mas só o aumento da produtividade ainda não permite obter prazo aceitável para a universalização. Neste cenário, a universalização de água se daria em 2028 e a de esgoto em 2042.
E uma última hipótese serve de referência para a formulação de metas de saneamento. Para universalizar em um intervalo de tempo aceitável (até 2024) será preciso ambos: mais investimento (duplicar os valores atuais) e maior produtividade (30% a mais).
A universalização não ocorrerá simultaneamente em todas as regiões do Brasil. A cobertura de saneamento varia muito conforme nas unidades da federação. As únicas com mais da metade dos domicílios atendidos em coleta de esgotos são Distrito Federal (86,3%), São Paulo (82,1%), e Minas Gerais (68,9%); as menores coberturas são Amapá (3,5%), Pará (1,7%) e Rondônia (1,6%).
O último cenário citado só será possível com mudanças macro e microeconômicas.
Do ponto de vista macro, destaquem-se três aspectos. Em primeiro lugar, é preciso reduzir a tributação. Os prestadores de serviços de água e esgoto pagam cerca de R$ 2 bilhões em PIS/PASEP-COFINS por ano, quase um terço do investimento do setor! Essa situação foi agravada a partir de 2003 com a elevação do PIS/PASEP-COFINS. O projeto original da Lei do Saneamento previa a isenção deste tributo para investimentos, mas o artigo foi vetado pelo Executivo.
Em segundo lugar, é preciso resgatar o planejamento do setor. A Lei do Saneamento obriga o Governo Federal a editar um Plano Nacional de Saneamento Básico. Passados quase quatro anos da aprovação da norma, tal plano ainda não existe.
Em terceiro lugar, é preciso estimular as parcerias, tanto as Parcerias Público-Privadas (PPP), como as Parcerias Público-Público e outras modalidades, como a locação de ativos.
O modelo de Parcerias Público-Público vem sendo aplicado, por exemplo, em transferência de tecnologia e conhecimento na formatação de editais e modelagens contratuais entre empresas estaduais de saneamento.
Do ponto de vista microeconômico, também três aspectos podem ser destacados. Em primeiro lugar, as empresas devem ter um planejamento voltado para a geração de valor.
Em segundo lugar, é indispensável reduzir as perdas de água. De acordo com o Ministério das Cidades, a perda média brasileira é próxima a 40%. O combate às perdas de água posterga a necessidade de investimentos em novos sistemas e aumenta a receita das companhias. Além disso, reduz custos operacionais, uma vez que é possível atender a mesma quantidade de pessoas, sem ampliar a produção de água.
Em terceiro lugar, é importante melhorar a gestão de projetos de forma a reduzir o tempo e o custo dos empreendimentos.
Por fim, a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação devem ser incorporados tanto como estratégia empresarial, quanto como política pública no saneamento.
A universalização do saneamento constitui grande desafio. O binômio investimento e inovação pode torná-la realidade para a atual geração. Um sonho possível.
Gesner Oliveira, presidente da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), economista e professor da FGV-SP Fernando S. Marcato, secretário-executivo de Novos Negócios da Sabesp, advogado Pedro Scazufca, assistente executivo da Presidência da Sabesp, economista
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
Economistas ainda tentam medir a felicidade
O economista José Eli da Veiga, especialista em desenvolvimento sustentável, explica por que os índices atuais, como o PIB e IDH, deixam muito a desejar
MARCOS CORONATO
Como o processo de desenvolvimento pode se tornar sustentável, se ainda não sabemos direito como medir a qualidade de vida, nem o grau de cuidado com a natureza, nem o próprio crescimento econômico? Esse tipo de preocupação está no cerne das pesquisas do economista José Eli da Veiga, um dos principais pensadores brasileiros no campo do desenvolvimento sustentável, participante da formulação do programa de governo da candidata a presidente Marina Silva (PV) e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP. Eli da Veiga lançou em novembro seu livro mais recente, “Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor”, pela Editora Senac. No livro, ele afirma não se preocupar com a falta de uma definição muito precisa para “sustentabilidade”. O economista argumenta que outro valor fundamental para a humanidade, a justiça, também desafia definição muito precisa. Mesmo assim, afirma ele, é razoavelmente fácil identificar o que é injustiça, assim como o que é uma prática insustentável. A seguir, alguns trechos de duas conversas de Eli da Veiga com ÉPOCA.
A ECONOMIA DA FELICIDADE
Houve a discussão no Butão, que é uma sociedade bastante atrasada em termos de capitalismo e desenvolvimento. Eles perguntaram por que aceitar essa convenção do Ocidente, que o relógio que mede a sociedade é o PIB, e concluíram que o que interessa é a felicidade. Até aí é uma crítica ótima. Eles substituíram o PIB pelo FIB, que também é uma medida bruta. Mas eles medem misturando tudo, os indicadores objetivos com indicadores subjetivos, que dependem de questionários aplicados à população sobre saúde, educação. Achei uma solução completamente equivocada, que não vai levar a nada.
Há 10 anos discutíamos uma coisa chamada Paradoxo de Easterlin. Ele foi o primeiro a mostrar que, nos Estados Unidos, por exemplo, o PIB não parou de aumentar, mas a felicidade das pessoas, a satisfação das pessoas com a vida, acompanhou o PIB até os anos 60. Depois, virou uma tesoura: foi cada um para um lado. Até um certo patamar de desempenho econômico, mais grana significa mais felicidade. A partir desse patamar, isso não acontece mais. Mais grana não se reverte em mais felicidade. Hoje há uma base de dados e metodologia para essas medidas.
COMO MEDIR A QUALIDADE DE VIDA
Existe um índice que se impôs desde os anos 90, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), que vem também sofrendo críticas. Uma delas é que uma dimensão do IDH é o próprio PIB per capita. É um índice que dorme com o inimigo: ele foi criado para evitar que o PIB fosse usado como medida de qualidade de vida, mas ele próprio inclui o PIB. Além disso, ele mede a saúde só pela expectativa de vida e a educação só pelo nível de matrículas (média de anos de estudo). Sempre foi considerado uma medição muito tosca. Mas tem uma lógica: se você quer
que 200 e tantos países no mundo façam esse cálculo, não adianta ser uma coisa muito complicada, senão metade dos países nunca vai calcular.
O que há de alternativo a isso é o Relatório Stiglitz, encomendado pelo governo francês. Para medir qualidade de vida, o relatório propõe um indicador complexo, com oito dimensões: educação, saúde, segurança econômica, segurança propriamente dita e assim por diante. E recomenda também o uso de indicadores subjetivos (obtidos por meio de questionários e pesquisas feitas com a população, em vez de contabilidade). Existem coisas consistentes nessa área de pesquisa chamada economia da felicidade.
Nós vivemos no Brasil um momento razoável de estabilidade econômica, um crescimento que não precisa ser muito maior que o atual, do meu ponto de vista, e pelo menos algumas migalhas estão indo para uma melhora geral da qualidade de vida. Isso começou de forma meio hesitante no governo Fernando Henrique Cardoso, depois ganhou força no meio do governo Lula. No caso da Indonésia, começou a acontecer coisa desse tipo, mas com uma exploração predatória de um recurso natural. Não acho que seja o caso do Brasil, temos um caso com mais nuances. (Mas) quem acha que sustentabilidade rima com qualidade de vida está por fora da história. É o contrário.
O PIB AINDA SERVE PARA MEDIR O CRESCIMENTO ECONÔMICO?
Com a contabilidade nacional posso calcular várias coisas – o PIB, o PNB ou uma coisa chamada Produto Interno Líquido. O que é bruto não tem a amortização – a desvalorização e o gasto de reposição de um carro, de uma máquina. Não se cogitava antes fazer amortização do capital natural. Hoje sabemos que, seu eu exploro uma mina, não posso considerar só o que eu faturo. Alguma coisa tem de ir para a outra coluna da contabilidade, porque eu estou dilapidando aquele patrimônio.
O PIB já era ruim por outros motivos, mesmo sem pensarmos em sustentabilidade.
O (economista Eduardo) Giannetti foi aplaudido no lançamento do meu livro por lembrar que o trabalho doméstico não é remunerado (Giannetti afirmou que educar uma criança é um trabalho extremamente nobre e não entra no PIB). Cuidar de um idoso, por exemplo, não entra no PIB. Se não houver troca com o mercado, não entra no PIB.
Há críticos que dizem que o PIB não serve para medir qualidade de vida. Mas os contabilistas respondem que o PIB não é mesmo para esse fim, ele é uma medida econômica da produção. Essa é a crítica boba. Mas há outra crítica, de que o PIB não é bom nem como indicador de produção. Li num documento do Wikileaks, de um diplomata que estava na China, conversando com um governador de província. O governador dizia que o PIB era bom para constar, mas que ele não levava em conta. Ele dizia “aqui, peço para saber qual foi o aumento do consumo de eletricidade, da carga dos trens, isso aí mostra muito mais como é o desempenho da economia”. A Irlanda é outro exemplo – lá, o PIB cresceu, mas a renda das famílias não.
O (presidente da França, Nicolas) Sarkozy teve a sacada e convidou o (Nobel de Economia Joseph) Stiglitz e o (Nobel de Economia) Amartya Sen para montar uma equipe. Eles passaram um ano trabalhando nisso. Uma das primeiras conclusões a que eles chegaram: nós precisamos de três medidas diferentes. Uma do desempenho econômico, uma da qualidade de vida, outra da sustentabilidade. São três coisas diferentes, que não devem ser misturadas. Ele
propõe que o PIB seja substituído desempenho econômico seja medido pela renda ajustada ou renda líquida das famílias. É uma medida que deduz as despesas obrigatórias da família, como impostos. Eles querem calcular quanto sobra, a renda disponível para a família usar no consumo da maneira que ela decidir – comprando banana, automóvel, colocando na poupança, em educação melhor para os filhos.
Não é um cálculo simples. Se o IBGE resolver fazer isso, vai precisar de um certo tempo. A proposta, além de logicamente interessante, recebeu uma espécie de confirmação com Irlanda. O PIB disparou e a renda líquida das famílias nunca mudou. Havia uma disparidade. O PIB era um indicador ilusório e levou o mercado financeiro a grandes equívocos sobre a Irlanda.
COMO CHEGAR A UM PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Não vejo tanto problema assim no fenômeno do greenwashing (a tentativa de empresas de “lavar” a imagem usando o discurso de sustentabilidade social e ambiental). Quando a empresa começa a usar o termo sustentabilidade, mesmo de maneira oportunística, abre a possibilidade de os clientes, fornecedores e parceiros irem em cima dela com cobranças. Existem muitos casos de companhias que começaram a usar o apelo sustentável sem uma política muito séria e depois tiveram de definir essa política.
Não tem regra do que vem antes e o que vem depois. Não tenho resposta quando as pessoas perguntam “você não acha que isso exige principalmente uma mudança de comportamento?”. Inovação tecnológica é absolutamente necessária. Mas não posso afirmar que primeiro precisamos descobrir isso para depois ter mudança de comportamento, ou que precisamos primeiro de mudança de comportamento para depois ter a inovação tecnológica. Ou que primeiro precisaremos mudar nossos valores. Cada exemplo na nossa história mostra uma combinação diferente. Eu uso o exemplo da escravidão porque o Eduardo Giannetti fez uma brilhante intervenção (no lançamento do livro de Eli da Veiga, em novembro), mas que era ultrapessimista, reclamando que estava tudo errado. Deu uma sensação de que talvez a humanidade não seja capaz de resolver o problema do aquecimento global. Por isso, lembrei que somos capazes de resolver problemas. Um caso típico foi a escravidão, que existiu durante milênios, em praticamente todas as sociedades, e no período de um século foi praticamente extinta.
MARCOS CORONATO
Como o processo de desenvolvimento pode se tornar sustentável, se ainda não sabemos direito como medir a qualidade de vida, nem o grau de cuidado com a natureza, nem o próprio crescimento econômico? Esse tipo de preocupação está no cerne das pesquisas do economista José Eli da Veiga, um dos principais pensadores brasileiros no campo do desenvolvimento sustentável, participante da formulação do programa de governo da candidata a presidente Marina Silva (PV) e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP. Eli da Veiga lançou em novembro seu livro mais recente, “Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor”, pela Editora Senac. No livro, ele afirma não se preocupar com a falta de uma definição muito precisa para “sustentabilidade”. O economista argumenta que outro valor fundamental para a humanidade, a justiça, também desafia definição muito precisa. Mesmo assim, afirma ele, é razoavelmente fácil identificar o que é injustiça, assim como o que é uma prática insustentável. A seguir, alguns trechos de duas conversas de Eli da Veiga com ÉPOCA.
A ECONOMIA DA FELICIDADE
Houve a discussão no Butão, que é uma sociedade bastante atrasada em termos de capitalismo e desenvolvimento. Eles perguntaram por que aceitar essa convenção do Ocidente, que o relógio que mede a sociedade é o PIB, e concluíram que o que interessa é a felicidade. Até aí é uma crítica ótima. Eles substituíram o PIB pelo FIB, que também é uma medida bruta. Mas eles medem misturando tudo, os indicadores objetivos com indicadores subjetivos, que dependem de questionários aplicados à população sobre saúde, educação. Achei uma solução completamente equivocada, que não vai levar a nada.
Há 10 anos discutíamos uma coisa chamada Paradoxo de Easterlin. Ele foi o primeiro a mostrar que, nos Estados Unidos, por exemplo, o PIB não parou de aumentar, mas a felicidade das pessoas, a satisfação das pessoas com a vida, acompanhou o PIB até os anos 60. Depois, virou uma tesoura: foi cada um para um lado. Até um certo patamar de desempenho econômico, mais grana significa mais felicidade. A partir desse patamar, isso não acontece mais. Mais grana não se reverte em mais felicidade. Hoje há uma base de dados e metodologia para essas medidas.
COMO MEDIR A QUALIDADE DE VIDA
Existe um índice que se impôs desde os anos 90, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), que vem também sofrendo críticas. Uma delas é que uma dimensão do IDH é o próprio PIB per capita. É um índice que dorme com o inimigo: ele foi criado para evitar que o PIB fosse usado como medida de qualidade de vida, mas ele próprio inclui o PIB. Além disso, ele mede a saúde só pela expectativa de vida e a educação só pelo nível de matrículas (média de anos de estudo). Sempre foi considerado uma medição muito tosca. Mas tem uma lógica: se você quer
que 200 e tantos países no mundo façam esse cálculo, não adianta ser uma coisa muito complicada, senão metade dos países nunca vai calcular.
O que há de alternativo a isso é o Relatório Stiglitz, encomendado pelo governo francês. Para medir qualidade de vida, o relatório propõe um indicador complexo, com oito dimensões: educação, saúde, segurança econômica, segurança propriamente dita e assim por diante. E recomenda também o uso de indicadores subjetivos (obtidos por meio de questionários e pesquisas feitas com a população, em vez de contabilidade). Existem coisas consistentes nessa área de pesquisa chamada economia da felicidade.
Nós vivemos no Brasil um momento razoável de estabilidade econômica, um crescimento que não precisa ser muito maior que o atual, do meu ponto de vista, e pelo menos algumas migalhas estão indo para uma melhora geral da qualidade de vida. Isso começou de forma meio hesitante no governo Fernando Henrique Cardoso, depois ganhou força no meio do governo Lula. No caso da Indonésia, começou a acontecer coisa desse tipo, mas com uma exploração predatória de um recurso natural. Não acho que seja o caso do Brasil, temos um caso com mais nuances. (Mas) quem acha que sustentabilidade rima com qualidade de vida está por fora da história. É o contrário.
O PIB AINDA SERVE PARA MEDIR O CRESCIMENTO ECONÔMICO?
Com a contabilidade nacional posso calcular várias coisas – o PIB, o PNB ou uma coisa chamada Produto Interno Líquido. O que é bruto não tem a amortização – a desvalorização e o gasto de reposição de um carro, de uma máquina. Não se cogitava antes fazer amortização do capital natural. Hoje sabemos que, seu eu exploro uma mina, não posso considerar só o que eu faturo. Alguma coisa tem de ir para a outra coluna da contabilidade, porque eu estou dilapidando aquele patrimônio.
O PIB já era ruim por outros motivos, mesmo sem pensarmos em sustentabilidade.
O (economista Eduardo) Giannetti foi aplaudido no lançamento do meu livro por lembrar que o trabalho doméstico não é remunerado (Giannetti afirmou que educar uma criança é um trabalho extremamente nobre e não entra no PIB). Cuidar de um idoso, por exemplo, não entra no PIB. Se não houver troca com o mercado, não entra no PIB.
Há críticos que dizem que o PIB não serve para medir qualidade de vida. Mas os contabilistas respondem que o PIB não é mesmo para esse fim, ele é uma medida econômica da produção. Essa é a crítica boba. Mas há outra crítica, de que o PIB não é bom nem como indicador de produção. Li num documento do Wikileaks, de um diplomata que estava na China, conversando com um governador de província. O governador dizia que o PIB era bom para constar, mas que ele não levava em conta. Ele dizia “aqui, peço para saber qual foi o aumento do consumo de eletricidade, da carga dos trens, isso aí mostra muito mais como é o desempenho da economia”. A Irlanda é outro exemplo – lá, o PIB cresceu, mas a renda das famílias não.
O (presidente da França, Nicolas) Sarkozy teve a sacada e convidou o (Nobel de Economia Joseph) Stiglitz e o (Nobel de Economia) Amartya Sen para montar uma equipe. Eles passaram um ano trabalhando nisso. Uma das primeiras conclusões a que eles chegaram: nós precisamos de três medidas diferentes. Uma do desempenho econômico, uma da qualidade de vida, outra da sustentabilidade. São três coisas diferentes, que não devem ser misturadas. Ele
propõe que o PIB seja substituído desempenho econômico seja medido pela renda ajustada ou renda líquida das famílias. É uma medida que deduz as despesas obrigatórias da família, como impostos. Eles querem calcular quanto sobra, a renda disponível para a família usar no consumo da maneira que ela decidir – comprando banana, automóvel, colocando na poupança, em educação melhor para os filhos.
Não é um cálculo simples. Se o IBGE resolver fazer isso, vai precisar de um certo tempo. A proposta, além de logicamente interessante, recebeu uma espécie de confirmação com Irlanda. O PIB disparou e a renda líquida das famílias nunca mudou. Havia uma disparidade. O PIB era um indicador ilusório e levou o mercado financeiro a grandes equívocos sobre a Irlanda.
COMO CHEGAR A UM PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
Não vejo tanto problema assim no fenômeno do greenwashing (a tentativa de empresas de “lavar” a imagem usando o discurso de sustentabilidade social e ambiental). Quando a empresa começa a usar o termo sustentabilidade, mesmo de maneira oportunística, abre a possibilidade de os clientes, fornecedores e parceiros irem em cima dela com cobranças. Existem muitos casos de companhias que começaram a usar o apelo sustentável sem uma política muito séria e depois tiveram de definir essa política.
Não tem regra do que vem antes e o que vem depois. Não tenho resposta quando as pessoas perguntam “você não acha que isso exige principalmente uma mudança de comportamento?”. Inovação tecnológica é absolutamente necessária. Mas não posso afirmar que primeiro precisamos descobrir isso para depois ter mudança de comportamento, ou que precisamos primeiro de mudança de comportamento para depois ter a inovação tecnológica. Ou que primeiro precisaremos mudar nossos valores. Cada exemplo na nossa história mostra uma combinação diferente. Eu uso o exemplo da escravidão porque o Eduardo Giannetti fez uma brilhante intervenção (no lançamento do livro de Eli da Veiga, em novembro), mas que era ultrapessimista, reclamando que estava tudo errado. Deu uma sensação de que talvez a humanidade não seja capaz de resolver o problema do aquecimento global. Por isso, lembrei que somos capazes de resolver problemas. Um caso típico foi a escravidão, que existiu durante milênios, em praticamente todas as sociedades, e no período de um século foi praticamente extinta.
José Eli da Veiga: "Se abolimos a escravidão, podemos resolver o aquecimento global"
Para o economista, um dos principais estudiosos do desenvolvimento, a defesa do meio ambiente precisa virar um valor de toda a sociedade
por MARCOS CORONATO
É opinião comum que a escravidão acabou só porque não fazia mais sentido econômico. Para o economista José Eli da Veiga, a história não é bem essa. A escravidão acabou também porque os valores da sociedade mudaram. Ele acredita que algo similar pode estar ocorrendo agora – em relação à defesa do planeta. Eli da Veiga, um dos mais influentes estudiosos do meio ambiente no Brasil, ajudou a formular o programa de governo da candidata Marina Silva, do Partido Verde. Em seu novo livro, Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor, ele compara a preocupação com o ambiente a um valor igualmente difícil de definir, a justiça. Segundo ele, a adoção de valores assim é sinal de grandes mudanças. Mas, para que isso ocorra, é preciso encontrar outras formas, além do PIB, para medir o desenvolvimento econômico, dando importância a esses novos interesses da sociedade. Mas não venha falar do IDH, o Índice de Desenvolvimento Humano. Ele o considera “tosco”. Nem do FIB, o indicador de Felicidade Interna Bruta, que diz ser “equivocado”.
ENTREVISTA - JOSÉ ELI DA VEIGA
QUEM É, Professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), da USP
O QUE FAZ, Pesquisa no Núcleo de Economia Socioambiental (Nesa) da FEA
O QUE PUBLICOU, Dezenove livros. O mais recente, lançado em novembro, é Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor, pela Editora Senac
ÉPOCA – Essa medida não serve para orientar políticas públicas?
Eli da Veiga – Uma dimensão do FIB é algo como a satisfação do cidadão com a educação, completamente subjetiva. Outra é algo como o custo de vida, superobjetivo. O resultado de uma soma assim não tem significado. Dizer que o FIB aumentou 10% não quer dizer coisa nenhuma. É como somar automóveis com bananas. Nenhum outro país adotou. Tem uma discussão muito interessante na Inglaterra para chegar a um índice de felicidade. Só que eles não vão misturar as coisas. Desde 1994 já havia reclamações dos economistas sobre indicadores de desenvolvimento. O (presidente da França, Nicolas) Sarkozy teve uma sacada e convidou o (Nobel de Economia Joseph) Stiglitz e o (Nobel de Economia) Amartya Sen para montar uma equipe. Eles passaram um ano trabalhando nisso. Uma das conclusões a que chegaram (em 2009): nós precisamos de três medidas diferentes. Uma do desempenho econômico, uma da qualidade de vida, outra da sustentabilidade. São três coisas diferentes, que não devem ser misturadas. O relatório propõe que o PIB seja substituído e o desempenho econômico seja medido pela renda ajustada ou renda líquida das famílias – é a renda disponível para a família usar no consumo da maneira que decidir. A proposta recebeu uma espécie de confirmação com a Irlanda: o PIB lá disparou, mas a renda líquida das famílias nunca mudou. Havia uma disparidade. O PIB era um indicador ilusório. A segunda medida é a de qualidade de vida. Existe um índice que se impôs desde os anos 90, o IDH, que vem também sofrendo críticas. Ele mede a saúde só pela expectativa de vida e a educação só pelo nível de matrículas (média de anos de estudo). Sempre foi considerado uma medição tosca. Para medir qualidade de vida, o Relatório Stiglitz propõe um indicador complexo, com oito dimensões: educação, saúde, segurança econômica, segurança propriamente dita e assim por diante. E recomenda também o uso de indicadores subjetivos.
bioquímico. Se você tem uma pegada carbono, uma pegada de recursos hídricos e uma pegada de biodiversidade, pronto, você tem um indicador.
por MARCOS CORONATO
É opinião comum que a escravidão acabou só porque não fazia mais sentido econômico. Para o economista José Eli da Veiga, a história não é bem essa. A escravidão acabou também porque os valores da sociedade mudaram. Ele acredita que algo similar pode estar ocorrendo agora – em relação à defesa do planeta. Eli da Veiga, um dos mais influentes estudiosos do meio ambiente no Brasil, ajudou a formular o programa de governo da candidata Marina Silva, do Partido Verde. Em seu novo livro, Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor, ele compara a preocupação com o ambiente a um valor igualmente difícil de definir, a justiça. Segundo ele, a adoção de valores assim é sinal de grandes mudanças. Mas, para que isso ocorra, é preciso encontrar outras formas, além do PIB, para medir o desenvolvimento econômico, dando importância a esses novos interesses da sociedade. Mas não venha falar do IDH, o Índice de Desenvolvimento Humano. Ele o considera “tosco”. Nem do FIB, o indicador de Felicidade Interna Bruta, que diz ser “equivocado”.
ENTREVISTA - JOSÉ ELI DA VEIGA
QUEM É, Professor titular da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), da USP
O QUE FAZ, Pesquisa no Núcleo de Economia Socioambiental (Nesa) da FEA
O QUE PUBLICOU, Dezenove livros. O mais recente, lançado em novembro, é Sustentabilidade – A legitimação de um novo valor, pela Editora Senac
ÉPOCA – Nos últimos anos, ganhou popularidade a ideia de medir a felicidade de um país, como proposto pelo índice de Felicidade Interna Bruta (FIB), do Butão. Esse seria um indicador melhor que o PIB?
José Eli da Veiga – Houve a discussão no Butão, uma sociedade atrasada em termos de capitalismo e desenvolvimento. Eles perguntaram por que aceitar essa convenção do Ocidente e concluíram que o que interessa é a felicidade. Até aí é uma crítica ótima. Mas eles medem misturando tudo, os indicadores objetivos, a contabilidade, com indicadores subjetivos, que dependem de questionários aplicados à população sobre saúde, educação. Além disso, com a contabilidade nacional posso calcular várias coisas, como o Produto Interno Bruto, o Produto Nacional Bruto. Mas o que é bruto não tem aquela desvalorização, o gasto de reposição de seu carro, da máquina de uma fábrica, chamada “amortização”. Não se cogitava antes fazer essa “amortização” do capital natural. Hoje, sabemos que, se eu exploro uma mina, não posso considerar só o que faturo. Eu estou dilapidando aquele patrimônio. Eles (no Butão) substituíram o PIB pelo FIB, que também é uma medida bruta. Achei uma solução completamente equivocada, que não vai levar a nada.ÉPOCA – Essa medida não serve para orientar políticas públicas?
Eli da Veiga – Uma dimensão do FIB é algo como a satisfação do cidadão com a educação, completamente subjetiva. Outra é algo como o custo de vida, superobjetivo. O resultado de uma soma assim não tem significado. Dizer que o FIB aumentou 10% não quer dizer coisa nenhuma. É como somar automóveis com bananas. Nenhum outro país adotou. Tem uma discussão muito interessante na Inglaterra para chegar a um índice de felicidade. Só que eles não vão misturar as coisas. Desde 1994 já havia reclamações dos economistas sobre indicadores de desenvolvimento. O (presidente da França, Nicolas) Sarkozy teve uma sacada e convidou o (Nobel de Economia Joseph) Stiglitz e o (Nobel de Economia) Amartya Sen para montar uma equipe. Eles passaram um ano trabalhando nisso. Uma das conclusões a que chegaram (em 2009): nós precisamos de três medidas diferentes. Uma do desempenho econômico, uma da qualidade de vida, outra da sustentabilidade. São três coisas diferentes, que não devem ser misturadas. O relatório propõe que o PIB seja substituído e o desempenho econômico seja medido pela renda ajustada ou renda líquida das famílias – é a renda disponível para a família usar no consumo da maneira que decidir. A proposta recebeu uma espécie de confirmação com a Irlanda: o PIB lá disparou, mas a renda líquida das famílias nunca mudou. Havia uma disparidade. O PIB era um indicador ilusório. A segunda medida é a de qualidade de vida. Existe um índice que se impôs desde os anos 90, o IDH, que vem também sofrendo críticas. Ele mede a saúde só pela expectativa de vida e a educação só pelo nível de matrículas (média de anos de estudo). Sempre foi considerado uma medição tosca. Para medir qualidade de vida, o Relatório Stiglitz propõe um indicador complexo, com oito dimensões: educação, saúde, segurança econômica, segurança propriamente dita e assim por diante. E recomenda também o uso de indicadores subjetivos.
ÉPOCA – Mas sem misturar indicadores objetivos com subjetivos.
Eli da Veiga – Não vai demorar para o Reino Unido também ter um indicador de felicidade. O Relatório Stiglitz recomenda que os países façam isso. E, no relatório, eles rejeitaram o uso de indicadores monetários para sustentabilidade. Havia uma discussão entre economistas assim: não há mercado para o meio ambiente, mas não faz mal, a gente dá um jeito de atribuir preço para isso. Qual é o valor do ar puro? E da água limpa? Quanto as pessoas estariam dispostas a pagar? Eles (Stiglitz e Sem) rejeitaram a ideia de que o indicador de sustentabilidade possa ser monetário. Disseram que tem de ser na linha da pegada ecológica, um indicador físico oubioquímico. Se você tem uma pegada carbono, uma pegada de recursos hídricos e uma pegada de biodiversidade, pronto, você tem um indicador.
ÉPOCA – Uma ideia bem difundida é que qualidade de vida e sustentabilidade estão muito relacionadas.
Eli da Veiga – Depende. Eu posso obter uma tremenda qualidade de vida, mas por meio de dilapidação do meio ambiente. Isso tem perna curta. Um caso clássico é o da Indonésia. O país bombou nos anos 80 e 90, montou uma tremenda indústria exportadora, enquanto acabava com a floresta.ÉPOCA – E, naquele momento, isso se reverteu em melhor qualidade de vida.
Eli da Veiga – Nós vivemos no Brasil um momento razoável e pelo menos algumas migalhas estão indo para uma melhora geral da qualidade de vida. No caso da Indonésia, começaram a acontecer coisas desse tipo, mas com uma exploração predatória de um recurso natural. Não acho que seja o caso do Brasil. Mas quem acha que sustentabilidade rima com qualidade de vida está por fora da história.ÉPOCA – A sociedade pode precisar abrir mão de qualidade de vida no presente para ter sustentabilidade?
Eli da Veiga – Não necessariamente abrir mão, mas, se você tem consciência de que aquele ritmo de aumento de qualidade de vida se baseia numa predação dos recursos naturais, pode ter certeza de que é insustentável.ÉPOCA – Preservar o meio ambiente vai exigir um novo padrão moral?
Eli da Veiga – Não tem regra do que vem antes e o que vem depois. Cada exemplo em nossa história mostra uma combinação diferente. Eu uso o exemplo da escravidão porque o (economista) Eduardo Giannetti deu uma declaração brilhante, mas ultrapessimista. Deu uma sensação de que talvez a humanidade não seja capaz de resolver o aquecimento global. Por isso, lembro que somos capazes de resolver problemas como a escravidão, que existiu durante milênios, em praticamente todas as sociedades, e no período de um século foi praticamente extinta. Quando estudamos como foi esse processo, a maior parte da literatura insiste numa explicação econômica de que o capitalismo foi evoluindo e chegou ao ponto em que não era mais rentável manter escravos. Se você for ver a história completa, o movimento pelo fim da escravidão nasceu na Inglaterra, com petições mandadas ao Parlamento por gente do povo, principalmente religiosos. Tinha na frente a questão dos valores, do comportamento, do respeito ao ser humano, muito antes de uma exigência econômica. À medida que esses caras foram vencendo e foi sendo abolido o tráfico de escravos, ficou mais caro ter escravos. Com o escravo mais caro, os senhores passaram a cuidar melhor deles. Como o mundo já havia abolido a escravidão e o Brasil não, as elites brasileiras eram discriminadas quando iam à Europa. Começou com mudanças de valores, e os mais resistentes mudaram quando a economia exigiu. Podemos estar pensando na sustentabilidade ambiental hoje como eles pensavam na escravidão: é difícil imaginar um mundo sustentável. A tese central de meu livro é que sustentabilidade é um novo valor, do mesmo jeito que os direitos humanos eram quando houve o processo de abolição da escravidão.
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
Marina Silva despede-se do Senado após 16 anos
Em discurso, parlamentar do PV do Acre fez balanço de sua trajetória na Casa
Agência Senado
AE
A senadora Marina Silva (PV-AC) é cumprimentada pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP) durante seu discurso de despedida
A senadora Marina Silva (PV-AC) é cumprimentada pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP) durante seu discurso de despedida
Em longo e emocionado discurso na tarde desta quinta-feira, a senadora Marina Silva (PV-AC) fez um balanço dos últimos 16 anos de sua trajetória e despediu-se do Senado Federal recebendo elogios de seus pares. A senadora agradeceu a sua família, a toda a sua equipe e assessores do Senado e do Ministério do Ambiente, citou nominalmente senadores e deputados de diversos partidos e elogiou a dedicação dos servidores do Senado.
Em 1995, aos 36 anos, lembrou Marina Silva, ela chegava ao Senado para seu primeiro mandato como a mais jovem senadora. Ela recordou seu primeiro discurso da tribuna da Casa, quando registrou sua história política e pessoal, uma seringueira que só se alfabetizaria pelo Mobral aos 16 anos de idade e alcançou o Senado Federal.
"Tenho imensa gratidão pelo povo acreano. Não tenho nada a exigir, a cobrar do povo acreano. Só tenho que agradecer. Nada disso teria acontecido se não fosse pelas suas mãos - disse a senadora lembrando algumas frases de seu primeiro pronunciamento na Casa".
Marina Silva disse ter pautado sua atuação no Senado em três diretrizes básicas: opinião, proposição e articulação. Opinião baseada em princípios e valores, na ética e na moral. Articulação em busca de apoio e diálogo com os mais diversos partidos e setores sociais.
"No que concerne a ser um mandato de proposição, durante esses 16 anos, com um intervalo de 5 anos no Ministério do Meio Ambiente [2003-2007], foi apresentado um conjunto de projetos dos quais tenho muito orgulho. Foram 125 proposições, algumas delas transformadas em lei", explicou.
A senadora se disse de certa forma triste por não ter conseguido ver aprovado um de seus primeiros projetos de lei, o que instituiria a Lei de Acesso aos Recursos da Biodiversidade.
"Saio daqui com essa frustração. Saio daqui com essa falta, a falta de que o Brasil não tem uma lei para proteger e usar, com sabedoria, os 22% de espécies vivas que estão no nosso domínio territorial, só para citar um exemplo", acrescentou.
Lembrou ainda de várias conquistas pelas quais lutou para ver consolidadas: linha de crédito para extrativistas, subsídio para a borracha, Programa Amazônia Solidária, Comissão da Pobreza, luta contra mudanças no Código Florestal, novo modelo para o setor elétrico, diminuição do desmatamento da Amazônia, criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Instituto Chico Mendes, Plano Nacional de Recursos Hídricos, Plano de Combate à Desertificação.
"No mandato, fiquei até 2002, quando tive a honra de ser convidada pelo Presidente Lula para ser sua Ministra do Meio Ambiente. E confesso aos senhores que me senti muito honrada com esse convite. Eu o aceitei como um desafio", disse, recordando ter estabelecido que sua gestão à frente do ministério orientaria a política nacional de meio ambiente pelo controle e pela participação da sociedade. E que o sistema nacional do meio ambiente deveria ser fortalecido, ao passo que o desenvolvimento brasileiro deveria ser sustentável e a política ambiental transversal, envolvendo diversos ministérios.
Marina disse ter ficado no Ministério do Meio Ambiente até o momento em que sentiu apoio para suas ações. "Cerca de 24 milhões de hectares de unidades de conservação foram criados durante minha gestão. Essa é uma contribuição para a proteção permanente que a sociedade brasileira ajudou a estabelecer durante o governo do presidente Lula. Todos aqueles que trabalharam os mapas dos biomas, as áreas prioritárias para as unidades de conservação sabem que, com critério, criamos essas unidades de conservação", acrescentou a senadora, que também relembrou sua saída do PT, em 2009, onde militou por 30 anos, para o PV, um partido pequeno.
A senadora voltou a agradecer a todos os que confiaram a ela seu voto nas eleições de outubro.
Em 1995, aos 36 anos, lembrou Marina Silva, ela chegava ao Senado para seu primeiro mandato como a mais jovem senadora. Ela recordou seu primeiro discurso da tribuna da Casa, quando registrou sua história política e pessoal, uma seringueira que só se alfabetizaria pelo Mobral aos 16 anos de idade e alcançou o Senado Federal.
"Tenho imensa gratidão pelo povo acreano. Não tenho nada a exigir, a cobrar do povo acreano. Só tenho que agradecer. Nada disso teria acontecido se não fosse pelas suas mãos - disse a senadora lembrando algumas frases de seu primeiro pronunciamento na Casa".
Marina Silva disse ter pautado sua atuação no Senado em três diretrizes básicas: opinião, proposição e articulação. Opinião baseada em princípios e valores, na ética e na moral. Articulação em busca de apoio e diálogo com os mais diversos partidos e setores sociais.
"No que concerne a ser um mandato de proposição, durante esses 16 anos, com um intervalo de 5 anos no Ministério do Meio Ambiente [2003-2007], foi apresentado um conjunto de projetos dos quais tenho muito orgulho. Foram 125 proposições, algumas delas transformadas em lei", explicou.
A senadora se disse de certa forma triste por não ter conseguido ver aprovado um de seus primeiros projetos de lei, o que instituiria a Lei de Acesso aos Recursos da Biodiversidade.
"Saio daqui com essa frustração. Saio daqui com essa falta, a falta de que o Brasil não tem uma lei para proteger e usar, com sabedoria, os 22% de espécies vivas que estão no nosso domínio territorial, só para citar um exemplo", acrescentou.
Lembrou ainda de várias conquistas pelas quais lutou para ver consolidadas: linha de crédito para extrativistas, subsídio para a borracha, Programa Amazônia Solidária, Comissão da Pobreza, luta contra mudanças no Código Florestal, novo modelo para o setor elétrico, diminuição do desmatamento da Amazônia, criação do Serviço Florestal Brasileiro e do Instituto Chico Mendes, Plano Nacional de Recursos Hídricos, Plano de Combate à Desertificação.
"No mandato, fiquei até 2002, quando tive a honra de ser convidada pelo Presidente Lula para ser sua Ministra do Meio Ambiente. E confesso aos senhores que me senti muito honrada com esse convite. Eu o aceitei como um desafio", disse, recordando ter estabelecido que sua gestão à frente do ministério orientaria a política nacional de meio ambiente pelo controle e pela participação da sociedade. E que o sistema nacional do meio ambiente deveria ser fortalecido, ao passo que o desenvolvimento brasileiro deveria ser sustentável e a política ambiental transversal, envolvendo diversos ministérios.
Marina disse ter ficado no Ministério do Meio Ambiente até o momento em que sentiu apoio para suas ações. "Cerca de 24 milhões de hectares de unidades de conservação foram criados durante minha gestão. Essa é uma contribuição para a proteção permanente que a sociedade brasileira ajudou a estabelecer durante o governo do presidente Lula. Todos aqueles que trabalharam os mapas dos biomas, as áreas prioritárias para as unidades de conservação sabem que, com critério, criamos essas unidades de conservação", acrescentou a senadora, que também relembrou sua saída do PT, em 2009, onde militou por 30 anos, para o PV, um partido pequeno.
A senadora voltou a agradecer a todos os que confiaram a ela seu voto nas eleições de outubro.
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
Nasa Divulga Análise Sobre Temperatura na Terra
Entidade registra o aumento de temperaturas em 2010 mesmo sendo um ano de pouca atividade solar e sob o efeito da La Niña e desmente teorias que afirmavam que o aquecimento global estaria desacelerando desde 1998.
O Instituto Goddard para Estudos Espaciais da NASA (GISS) analisou dados de 6300 estações meteorológicas, informações de satélites e de centros de pesquisa na Antártica e chegou a uma conclusão: não há dúvidas de que o planeta está aquecendo.
Segundo a entidade, a temperatura global média subiu 0,8°C desde 1880, sendo que dois terços desse aquecimento se deram depois de 1975. “O mundo está ficando mais quente. Não sabemos se por ação humana ou natural, mas termômetros não mentem e garantem que a temperatura vem subindo constantemente desde o começo da Revolução Industrial”, afirma o site da NASA.
A análise é acompanhada pelo relatório "Global surface temperature change", publicado no periódico Reviews of Geophysics e de autoria dos pesquisadores James Hansen, Reto Ruedy, Makiko Sato, e Ken Lo.
Para os cientistas, os dados registrados em 2010 são especialmente significantes porque o ano foi marcado por uma pequena atividade solar e pela ação do fenômeno La Niña, fatores que deveriam fazer as temperaturas médias do planeta serem mais amenas. Mas ao invés disso, os termômetros registraram até agora um dos anos mais quentes da história. Muito provavelmente, 2010 vai figurar entre os cinco anos com a maior temperatura média já registrada.
No relatório, os autores ainda rebatem as teorias de que o aquecimento global teria parado em 1998 e que desde então ele estaria cada vez menor.
“Nós concluímos que não há sinal de que a tendência do aumento de 0,15°C a 0,20°C por década tenha diminuído. A idéia de que a temperatura global está estável desde 1998 não encontra fundamento nas nossas análises”, afirmam os pesquisadores.
Amazônia
A NASA divulgou também novas fotos da Amazônia, que atravessa a pior seca já registrada. As imagens, capturadas no dia 10 de dezembro, mostram o Rio Negro em seu nível mais baixo, 13,63 metros em Manaus.
Combinando infravermelho e luz visível, a NASA tentou salientar a presença da água. O Rio Negro está significantemente menor em 2010 que em 2008, sendo que muitos dos canais que existiam há dois anos não são mais visíveis.
A seca de 2010 está acontecendo apenas cinco anos depois da seca de 2005, que na época foi chamada de a “seca que ocorre uma vez a cada 100 anos”.
Já o recorde de nível mais baixo do Negro ocorre apenas 16 meses depois do recorde de nível mais alto, 29,77 metros em Manaus. Essa variação é comum na região amazônica, mas não com essa intensidade.
A seca está sendo responsabilizada pelo aumento dos focos de queimadas e pela maior degradação florestal nas últimas semanas.
O Planeta Vai Continuar com Febre
Leonardo Boff
A COP 16 terminou na madrugada do dia 11 dezembro em Cancún com pífias conclusões, tiradas mais ou menos a forceps. São conhecidas e por isso não cabe aqui referi-las. Devido ao clima geral de decepção, foram até mais do que se esperava mas menos do que deveriam ser, dada a gravidade da crescente degradação do sistema-Terra. Predominou o espírito de Copenhague de enfrentar o problema do aquecimento global com medidas estruturadas ao redor da economia. E aqui reside o grande equívoco, pois o sistema econômico que gerou a crise não pode ser o mesmo que nos vai tirar da crise. Usando uma expressão já usada pelo autor: tentando limar os dentes do lobo, crê-se tirar-lhe a ferocidade, na ilusão de que esta reside nos dentes e não na natureza do próprio lobo. A lógica da economia dominante que visa o crescimento e o aumento do PIB implica na dominação da natureza, na desconsideração da equidade social (dai a crescente concentração de riqueza e a célere apropriação de bens comuns) e da falta de solidariedade para com as futuras gerações. E querem-nos fazer crer que esta dinâmica nos vai tirar das muitas crises, sobretudo a do aquecimento global.
Mas cumpre enfatizar: chegamos a um ponto em que se exige um completo repensamento e reorientação de nosso modo de estar no mundo. Não basta apenas uma mudança de vontade, mas sobretudo se exige a transformação da imaginação. A imaginação é a capacidade de projetar outros modos de ser, de agir, de produzir, de consumir, de nos relacionarmo-nos uns com os outros e com a Terra. A Carta da Terra foi ao coração problema e de sua possível solução ao afirmar:”Como nunca antes na história, o destino comum nos conclama a buscar um novo começo. Isto requer uma mudança nas mentes e nos corações. Requer um novo sentido de interdependência global e de responsabilidade universal. Devemos desenvolver e aplicar com imaginação a visão de um modo de vida sustentável aos níveis local, nacional, regional e global”.
Este propósito no se fez presente em nenhuma das 16 COPs. Predomina a convicção de que a crise da Terra é conjuntural e não estrutural e pode ser enfrentada com o arsenal de meios que o sistema dispõe, com acordos entre chefes de Estado e empresários quando toda a comunidade mundial deveria ser envolvida. A referência de base não é a Terra como um todo, mas os estados-nações cada qual com seus interesses particulares, regidos pela lógica do individualismo e não pela da cooperação e da interconexão de todos com todos, exigida pelo caráter global do problema. Não se firmou ainda na consciência coletiva o fato de que o Planeta é pequeno, possui recursos limitados, se encontra superpovoado, contaminado, empobrecido e doente. Não se fala em dívida ecológica. Não se toma a sério a crise ecológica generalizada que é mais que o aquecimento global. Não são suficientes a adaptação e a mitigação sem conferir centralidade à grave injustiça social mundial, aos massivos fluxos migratórios que alcançaram já a cifra de 60 milhões de pessoas, a destruição de economias frágeis com o crescimento em muitos milhões de pobres e famintos, a violação do direito à seguridade alimentar e à saúde. Falta articular a justiça social com a justiça ecológica.
O que se impõe, na verdade, é um novo olhar sobre a Terra. Ela não pode continuar a ser um baú sem fundo de recursos a serem explorados para benefício exclusivamente humano, sem considerar os outros seres vivos que também precisam da biosfera. A Terra é Mãe e Gaia, tese sustentada sem qualquer sucesso pela delegação boliviana, e por isso sujeita de direitos e merecedora de respeito e de veneração. A crise não reside na geofísica da Terra, mas na nossa relação de agressão para com ela. Nós nos tornamos numa força geofísica altamente destrutiva, inaugurando, como já se fala, o antropoceno, uma nova era geológica marcada pela intensiva intervenção descuidada e irresponsável do ser humano.
Se a humanidade não se acertar ao redor de alguns valores mínimos como a sustentabilidade, o cuidado, a responsabilidade coletiva, a cooperação e a compaixão, poderemos nos acercar de um abismo, aberto lá na frente.
*Leonardo Boff foi observador na COP-16 em Cancún.
(Envolverde/O autor)
Combate à Corrupção no Governo Lula
Jorge Hage (*)
O mundo celebrou no dia 9 o Dia Internacional Contra a Corrupção, instituído pela ONU.
Nestes dias finais do Governo Lula, é tempo de reflexão sobre o que fizemos e o que ainda precisa ser feito nessa área.
Lembremos as medidas iniciais, a base do que veio depois: o fortalecimento da CGU e da PF e a decisão de fazê-las atuar de forma articulada, em operações conjuntas, desbaratando quadrilhas há muito existentes. Pouco depois, o Sistema de Corregedorias, com uma em cada ministério.
Decisiva foi também a nova relação com o Ministério Público, para que pudesse cumprir sua função constitucional, ao contrário do que ocorria antes, quando um Procurador ganhou a alcunha de “Engavetador-Geral”. Hoje, essa autoridade é apontada pelo voto dos seus pares, o que garante sua autonomia.
No campo da transparência, este governo partiu do zero, tal era a “caixa preta” das despesas. Hoje, o Portal da Transparência é reconhecido como um dos mais completos do mundo, permitindo a qualquer cidadão saber hoje de todos os gastos feitos até ontem à noite pelo governo.
Para afastar a impunidade, que sempre imperou por aqui, já foram demitidos mais de 2,8 mil servidores. Passaram a ser punidas também as empresas fraudadoras: mais de 3,7 mil já estão proibidas de contratar com a Administração.
Claro que isso não é tudo, pois ainda não se consegue por os corruptos na cadeia, graças às leis processuais e à interpretação dada às garantias do réu. Mas pelo menos os estamos excluindo da Administração.
Esses esforços já ganharam reconhecimento internacional e levaram nosso país a uma posição de liderança. Organismos como a ONU e a OCDE vêm apontando o Brasil como modelo no esforço contra a corrupção.
O país acaba de ser bem avaliado por esta última e de ser convidado para integrar seu Comitê de Governança Pública, em Paris.
Aqui se realizou a Conferência da OEA, pela primeira vez fora dos Estados Unidos. E fomos escolhidos pela Transparência Internacional (TI), para sediar, em 2012, a Conferência Anti-Corrupção, que reúne mais de cem países.
Como se vê, conquistamos confiança e credibilidade.
Pesquisa mundial divulgada pela TI no dia 9, mostra o Brasil no grupo de países menos castigados pela praga da propina: apenas 4% dos entrevistados já foram submetidos a isso, índice igual ao Canadá e melhor que os Estados Unidos e a União Européia (5%). A média da América Latina foi 23% e a mundial 25%.
Mas o item mais divulgado em nossa mídia foi o de 54% das respostas considerando insuficiente o que o governo faz para combater corrupção. Pois bem: a mesma tabela mostra que nos EUA esse percentual é 71%, no Canadá 74, na Alemanha 76, na Inglaterra 66 e na Finlândia 65. Já no Azerbajão é de apenas 26%, no Kenia 30%, em Uganda 24% e em Sierra Leone 12%. Como assim? A tabela está invertida? Não. O que ela mostra é que quando a pergunta envolve “percepção” (em lugar de fatos concretos), a resposta depende do nível de informação, de exigência e de consciência crítica de cada sociedade. Por isso, é preciso cautela nas comparações.
Mas não resta dúvida que ainda há muito por fazer aqui. Falta a reforma política, a do financiamento de campanhas, a das emendas parlamentares e a das leis processuais, entre outras.
E certas coisas só evoluem com a pressão da sociedade. O exemplo da Lei da Ficha Limpa pode e deve multiplicar-se. Porque é muito importante que o Brasil continue avançando nessa área.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
Carnaval ou a Amazônia sem carne
João Meirelles Filho*
14 Dez 2010, 10:01
Diante de um bife mesmo os mais “conscientes” ambientalistas rendem-se à tentação e se enfastiam de tanta carne. Engole-se a pecuária bovina no Brasil como algo natural, sem notarmos a sua dimensão e urgência. Mais do que cercas e marcos, as fundações do Brasil foram socadas à pata de boi. Jamais o Brasil parou para pensar o impacto de sua decisão pela pata do boi, medir seu impacto social, ambiental e, mesmo, econômico.
Empurramos o problema para o fundo do Brasil, distante das grandes cidades, das telas das TVs... E deixamos terras arrasadas – a Mata Atlântica, a Caatinga, e agora o Cerrado e a Amazônia. Afinal, o Brasil é imenso, as terras, infinitas, e o boi sempre parte da paisagem, não é?
A “quente” última década nos oferece um cardápio picante, com temas novos como as mudanças climáticas e o esgotamento do planeta. São estudos científicos e relatórios internacionais (veja a bibliografia), que desossam a questão e, pela primeira vez, apontam o impacto da pecuária bovina sobre o Brasil e o planeta. Se o tema era visto como bravata de alguns radicais, ocupa crescente espaço, ainda de canapés, longe de ser o prato principal das questões de estado. O Brasil é que não se percebe, é o peão-de-culatra, que nada vê, a boiada adiante, pra trás a poeira...
As mudanças climáticas, a segurança alimentar, a conservação da biodiversidade, a sobrevivência de populações tradicionais, as crescentes desigualdades entre ricos e pobres, o acesso a água, são hoje questões centrais e se relacionam diretamente à maneira que a nossa comitiva conduz a pecuária bovina: de forma extensiva, a ocupar terras infinitas, ao provocar o maior processo de deslocamento de populações tradicionais, e de erosão do planeta Terra.
O que mais me surpreende é que a maioria dos brasileiros acredita que este não deva ser assunto pra se tratar na mesa: é coisa de somenos importância, conversa pra boi dormir. A minha crença particular, – e aqui me apresento como descendente de gerações de pecuaristas, que, inclusive teve sua educação e seu viver por largos anos, onde está o gerenciar uma grande propriedade de pecuária e pilotar churrasqueiras –, é que o tema é indigesto (e inconveniente, deselegante). Há enorme dificuldade em associar as decisões (sempre pessoais) de consumo, especialmente aquelas que locupletam seu estômago, com o destino do planeta Terra (ninguém quer se privar do churrasquinho de fim-de-semana, ou do bifinho- nosso-de-cada dia). O menu degustação, do presidente Luis Inácio Lula da Silva ao colega norte-americano, George W. Bush, em visita ao Brasil, em 7 de novembro de 2005, era um lauto churrasco.
Não há como contestar que se trata do maior gerador de empregos do país e cuja cultura envolve a maior parte dos habitantes do meio rural, presente em todos (todos!) os municípios do país. Mas agora que o Brasil quer se provar não mais moleque de calças curtas, como explicar a 8a economia do planeta e, ao mesmo tempo, o passivo gerado pela pecuária: a violência no campo, a escravização de mão de obra, o desmatamento da Amazônia (e do Cerrado e Caatinga), as queimadas, a informalidade da atividade etc? Pior, ainda quer impor uma agenda ambiental ao mundo, sem fazer a lição de casa. Pelo mundo afora são as churrascarias sulinas – símbolo maior do desperdício – os nossos “embaixadores”.
E no meio empresarial e político esta conversa bonitinha de sustentabilidade vai pelo ralo, toda vez que o prato do almoço é a carne bovina, cuja origem se desconhece (e nem se pretende investigar). Para nos tornarmos um país honesto, para colocar sustentabilidade no nosso cardápio, para valer, primeiro precisamos contar o que comemos no dia de hoje – um mea culpa?
A verdadeira liderança do Brasil no panorama mundial será reconhecida se tratarmos, interna e externamente, a questão da ocupação das terras de maneira madura e com o mesmo nível que se trata a questão das armas nucleares, as guerras mundiais. O Brasil, ao invés de pleitear um lugar no conselho de segurança da ONU deveria cuidar de criar o Conselho Mundial de Segurança Alimentar (e, claro, acabar com a fome em seu quintal).
Cada boi, criado extensivamente e sem monitoramento, é uma mina terrestre que destrói nosso futuro. Cada boi, e este país tem mais boi que gente, e daqui a pouco serão 300 milhões de bois e uns 200 milhões de gentes, é um atentando a nossa visão de futuro, a nossa cultura e alegria.
A pecuária bovina é, em extensão territorial, a atividade humana mais impactante no planeta. E se estamos a consumir mais recursos que o planeta é capaz de prover, tratar da pecuária bovina é a questão mais importante, o prato do dia. Afinal, a pecuária bovina (incluindo a comida para alimentar animais) ocupa 2/3 das terras aráveis do planeta e atende (mal) menos de 30% dos consumidores do mundo. A pecuária como fonte de riqueza, efetivamente, beneficia uma pequena parcela de seus atores; atua muito mais como poupança e subsistência.
Dos 850 milhões de hectares do Brasil, a pecuária ocupa cerca de 220 milhões de hectares (cerca de 25%). A atividade é a principal responsável por alterações nas paisagens naturais do Brasil. A Mata Atlântica (que perdeu mais de 90% de sua área) foi principalmente alterada pela pecuária bovina e não pela cana-de-açúcar ou o café. O mesmo ocorre com a Caatinga e Cerrado.
A manutenção de uma pecuária de baixa produtividade agrava a questão. O melhor indicador é a taxa de abate (número de cabeças abatidas pelo total do rebanho). Esta encontra-se atolada próxima dos 20% e dificilmente se moverá para patamares dos EUA, União Européia e Austrália (superiores a 30%).
Na Amazônia, a pecuária bovina extensiva é responsável por ocupar 80% das áreas desmatadas (cerca de 60 milhões de hectares para o boi). No que se refere a mudanças climáticas, se não há concordância quanto a valores (quantos quilos de CO2 um quilo de carne bovina produz) comunga-se que o tema seja urgente (1 - clique para ver referência). Entre os estudos está o do CENA (Centro de Energia Nuclear da Agricultura, da USP), coordenado por Carlos Cerri, de 2009, que avalia as emissões brasileiras. Estas aumentaram 24,6% de 1990 a 2005, obrigando, inclusive, o governo brasileiro a se posicionar.
E a pecuária, graças à forma de digestão do boi (fermentação de gases como o metano no estômago do boi e sua liberação via arroto e pum), responderia por 12% das emissões brasileiras. Outros 51,9% adviriam dos desmatamentos (e queimadas) da Amazônia (e demais biomas), ou seja, somando-se a pecuária e a mudança de vegetação teríamos algo como 2/ 3 das emissões brasileiras, em contrapartida com 1/3 de outras fontes, como a queima de combustíveis fósseis.
Se considerado o aumento do rebanho bovino brasileiro em 15 anos (de 1994 a 2007), este cresceu 26% (de 158,2 mm a 199,7 mm (IBGE), enquanto as emissões do setor agropecuário cresceram 30%. Ou seja, fomos mais ineficientes na maneira de explorar a terra.
Se estes temas eram tratados separadamente, o relatório da FAO e LEAD - Livestock Environmental Development, representa um marco (Steinfeld, Henning et alii). Nas palavras de Henning Steinfeld, Chefe do Livestock Information and Policy Branch: “A pecuária é um dos maiores responsáveis pelos grandes problemas ambientais atuais. São necessárias ações urgentes para mitigar esta situação”. (2 - Clique para ver referência)
Estes e outros temas foram aprofundados pela FAO em seu relatório The State of Food And Agriculture – Livestock in the balance (FAO, 2009). Entre as conclusões está a pressão por dobrar a produção de carne em 40 anos (2050) de 228 milhões para 463 milhões de toneladas. Isto resultaria no aumento de 73% de cabeças de bovinos de 1,5 bilhão para 2,6 bilhões, sem falar de outros animais. Se isto deixa eufóricos os frigoríficos, exportadores e outros, deveria ser motivo de pânico para aqueles preocupados com as mudanças climáticas (nós, cidadãos do Brasil e demais terráqueos).
Se o consumo mundial aumenta (em verdade, explode), as terras disponíveis não aumentam, pelo contrário, a degradação dos solos as torna menos propícias. Outro fator, é que boa parte destas terras estão cobertas pelo que ainda resta de florestas tropicais ou sub-tropicais, em biomas críticos para os povos tradicionais, a conservação da biodiversidade e da água. Nos últimos 60 anos as florestas tropicais foram reduzidas à metade. Pensem nisto! E o Brasil possui mais da metade do que resta, em verdade o maior patrimônio natural do país. Vamos haitizar o Brasil?
A questão brasileira também deve que ser analisada sob o ângulo do consumo: este aumenta de forma consistente (0,5 kg/ano e está em cerca de 36,7 kg – 2007), assim como o peso médio da população e o glutonismo. No cenário de inclusão econômica de milhões de pessoas, deixando a categoria de miséria para a de pobreza, subindo um degrau, das classes E para a D e de D para C, o consumo de carne per capta aumenta substancialmente. Numa perspectiva de 20 anos, o aumento de 0,5 kg/capta/ano, pode resultar em mais 10 kg/capta, simploriamente, para uma população de 200 milhões de habitantes seriam 2 milhões de ton./ ano a mais. Trata-se de elevar o consumo interno de 6,8 milhões ton. para 8,8 milhões de ton./ ano, 29% a mais. E isto sem contar o aumento do consumo internacional, crescente em países asiáticos principalmente. O Brasil já é o maior exportador mundial.
Há 6 fatores que merecem atenção:
a) Dimensões da área utilizada pela pecuária bovina no Brasil – são entre 180 milhões e 220 milhões de hectares. É surpreendente o desinteresse oficial em medir este impacto, o que resulta em uma diferença entre os diversos índices de uma superfície maior que 40 milhões de hectares (maior que 1,5 vezes o estado de São Paulo). Esta “pequena” imprecisão equivale à área de plantio de todas as culturas agrícolas no país fora da soja. Tão importante quanto medir o desmatamento na Amazônia deveria ser monitorar, de forma permanente, a área de 2 pastagem no Brasil e sua produtividade.
b) Migração do rebanho para a Amazônia – Este fenômeno é dos mais impressionantes da história mundial. Nunca uma região recebeu tão grande rebanho em tão curto espaço de tempo. Este cresceu de cerca de 3 milhões de cabeças, que utilizavam, principalmente, pastagens naturais, para 85 milhões de cabeças (28 vezes). E este se deve, integralmente, às áreas desmatadas a partir do golpe militar de 1964. A área hoje aberta, mesmo havendo controvérsia entre os diferentes mecanismos de medição (INPE, IMAZON, EMBRAPA), estaria próxima de 70 milhões de hectares. Trata-se de uma superfície maior que os estados de RS, SC, PR, SP, RJ, ES somados! Se fosse na Europa seria maior que Alemanha e Itália juntas. Desta área, entre 70 a 80% estariam dedicados à pecuária bovina extensiva, com diferentes graus de aproveitamento. Se esta abriga um rebanho de 85 milhões de cabeças, onde cerca de 10 milhões seriam de gado clandestino, teríamos 1,21 cabeças/ha (não se trata de uma medida técnica, que exigiria contabilizar unidades animais e não cabeças, mas aqui é apenas para promover um raciocínio que poucos querem se dar ao luxo de ter). Ora, se a EMBRAPA, EMATER e outros organismos apresentam que facilmente se pode chegar a 3 cabeças/ha, por que necessitamos de tantas áreas desmatadas e de mais áreas de floresta tropical convertida em pasto?
c) Abandono das áreas tradicionais de pecuária na Amazônia – resultado, principalmente da capacidade de modernização de regiões de pastagens naturais de várzeas, do Marajó e campos naturais. O esgotamento do modelo de exploração extensivo, onde não há mais espaço para gado sem padrão (falta de padronagem, idade avançada, falta de melhoramento genético, falta de manejo, insuficiente aplicação de vacinas, uso de sal mineral e complementos, etc.) é fator decisivo.
d) Continuidade da expansão da fronteira agrícola na Amazônia – mesmo esgotados os modelos de expansão da fronteira pioneira como política pública de “ocupação” da região, novos clusters de mineração, hidrelétricas, bioenergia, estradas e linhões, em dimensões espetaculares retomam a ocupação, e consolidação da fronteira agrícola. Afinal, estão previstos pelo menos 100 grandes empreendimentos nos próximos 10 anos. A injeção de pelo menos R$ 200 bilhões em capital e a forte migração forçarão o aumento do rebanho, que, ocupará áreas próximas aos novos centros de consumo (mais desmatamento).
e) Consolidação dos assentamentos rurais – são mais de 2.546 (2009) na Amazônia, ocupando área superior a 25,1 milhões de hectares (equivalente ao estado de São Paulo) e atendendo população superior a 500 mil pessoas, com impacto pouco conhecido e discutido (vide IMAZON). Sucede que cerca de 1/5 dos desmatamentos são provenientes destes assentamentos. Especialmente quando se considera que a maioria das áreas abertas é dedicada à pecuária extensiva (mais de 80%).
f) Políticas públicas que não relacionam pecuária com devastação ambiental e caos social – a falta de políticas públicas de longo prazo, e consistentes, está diretamente relacionada a quem controla o poder nos diferentes organismos, em todas as esferas do executivo, legislativo e até no judiciário, onde boa parte possui relação direta com a pecuária bovina (a sua poupança, ou sua origem), e a quem não interessa mudar o status quo. Pode-se denominar este fenômeno como o “olhar bovino da esfera pública”. Esta turma evita que o boi seja tratado como tema público, de segurança nacional, pois fere seus interesses privados. A proposta é empurrar a questão do boi com a barriga, para as próximas gerações decidirem, pra depois do carnaval (carne vale – do latim, que poderia ser traduzido por “adeus à carne”, o período sem carne).
Não surpreende, desta forma, que os avanços da despecuarização da região estejam relacionados a gatilhos exógenos ao sistema, sejam resultantes do trabalho de organizações ambientalistas (Greenpeace, Repórter Brasil, Amigos da Terra etc.), ou, surpreendentemente, por grandes redes de supermercado (principalmente o Wal Mart). Ao Ministério Público, federal e estadual, deve se computar o mérito maior, como defensores da causa pública, ou mesmo por novos fatores como o plantio de culturas permanentes (dendê, eucalipto), ocupando áreas ínfimas diante do espaço que o boi come ao planeta.
Como mudar este cenário?
Se as mudanças não surgirem do próprio setor pecuarista – de seus empresários, executivos, técnicos, pecuaristas familiares – estas dificilmente serão implementadas. Numa região onde o estado é ausente, não há como esperar que o estado atue de maneira transformadora. Primeiro, deve se fazer presente!
Outros setores da sociedade podem até se mobilizar para contribuir, apoiar, ou pressionar, mas cabe ao próprio setor rural, numa revisão de seu papel, apresentar nova proposta, novo contrato com a sociedade. Três dimensões apontam caminhos. A primeira são projetos piloto, de pequena dimensão diante do desafio: O Programa Carne Orgânica do Pantanal (WWF e a Associação Brasileira de Pecuária Orgânica (ABPO); O Programa de Município Verde (Imazon, TNC, Fundo Vale e outros); a ampliação do Cadastro Ambiental Rural (CAR); O I Katu Xingu (ISA), o Cadastro de Compromisso Socioambiental (CCSX) do Xingu (Aliança da Terra, IPAM, WHRC, IFC, JBS).
A segunda é a das novas alianças intersetoriais, os fóruns de discussão e negociação (Conexões Sustentáveis – Pecuária; e do Grupo de Pecuária Sustentável). A terceira refere-se ao surgimento de certificações dedicadas ao tema. Há grande esperança na recém lançada – de 16 de novembro de 2010 – SAN - Norma para Sistemas Sustentáveis de Produção Pecuária (SAIN, Imaflora, Amigos da Terra, Rainforest Alliance, outros).
Tudo isto é pouco perante o imobilismo das organizações públicas e a falta de realismo das organizações empresariais do setor. Os novos desafios – mudanças climáticas, explosão do consumo, continuidade de desmatamento, a concentração de renda e poder – exigem respostas urgentes para a pergunta como modernizar o setor? Está na hora de renegociar o “negócio pecuária” à luz das prioridades socioplanetárias, repensar as cadeias de valores, a presença do estado e os mecanismos de monitoramento e regulação.
Propostas para a Amazônia
Para avançar de maneira consistente é preciso:
a) Estabelecer pacto para a pecuária bovina – negociar a retirada de tão vasto território para o boi – o Brasil (e a Amazônia em especial) precisa ter metas estabelecer metas para diminuir a área de impacto, de forma consistente; um sistema tributário eficiente (via ITR) contribuiria para coibir terras de baixa produtividade e apoiar aquelas para a conservação ou outros usos florestais. Metas drásticas, e um sistema de indicadores e monitoramento.
b) Reforçar e modernizar a assistência técnica – fortalecer “pra valer” os organismos de assistência técnica (hoje principalmente na esfera estadual). É vergonhoso o estado das atuais EMATER. No nível municipal na Amazônia inexiste tais sistemas (são cerca de 600 municípios)
c) Criar a Escola de Gestão Agrícola – É preciso investir de forma consistente para criar a “Fundação Getúlio Vargas da gestão agrícola”.
d) Fortalecer as Escolas Técnicas Agrícolas - estas precisam alcançar o nível de realismo que os novos desafios apresentam (incluir questões como sociodiversidade, mudanças climáticas e justiça social); e) Incluir a Sustentabilidade Rural no Currículo escolar – a sustentabilidade da pecuária (e dos negócios rurais) deve ser discutida no currículo escolar, pelo menos no meio rural e nas pequenas cidades.f) Modernizar as organizações associativas e sindicais – a maior parte das organizações associativas e sindicais carece de alternância, participação de jovens e visão sistêmica. É preciso investir para incluir os diferentes setores da atividade e garantir processos democráticos e participativos, que incorporem os novos desafios globais;g) Democratizar o debate sobre a pecuária – o debate é muito elitista, a maior parte, mesmo dos pecuaristas (principalmente os pequenos, a imensa maioria), não participa e não compreende as questões envolvidos e suas dimensões. Qualificar os representantes e lideranças locais para o debate é fundamental para este processo democrático. É fundamental, ainda, contar com representantes de assentados e de comunidades tradicionais; h) Oferecer plataformas de comunicação e de conteúdo gratuito para a tomada de decisão – via internet, rádio, televisão, enfim, utilizar as novas mídias para este desafio.
Como propõe o pesquisador Paulo Fernandes (em recente palestra FAEPA, AMAZONPEC 15/9/2010), da EMBRAPA Amazônia Oriental, a globalização do mercado deve ser compreendida em novo contexto, a saber: se pensarmos sistemas como sistemas locais, estaremos fora do mercado. Os mercados são mundiais – embargos de toda ordem são ameaça – fazer o dever de casa ambientalmente aceitável, social, sanitário... Ou nos adequamos a regras internacionais ou estaremos fora do mercado!
Mas, antes de tudo, é preciso aceitar, como primeira parte da lição de casa, que existe uma enorme divida social e ambiental provocada pela atividade.
*João Meirelles Filho, empreendedor social, diretor geral do Instituto Peabiru e autor Livro de Ouro da Amazônia, Ediouro, 2007. Este artigo é parte de um estudo apoiado pela Fundação AVINA para repensar a pecuária da Amazônia.
Bibliografia
Agence France-Presse; Eat a steak, warm the planet (18/07/2007) http://www.afp.com/ francais/home
Aliança da Terra - http://www.aliancadaterra.org.br/,. AMIGOS DA TERRA AMAZONIA BRASILEIRA; O Reino do Gado – uma nova fase da pecuarização da Amazônia brasileira; São Paulo; 30 pg. Jan 2008
_________; A hora da conta: Pecuária, Amazônia e conjuntura; São Paulo; Abril 2009 FAO/LEAD; Steinfeld, Henning et alii; Livestock Long Shadow, Environmental Issues and options - The Livestock Environmental Development (LEAD); Roma, Itália; 408 pg, FAO; The State of Food And Agriculture – Livestock in the balance; FAO, Roma, 2009, ISSN 0081-4539.; Roma, Itália; 78 pg
Goodland, Robert e Livestock and climate change - What if the key actors in climate change are cows, pigs, and chickens? , Worldwatch, Nov-Dez 2009, pg 11-19, www.worldwatch.org/ ww/livestock
Global Canopy Foundation – Forest Footprint Disclosure - http://www.forestdisclosure.com. Comentário: Importante abordagem sobre commodities, nas quais a carne se insere.
Greenpeace - http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Documentos/Farra-do-Boi-na-Amazonia/
IPAM - ALIANÇA DA TERRA; CCSX; IPAM; WHRC. Critérios, indicadores e meios de verificação para classificação das propriedades no Cadastro de Compromisso Socioambiental do Xingu. Fevereiro, 2009. http://www.ipam.org.br/biblioteca/livro/id/47
ISA – Instituto Socioambiental – Instrumentos Econômicos e Financeiros como fator para a Conservação Ambiental no Brasil, Uma Análise no Estado da Arte no Brasil e no Mato Grosso, 2007; http://www.socioambiental.org/banco_imagens/pdfs/10295.pdf
Lappé, Francis Moore; Diet for a small planet (1st Ed 1971), Small Planet Institute. http:// www.smallplanet.org/books/item/diet_for_a_small_planet/
Livestock Emissions and Abatement Research Network http://www.livestockemissions.net/ - Comentário: ainda que não haja atualização adequada deste web-site há diversas questões importantes aqui levantadas, que podem ser complementadas estudando o tema nos web-sites da Embrapa e outros.
MEIRELLES Fo, João; Livro de Ouro da Amazônia; Ediouro, 1a Ed 2004, 5a Ed 2007, Rio de Janeiro, RJ
Osava, Mario; Cattle, the ignored predator, IPS, 11 Nov 2009; Rede de Agricultura Sustentável – SAS e Rainforest Alliance;
SAN Norma para Sistemas Sustentáveis de Produção Pecuária Julho 2010.do’ http://www.imaflora.org/upload/repositorio/ SAN_Norma_para_Sistemas_Sustentaveis_de_Producao_Pecuaria_Julho_2010.pdf www.sanstandards.org
REPORTER BRASIL - http://www.reporterbrasil.org.br
14 Dez 2010, 10:01
“Posso dizer que não há possibilidade de um cidadão brasileiro
dizer em qualquer lugar do mundo que é preciso derrubar um pé de árvore
na Amazônia para criar uma cabeça de gado ou plantar um pé de cana ou oleaginosa”-
Luis Inácio Lula da Silva. (Agência Estado 22/02/2008):
dizer em qualquer lugar do mundo que é preciso derrubar um pé de árvore
na Amazônia para criar uma cabeça de gado ou plantar um pé de cana ou oleaginosa”-
Luis Inácio Lula da Silva. (Agência Estado 22/02/2008):
Empurramos o problema para o fundo do Brasil, distante das grandes cidades, das telas das TVs... E deixamos terras arrasadas – a Mata Atlântica, a Caatinga, e agora o Cerrado e a Amazônia. Afinal, o Brasil é imenso, as terras, infinitas, e o boi sempre parte da paisagem, não é?
A “quente” última década nos oferece um cardápio picante, com temas novos como as mudanças climáticas e o esgotamento do planeta. São estudos científicos e relatórios internacionais (veja a bibliografia), que desossam a questão e, pela primeira vez, apontam o impacto da pecuária bovina sobre o Brasil e o planeta. Se o tema era visto como bravata de alguns radicais, ocupa crescente espaço, ainda de canapés, longe de ser o prato principal das questões de estado. O Brasil é que não se percebe, é o peão-de-culatra, que nada vê, a boiada adiante, pra trás a poeira...
As mudanças climáticas, a segurança alimentar, a conservação da biodiversidade, a sobrevivência de populações tradicionais, as crescentes desigualdades entre ricos e pobres, o acesso a água, são hoje questões centrais e se relacionam diretamente à maneira que a nossa comitiva conduz a pecuária bovina: de forma extensiva, a ocupar terras infinitas, ao provocar o maior processo de deslocamento de populações tradicionais, e de erosão do planeta Terra.
O que mais me surpreende é que a maioria dos brasileiros acredita que este não deva ser assunto pra se tratar na mesa: é coisa de somenos importância, conversa pra boi dormir. A minha crença particular, – e aqui me apresento como descendente de gerações de pecuaristas, que, inclusive teve sua educação e seu viver por largos anos, onde está o gerenciar uma grande propriedade de pecuária e pilotar churrasqueiras –, é que o tema é indigesto (e inconveniente, deselegante). Há enorme dificuldade em associar as decisões (sempre pessoais) de consumo, especialmente aquelas que locupletam seu estômago, com o destino do planeta Terra (ninguém quer se privar do churrasquinho de fim-de-semana, ou do bifinho- nosso-de-cada dia). O menu degustação, do presidente Luis Inácio Lula da Silva ao colega norte-americano, George W. Bush, em visita ao Brasil, em 7 de novembro de 2005, era um lauto churrasco.
Não há como contestar que se trata do maior gerador de empregos do país e cuja cultura envolve a maior parte dos habitantes do meio rural, presente em todos (todos!) os municípios do país. Mas agora que o Brasil quer se provar não mais moleque de calças curtas, como explicar a 8a economia do planeta e, ao mesmo tempo, o passivo gerado pela pecuária: a violência no campo, a escravização de mão de obra, o desmatamento da Amazônia (e do Cerrado e Caatinga), as queimadas, a informalidade da atividade etc? Pior, ainda quer impor uma agenda ambiental ao mundo, sem fazer a lição de casa. Pelo mundo afora são as churrascarias sulinas – símbolo maior do desperdício – os nossos “embaixadores”.
E no meio empresarial e político esta conversa bonitinha de sustentabilidade vai pelo ralo, toda vez que o prato do almoço é a carne bovina, cuja origem se desconhece (e nem se pretende investigar). Para nos tornarmos um país honesto, para colocar sustentabilidade no nosso cardápio, para valer, primeiro precisamos contar o que comemos no dia de hoje – um mea culpa?
A verdadeira liderança do Brasil no panorama mundial será reconhecida se tratarmos, interna e externamente, a questão da ocupação das terras de maneira madura e com o mesmo nível que se trata a questão das armas nucleares, as guerras mundiais. O Brasil, ao invés de pleitear um lugar no conselho de segurança da ONU deveria cuidar de criar o Conselho Mundial de Segurança Alimentar (e, claro, acabar com a fome em seu quintal).
A pecuária bovina é, em extensão territorial, a atividade humana mais impactante no planeta. E se estamos a consumir mais recursos que o planeta é capaz de prover, tratar da pecuária bovina é a questão mais importante, o prato do dia. |
A pecuária bovina é, em extensão territorial, a atividade humana mais impactante no planeta. E se estamos a consumir mais recursos que o planeta é capaz de prover, tratar da pecuária bovina é a questão mais importante, o prato do dia. Afinal, a pecuária bovina (incluindo a comida para alimentar animais) ocupa 2/3 das terras aráveis do planeta e atende (mal) menos de 30% dos consumidores do mundo. A pecuária como fonte de riqueza, efetivamente, beneficia uma pequena parcela de seus atores; atua muito mais como poupança e subsistência.
Dos 850 milhões de hectares do Brasil, a pecuária ocupa cerca de 220 milhões de hectares (cerca de 25%). A atividade é a principal responsável por alterações nas paisagens naturais do Brasil. A Mata Atlântica (que perdeu mais de 90% de sua área) foi principalmente alterada pela pecuária bovina e não pela cana-de-açúcar ou o café. O mesmo ocorre com a Caatinga e Cerrado.
A manutenção de uma pecuária de baixa produtividade agrava a questão. O melhor indicador é a taxa de abate (número de cabeças abatidas pelo total do rebanho). Esta encontra-se atolada próxima dos 20% e dificilmente se moverá para patamares dos EUA, União Européia e Austrália (superiores a 30%).
Na Amazônia, a pecuária bovina extensiva é responsável por ocupar 80% das áreas desmatadas (cerca de 60 milhões de hectares para o boi). No que se refere a mudanças climáticas, se não há concordância quanto a valores (quantos quilos de CO2 um quilo de carne bovina produz) comunga-se que o tema seja urgente (1 - clique para ver referência). Entre os estudos está o do CENA (Centro de Energia Nuclear da Agricultura, da USP), coordenado por Carlos Cerri, de 2009, que avalia as emissões brasileiras. Estas aumentaram 24,6% de 1990 a 2005, obrigando, inclusive, o governo brasileiro a se posicionar.
E a pecuária, graças à forma de digestão do boi (fermentação de gases como o metano no estômago do boi e sua liberação via arroto e pum), responderia por 12% das emissões brasileiras. Outros 51,9% adviriam dos desmatamentos (e queimadas) da Amazônia (e demais biomas), ou seja, somando-se a pecuária e a mudança de vegetação teríamos algo como 2/ 3 das emissões brasileiras, em contrapartida com 1/3 de outras fontes, como a queima de combustíveis fósseis.
Se considerado o aumento do rebanho bovino brasileiro em 15 anos (de 1994 a 2007), este cresceu 26% (de 158,2 mm a 199,7 mm (IBGE), enquanto as emissões do setor agropecuário cresceram 30%. Ou seja, fomos mais ineficientes na maneira de explorar a terra.
Se estes temas eram tratados separadamente, o relatório da FAO e LEAD - Livestock Environmental Development, representa um marco (Steinfeld, Henning et alii). Nas palavras de Henning Steinfeld, Chefe do Livestock Information and Policy Branch: “A pecuária é um dos maiores responsáveis pelos grandes problemas ambientais atuais. São necessárias ações urgentes para mitigar esta situação”. (2 - Clique para ver referência)
Estes e outros temas foram aprofundados pela FAO em seu relatório The State of Food And Agriculture – Livestock in the balance (FAO, 2009). Entre as conclusões está a pressão por dobrar a produção de carne em 40 anos (2050) de 228 milhões para 463 milhões de toneladas. Isto resultaria no aumento de 73% de cabeças de bovinos de 1,5 bilhão para 2,6 bilhões, sem falar de outros animais. Se isto deixa eufóricos os frigoríficos, exportadores e outros, deveria ser motivo de pânico para aqueles preocupados com as mudanças climáticas (nós, cidadãos do Brasil e demais terráqueos).
Se o consumo mundial aumenta (em verdade, explode), as terras disponíveis não aumentam, pelo contrário, a degradação dos solos as torna menos propícias. Outro fator, é que boa parte destas terras estão cobertas pelo que ainda resta de florestas tropicais ou sub-tropicais, em biomas críticos para os povos tradicionais, a conservação da biodiversidade e da água. Nos últimos 60 anos as florestas tropicais foram reduzidas à metade. Pensem nisto! E o Brasil possui mais da metade do que resta, em verdade o maior patrimônio natural do país. Vamos haitizar o Brasil?
A questão brasileira também deve que ser analisada sob o ângulo do consumo: este aumenta de forma consistente (0,5 kg/ano e está em cerca de 36,7 kg – 2007), assim como o peso médio da população e o glutonismo. No cenário de inclusão econômica de milhões de pessoas, deixando a categoria de miséria para a de pobreza, subindo um degrau, das classes E para a D e de D para C, o consumo de carne per capta aumenta substancialmente. Numa perspectiva de 20 anos, o aumento de 0,5 kg/capta/ano, pode resultar em mais 10 kg/capta, simploriamente, para uma população de 200 milhões de habitantes seriam 2 milhões de ton./ ano a mais. Trata-se de elevar o consumo interno de 6,8 milhões ton. para 8,8 milhões de ton./ ano, 29% a mais. E isto sem contar o aumento do consumo internacional, crescente em países asiáticos principalmente. O Brasil já é o maior exportador mundial.
Há 6 fatores que merecem atenção:
a) Dimensões da área utilizada pela pecuária bovina no Brasil – são entre 180 milhões e 220 milhões de hectares. É surpreendente o desinteresse oficial em medir este impacto, o que resulta em uma diferença entre os diversos índices de uma superfície maior que 40 milhões de hectares (maior que 1,5 vezes o estado de São Paulo). Esta “pequena” imprecisão equivale à área de plantio de todas as culturas agrícolas no país fora da soja. Tão importante quanto medir o desmatamento na Amazônia deveria ser monitorar, de forma permanente, a área de 2 pastagem no Brasil e sua produtividade.
b) Migração do rebanho para a Amazônia – Este fenômeno é dos mais impressionantes da história mundial. Nunca uma região recebeu tão grande rebanho em tão curto espaço de tempo. Este cresceu de cerca de 3 milhões de cabeças, que utilizavam, principalmente, pastagens naturais, para 85 milhões de cabeças (28 vezes). E este se deve, integralmente, às áreas desmatadas a partir do golpe militar de 1964. A área hoje aberta, mesmo havendo controvérsia entre os diferentes mecanismos de medição (INPE, IMAZON, EMBRAPA), estaria próxima de 70 milhões de hectares. Trata-se de uma superfície maior que os estados de RS, SC, PR, SP, RJ, ES somados! Se fosse na Europa seria maior que Alemanha e Itália juntas. Desta área, entre 70 a 80% estariam dedicados à pecuária bovina extensiva, com diferentes graus de aproveitamento. Se esta abriga um rebanho de 85 milhões de cabeças, onde cerca de 10 milhões seriam de gado clandestino, teríamos 1,21 cabeças/ha (não se trata de uma medida técnica, que exigiria contabilizar unidades animais e não cabeças, mas aqui é apenas para promover um raciocínio que poucos querem se dar ao luxo de ter). Ora, se a EMBRAPA, EMATER e outros organismos apresentam que facilmente se pode chegar a 3 cabeças/ha, por que necessitamos de tantas áreas desmatadas e de mais áreas de floresta tropical convertida em pasto?
c) Abandono das áreas tradicionais de pecuária na Amazônia – resultado, principalmente da capacidade de modernização de regiões de pastagens naturais de várzeas, do Marajó e campos naturais. O esgotamento do modelo de exploração extensivo, onde não há mais espaço para gado sem padrão (falta de padronagem, idade avançada, falta de melhoramento genético, falta de manejo, insuficiente aplicação de vacinas, uso de sal mineral e complementos, etc.) é fator decisivo.
d) Continuidade da expansão da fronteira agrícola na Amazônia – mesmo esgotados os modelos de expansão da fronteira pioneira como política pública de “ocupação” da região, novos clusters de mineração, hidrelétricas, bioenergia, estradas e linhões, em dimensões espetaculares retomam a ocupação, e consolidação da fronteira agrícola. Afinal, estão previstos pelo menos 100 grandes empreendimentos nos próximos 10 anos. A injeção de pelo menos R$ 200 bilhões em capital e a forte migração forçarão o aumento do rebanho, que, ocupará áreas próximas aos novos centros de consumo (mais desmatamento).
e) Consolidação dos assentamentos rurais – são mais de 2.546 (2009) na Amazônia, ocupando área superior a 25,1 milhões de hectares (equivalente ao estado de São Paulo) e atendendo população superior a 500 mil pessoas, com impacto pouco conhecido e discutido (vide IMAZON). Sucede que cerca de 1/5 dos desmatamentos são provenientes destes assentamentos. Especialmente quando se considera que a maioria das áreas abertas é dedicada à pecuária extensiva (mais de 80%).
f) Políticas públicas que não relacionam pecuária com devastação ambiental e caos social – a falta de políticas públicas de longo prazo, e consistentes, está diretamente relacionada a quem controla o poder nos diferentes organismos, em todas as esferas do executivo, legislativo e até no judiciário, onde boa parte possui relação direta com a pecuária bovina (a sua poupança, ou sua origem), e a quem não interessa mudar o status quo. Pode-se denominar este fenômeno como o “olhar bovino da esfera pública”. Esta turma evita que o boi seja tratado como tema público, de segurança nacional, pois fere seus interesses privados. A proposta é empurrar a questão do boi com a barriga, para as próximas gerações decidirem, pra depois do carnaval (carne vale – do latim, que poderia ser traduzido por “adeus à carne”, o período sem carne).
Não surpreende, desta forma, que os avanços da despecuarização da região estejam relacionados a gatilhos exógenos ao sistema, sejam resultantes do trabalho de organizações ambientalistas (Greenpeace, Repórter Brasil, Amigos da Terra etc.), ou, surpreendentemente, por grandes redes de supermercado (principalmente o Wal Mart). Ao Ministério Público, federal e estadual, deve se computar o mérito maior, como defensores da causa pública, ou mesmo por novos fatores como o plantio de culturas permanentes (dendê, eucalipto), ocupando áreas ínfimas diante do espaço que o boi come ao planeta.
Como mudar este cenário?
Se as mudanças não surgirem do próprio setor pecuarista – de seus empresários, executivos, técnicos, pecuaristas familiares – estas dificilmente serão implementadas. Numa região onde o estado é ausente, não há como esperar que o estado atue de maneira transformadora. Primeiro, deve se fazer presente!
Outros setores da sociedade podem até se mobilizar para contribuir, apoiar, ou pressionar, mas cabe ao próprio setor rural, numa revisão de seu papel, apresentar nova proposta, novo contrato com a sociedade. Três dimensões apontam caminhos. A primeira são projetos piloto, de pequena dimensão diante do desafio: O Programa Carne Orgânica do Pantanal (WWF e a Associação Brasileira de Pecuária Orgânica (ABPO); O Programa de Município Verde (Imazon, TNC, Fundo Vale e outros); a ampliação do Cadastro Ambiental Rural (CAR); O I Katu Xingu (ISA), o Cadastro de Compromisso Socioambiental (CCSX) do Xingu (Aliança da Terra, IPAM, WHRC, IFC, JBS).
A segunda é a das novas alianças intersetoriais, os fóruns de discussão e negociação (Conexões Sustentáveis – Pecuária; e do Grupo de Pecuária Sustentável). A terceira refere-se ao surgimento de certificações dedicadas ao tema. Há grande esperança na recém lançada – de 16 de novembro de 2010 – SAN - Norma para Sistemas Sustentáveis de Produção Pecuária (SAIN, Imaflora, Amigos da Terra, Rainforest Alliance, outros).
Tudo isto é pouco perante o imobilismo das organizações públicas e a falta de realismo das organizações empresariais do setor. Os novos desafios – mudanças climáticas, explosão do consumo, continuidade de desmatamento, a concentração de renda e poder – exigem respostas urgentes para a pergunta como modernizar o setor? Está na hora de renegociar o “negócio pecuária” à luz das prioridades socioplanetárias, repensar as cadeias de valores, a presença do estado e os mecanismos de monitoramento e regulação.
Propostas para a Amazônia
Para avançar de maneira consistente é preciso:
a) Estabelecer pacto para a pecuária bovina – negociar a retirada de tão vasto território para o boi – o Brasil (e a Amazônia em especial) precisa ter metas estabelecer metas para diminuir a área de impacto, de forma consistente; um sistema tributário eficiente (via ITR) contribuiria para coibir terras de baixa produtividade e apoiar aquelas para a conservação ou outros usos florestais. Metas drásticas, e um sistema de indicadores e monitoramento.
b) Reforçar e modernizar a assistência técnica – fortalecer “pra valer” os organismos de assistência técnica (hoje principalmente na esfera estadual). É vergonhoso o estado das atuais EMATER. No nível municipal na Amazônia inexiste tais sistemas (são cerca de 600 municípios)
c) Criar a Escola de Gestão Agrícola – É preciso investir de forma consistente para criar a “Fundação Getúlio Vargas da gestão agrícola”.
d) Fortalecer as Escolas Técnicas Agrícolas - estas precisam alcançar o nível de realismo que os novos desafios apresentam (incluir questões como sociodiversidade, mudanças climáticas e justiça social); e) Incluir a Sustentabilidade Rural no Currículo escolar – a sustentabilidade da pecuária (e dos negócios rurais) deve ser discutida no currículo escolar, pelo menos no meio rural e nas pequenas cidades.f) Modernizar as organizações associativas e sindicais – a maior parte das organizações associativas e sindicais carece de alternância, participação de jovens e visão sistêmica. É preciso investir para incluir os diferentes setores da atividade e garantir processos democráticos e participativos, que incorporem os novos desafios globais;g) Democratizar o debate sobre a pecuária – o debate é muito elitista, a maior parte, mesmo dos pecuaristas (principalmente os pequenos, a imensa maioria), não participa e não compreende as questões envolvidos e suas dimensões. Qualificar os representantes e lideranças locais para o debate é fundamental para este processo democrático. É fundamental, ainda, contar com representantes de assentados e de comunidades tradicionais; h) Oferecer plataformas de comunicação e de conteúdo gratuito para a tomada de decisão – via internet, rádio, televisão, enfim, utilizar as novas mídias para este desafio.
Como propõe o pesquisador Paulo Fernandes (em recente palestra FAEPA, AMAZONPEC 15/9/2010), da EMBRAPA Amazônia Oriental, a globalização do mercado deve ser compreendida em novo contexto, a saber: se pensarmos sistemas como sistemas locais, estaremos fora do mercado. Os mercados são mundiais – embargos de toda ordem são ameaça – fazer o dever de casa ambientalmente aceitável, social, sanitário... Ou nos adequamos a regras internacionais ou estaremos fora do mercado!
Mas, antes de tudo, é preciso aceitar, como primeira parte da lição de casa, que existe uma enorme divida social e ambiental provocada pela atividade.
*João Meirelles Filho, empreendedor social, diretor geral do Instituto Peabiru e autor Livro de Ouro da Amazônia, Ediouro, 2007. Este artigo é parte de um estudo apoiado pela Fundação AVINA para repensar a pecuária da Amazônia.
Bibliografia
Agence France-Presse; Eat a steak, warm the planet (18/07/2007) http://www.afp.com/ francais/home
Aliança da Terra - http://www.aliancadaterra.org.br/,. AMIGOS DA TERRA AMAZONIA BRASILEIRA; O Reino do Gado – uma nova fase da pecuarização da Amazônia brasileira; São Paulo; 30 pg. Jan 2008
_________; A hora da conta: Pecuária, Amazônia e conjuntura; São Paulo; Abril 2009 FAO/LEAD; Steinfeld, Henning et alii; Livestock Long Shadow, Environmental Issues and options - The Livestock Environmental Development (LEAD); Roma, Itália; 408 pg, FAO; The State of Food And Agriculture – Livestock in the balance; FAO, Roma, 2009, ISSN 0081-4539.; Roma, Itália; 78 pg
Goodland, Robert e Livestock and climate change - What if the key actors in climate change are cows, pigs, and chickens? , Worldwatch, Nov-Dez 2009, pg 11-19, www.worldwatch.org/ ww/livestock
Global Canopy Foundation – Forest Footprint Disclosure - http://www.forestdisclosure.com. Comentário: Importante abordagem sobre commodities, nas quais a carne se insere.
Greenpeace - http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Documentos/Farra-do-Boi-na-Amazonia/
IPAM - ALIANÇA DA TERRA; CCSX; IPAM; WHRC. Critérios, indicadores e meios de verificação para classificação das propriedades no Cadastro de Compromisso Socioambiental do Xingu. Fevereiro, 2009. http://www.ipam.org.br/biblioteca/livro/id/47
ISA – Instituto Socioambiental – Instrumentos Econômicos e Financeiros como fator para a Conservação Ambiental no Brasil, Uma Análise no Estado da Arte no Brasil e no Mato Grosso, 2007; http://www.socioambiental.org/banco_imagens/pdfs/10295.pdf
Lappé, Francis Moore; Diet for a small planet (1st Ed 1971), Small Planet Institute. http:// www.smallplanet.org/books/item/diet_for_a_small_planet/
Livestock Emissions and Abatement Research Network http://www.livestockemissions.net/ - Comentário: ainda que não haja atualização adequada deste web-site há diversas questões importantes aqui levantadas, que podem ser complementadas estudando o tema nos web-sites da Embrapa e outros.
MEIRELLES Fo, João; Livro de Ouro da Amazônia; Ediouro, 1a Ed 2004, 5a Ed 2007, Rio de Janeiro, RJ
Osava, Mario; Cattle, the ignored predator, IPS, 11 Nov 2009; Rede de Agricultura Sustentável – SAS e Rainforest Alliance;
SAN Norma para Sistemas Sustentáveis de Produção Pecuária Julho 2010.do’ http://www.imaflora.org/upload/repositorio/ SAN_Norma_para_Sistemas_Sustentaveis_de_Producao_Pecuaria_Julho_2010.pdf www.sanstandards.org
REPORTER BRASIL - http://www.reporterbrasil.org.br
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Comissão de Meio Ambiente da Câmara aprova Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais
Publicado em dezembro 2, 2010
A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira a criação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. Segundo a proposta, o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (ProPSA), utilizando recursos de um fundo federal a ser criado pelo governo, vai remunerar iniciativas de preservação ou recuperação do meio ambiente.
O ProPSA deverá providenciar o pagamento de ações que priorizem, entre outros objetivos, a conservação e melhoramento da quantidade e da qualidade dos recursos hídricos; a conservação e preservação da vegetação nativa, da vida silvestre e do ambiente natural em áreas de elevada diversidade biológica; a conservação, recuperação ou preservação do ambiente natural nas áreas de unidades de conservação e nas terras indígenas; a recuperação e conservação dos solos e recomposição da cobertura vegetal de áreas degradadas; e a coleta de lixo reciclável.
Foi aprovado um substitutivo do relator, deputado Jorge Khoury (DEM-BA), ao Projeto de Lei 792/07, do deputado Anselmo de Jesus (PT-RO), e aos apensadosTramitação em conjunto. Quando uma proposta apresentada é semelhante a outra que já está tramitando, a Mesa da Câmara determina que a mais recente seja apensada à mais antiga. Se um dos projetos já tiver sido aprovado pelo Senado, este encabeça a lista, tendo prioridade. O relator dá um parecer único, mas precisa se pronunciar sobre todos. Quando
aprova mais de um projeto apensado, o relator faz um texto substitutivo ao projeto original. O relator pode também recomendar a aprovação de um projeto apensado e a rejeição dos demais., com destaque para o PL 5487/09, do Executivo, que foi a base principal do novo texto.
Órgão colegiado
Khoury manteve a estrutura do substitutivo aprovado em maio pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, mas fez algumas alterações.
Uma delas diz respeito à criação da Comissão Nacional da Política de Pagamento por Serviços Ambientais, que seria responsável por definir os valores a serem pagos. O relator destaca que esse dispositivo fere a
Constituição, pois uma lei não pode obrigar o governo a criar um órgão no âmbito da administração federal e ainda indicar as instituições que deverão participar desse órgão.
Ele chama ainda a atenção para a disparidade entre órgãos públicos e sociedade civil representados na comissão. Pelo texto da Comissão de Agricultura, ela seria formada por 12 órgãos governamentais federais e
sete representantes dos estados, municípios, organizações não-governamentais e federações de trabalhadores da agricultura, pecuária e pesca.
O substitutivo de Khoury propõe apenas que a política nacional conte com um órgão colegiado com atribuição de estabelecer suas metas, acompanhar seus resultados e propor os aperfeiçoamentos cabíveis, em regulamento próprio. O texto estabelece também que esse órgão será composto de forma paritária por representantes do Poder Público e da sociedade civil, e presidido pelo titular do órgão central do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).
Khoury também determina, em seu substitutivo, a criação formal do Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços, que é apenas mencionado no texto da Comissão de Agricultura. Ele destaca que o cadastro visa dar maior transparência e controle social aos projetos de pagamento por serviços ambientais.
Fundo federal
Em relação ao Fundo Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (FunPSA), Khoury acrescenta como fontes de recursos as doações de pessoas físicas – o substitutivo da Agricultura citava somente doações de entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas – e os rendimentos da aplicação do patrimônio do próprio fundo. Já estavam definidos como fontes até 40% dos recursos do Ministério do Meio Ambiente sobre a participação especial paga pela exploração de petróleo em grande volume ou grande rentabilidade; dinheiro do Orçamento da União e seus créditos adicionais; verbas de convênios com órgãos e entidades da administração pública federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal; empréstimos e saldos anuais não aplicados.
Além disso, o relator estabelece que qualquer instituição pública federal poderá ser agente financeiro do fundo, prestando contas para o órgão colegiado que coordenará a política nacional. O substitutivo da comissão anterior determinava que essa instituição seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDESO Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social é uma empresa pública federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O banco financia principalmente grandes empreendimentos industriais e de infra-estrutura, mas também investe nas áreas de agricultura, comércio, serviço, micro, pequenas e médias empresas, educação e saúde, agricultura familiar, saneamento básico e ambiental e transporte coletivo de massa.).
Complementação de voto
Khoury ainda apresentou complementação de voto para incorporar emendas apresentadas pelos deputados Paulo Teixeira (PT-SP) e Moreira Mendes (PPS-RO).
A emenda de Teixeira dá prioridade a agricultores e empreendores familiares rurais no Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais.
Já as emendas de Mendes garantem que o setor produtivo tenha participação no órgão colegiado que vai coordenar a política nacional; e determinam que sejam aplicadas prioritariamente nas bacias hidrográficas em que foram geradas as receitas oriundas da cobrança pelo uso dos recursos hídricos que forem destinadas ao pagamento por serviços ambientais que promovam a conservação e o melhoramento da quantidade e da qualidade desses recursos.
Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo, Rito de tramitação pelo qual o projeto não precisa ser votado pelo Plenário, apenas pelas comissões designadas para analisá-lo. O projeto perderá esse caráter em duas
situações: – se houver parecer divergente entre as comissões (rejeição por uma, aprovação por outra); – se, depois de aprovado pelas comissões, houver recurso contra esse rito assinado por 51 deputados (10% do total). Nos dois casos, o projeto precisará ser votado pelo Plenário. e ainda será analisado pelas comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Íntegra da proposta:
PL-792/2007
PL-5487/2009
Reportagem da Agência Câmara, publicada pelo EcoDebate, 02/12/2010
A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira a criação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. Segundo a proposta, o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (ProPSA), utilizando recursos de um fundo federal a ser criado pelo governo, vai remunerar iniciativas de preservação ou recuperação do meio ambiente.
O ProPSA deverá providenciar o pagamento de ações que priorizem, entre outros objetivos, a conservação e melhoramento da quantidade e da qualidade dos recursos hídricos; a conservação e preservação da vegetação nativa, da vida silvestre e do ambiente natural em áreas de elevada diversidade biológica; a conservação, recuperação ou preservação do ambiente natural nas áreas de unidades de conservação e nas terras indígenas; a recuperação e conservação dos solos e recomposição da cobertura vegetal de áreas degradadas; e a coleta de lixo reciclável.
Foi aprovado um substitutivo do relator, deputado Jorge Khoury (DEM-BA), ao Projeto de Lei 792/07, do deputado Anselmo de Jesus (PT-RO), e aos apensadosTramitação em conjunto. Quando uma proposta apresentada é semelhante a outra que já está tramitando, a Mesa da Câmara determina que a mais recente seja apensada à mais antiga. Se um dos projetos já tiver sido aprovado pelo Senado, este encabeça a lista, tendo prioridade. O relator dá um parecer único, mas precisa se pronunciar sobre todos. Quando
aprova mais de um projeto apensado, o relator faz um texto substitutivo ao projeto original. O relator pode também recomendar a aprovação de um projeto apensado e a rejeição dos demais., com destaque para o PL 5487/09, do Executivo, que foi a base principal do novo texto.
Órgão colegiado
Khoury manteve a estrutura do substitutivo aprovado em maio pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, mas fez algumas alterações.
Uma delas diz respeito à criação da Comissão Nacional da Política de Pagamento por Serviços Ambientais, que seria responsável por definir os valores a serem pagos. O relator destaca que esse dispositivo fere a
Constituição, pois uma lei não pode obrigar o governo a criar um órgão no âmbito da administração federal e ainda indicar as instituições que deverão participar desse órgão.
Ele chama ainda a atenção para a disparidade entre órgãos públicos e sociedade civil representados na comissão. Pelo texto da Comissão de Agricultura, ela seria formada por 12 órgãos governamentais federais e
sete representantes dos estados, municípios, organizações não-governamentais e federações de trabalhadores da agricultura, pecuária e pesca.
O substitutivo de Khoury propõe apenas que a política nacional conte com um órgão colegiado com atribuição de estabelecer suas metas, acompanhar seus resultados e propor os aperfeiçoamentos cabíveis, em regulamento próprio. O texto estabelece também que esse órgão será composto de forma paritária por representantes do Poder Público e da sociedade civil, e presidido pelo titular do órgão central do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).
Khoury também determina, em seu substitutivo, a criação formal do Cadastro Nacional de Pagamento por Serviços, que é apenas mencionado no texto da Comissão de Agricultura. Ele destaca que o cadastro visa dar maior transparência e controle social aos projetos de pagamento por serviços ambientais.
Fundo federal
Em relação ao Fundo Federal de Pagamento por Serviços Ambientais (FunPSA), Khoury acrescenta como fontes de recursos as doações de pessoas físicas – o substitutivo da Agricultura citava somente doações de entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas – e os rendimentos da aplicação do patrimônio do próprio fundo. Já estavam definidos como fontes até 40% dos recursos do Ministério do Meio Ambiente sobre a participação especial paga pela exploração de petróleo em grande volume ou grande rentabilidade; dinheiro do Orçamento da União e seus créditos adicionais; verbas de convênios com órgãos e entidades da administração pública federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal; empréstimos e saldos anuais não aplicados.
Além disso, o relator estabelece que qualquer instituição pública federal poderá ser agente financeiro do fundo, prestando contas para o órgão colegiado que coordenará a política nacional. O substitutivo da comissão anterior determinava que essa instituição seria o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDESO Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social é uma empresa pública federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O banco financia principalmente grandes empreendimentos industriais e de infra-estrutura, mas também investe nas áreas de agricultura, comércio, serviço, micro, pequenas e médias empresas, educação e saúde, agricultura familiar, saneamento básico e ambiental e transporte coletivo de massa.).
Complementação de voto
Khoury ainda apresentou complementação de voto para incorporar emendas apresentadas pelos deputados Paulo Teixeira (PT-SP) e Moreira Mendes (PPS-RO).
A emenda de Teixeira dá prioridade a agricultores e empreendores familiares rurais no Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais.
Já as emendas de Mendes garantem que o setor produtivo tenha participação no órgão colegiado que vai coordenar a política nacional; e determinam que sejam aplicadas prioritariamente nas bacias hidrográficas em que foram geradas as receitas oriundas da cobrança pelo uso dos recursos hídricos que forem destinadas ao pagamento por serviços ambientais que promovam a conservação e o melhoramento da quantidade e da qualidade desses recursos.
Tramitação
O projeto tramita em caráter conclusivo, Rito de tramitação pelo qual o projeto não precisa ser votado pelo Plenário, apenas pelas comissões designadas para analisá-lo. O projeto perderá esse caráter em duas
situações: – se houver parecer divergente entre as comissões (rejeição por uma, aprovação por outra); – se, depois de aprovado pelas comissões, houver recurso contra esse rito assinado por 51 deputados (10% do total). Nos dois casos, o projeto precisará ser votado pelo Plenário. e ainda será analisado pelas comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Íntegra da proposta:
PL-792/2007
PL-5487/2009
Reportagem da Agência Câmara, publicada pelo EcoDebate, 02/12/2010
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
Projeto do Google usa satélites para ajudar a proteger florestas
DA REUTERS, EM CANCÚN
O Google revelou nesta quinta-feira uma tecnologia para ajudar a criar confiança entre países ricos e pobres sobre projetos criados para proteger as florestas tropicais do planeta.
A medição do sucesso de planos contra desmatamento em lugares como Amazônia, Indonésia e Congo sempre foi uma tarefa difícil por causa de doenças de árvores, corrupção e corte ilegal de madeira em áreas vastas e remotas que não podem ser monitoradas em terra por cientistas.
O futuro desses planos é importante para as negociações sobre o clima global em Cancún, que acontecem até 10 de dezembro, porque a destruição das florestas é responsável por até 17% das emissões de gases causadores do efeito estufa produzidos pelo homem.
A tecnologia do Google, chamada de Earth Engine, reúne grandes quantidades de imagens de florestas feitas por satélites dos Estados Unidos e França que são analisadas em centrais compartilhadas de processamento de dados por meio da tecnologia de computação em nuvem. O sistema permite que cientistas monitorem florestas a partir de seus próprios computadores em questão de minutos ou segundos em vez de terem de esperar horas ou dias.
O Google também quer vender, eventualmente, acesso aos aspectos avançados da ferramenta para operadores do mercado de créditos de carbono, autoridades e pesquisadores da área florestal.
Acordos globais entre nações para proteção de florestas têm sido retardados pela falta de transparência e fracasso com os Estados Unidos para aprovação de uma legislação climática que teria impulsionado o mercado global de crédito de carbono.
Mas os negociadores em Cancún acreditam que as conversas poderão avançar sobre um plano mundial chamado de Emissões Reduzidas a partir de Desflorestamento e Degradação (Redd, na sigla em inglês), no qual países ricos financiariam recursos para países pobres e em desenvolvimento para a ajudar na proteção e restauração de florestas.
O Google espera que sua ferramenta ajude a acelerar a cooperação para a instituição do Redd.
"Como uma nação doadora consegue um nível de conforto sobre o que está sendo registrado em projetos de proteção florestal é realmente o que está acontecendo?", disse Rebecca Moore, gerente do Earth Engine durante as negociações do clima promovidas pela ONU.
"O que é legal sobre o ambiente de computação em nuvem é que tanto países doadores como em desenvolvimento têm agora as mesmas ferramentas e os mesmos dados" para analisar evidências sobre a eficácia de projetos de proteção, afirma Rebecca.
Estados Unidos, Japão, Noruega e outras nações ricas prometeram nas negociações do clima do ano passado, em Copenhague, 3,5 bilhões de dólares para financiar o desenvolvimento do Redd, cifra que poderá crescer no futuro.
Gerry Steinlegger, um especialista suíço que trabalha para o World Wildlife Fund, disse que ferramentas mais poderosas de análise por satélite cortam dramaticamente os custos de monitoramento de florestas em terra. Ele afirmou ainda que as ferramentas deverão ajudar países a confiar uns nos outros e a trabalharem juntos.
"No final, é disso que se trata as negociações globais do clima: como monitorar e verificar o que está acontecendo em termos de emissões e esse projeto fornece consistência."
O Google.org, unidade filantrópica da gigante das buscas on-line, vai doar 10 milhões de horas de computação do Earth Engine para países em desenvolvimento nos próximos dois anos enquanto o mundo tenta chegar a um acordo que vai suceder o Protocolo de Kyoto sobre aquecimento global.
Criar política ambiental integrada é desafio do governo Dilma, dizem analistas
DA BBC BRASIL:
O grande desafio do próximo governo no setor ambiental é criar uma política
integrada, que possa abranger diversas áreas da gestão da presidente eleita
Dilma Rousseff, na opinião de especialistas em meio ambiente, economia e
relações internacionais.
Eles acreditam que a presidente eleita tem de aproveitar que chegou à mesa
da área ambiental com mais fichas que outros jogadores --como Estados
Unidos, China e União Europeia--, principalmente pelo fato de o Brasil ter
conseguido reduzir o desmatamento e ter um crescimento menos dependente de
combustíveis fósseis, por exemplo.
Os especialistas, no entanto, alertam para o risco de o país deixar passar
essa boa rodada e não avançar para o grupo de nações que "se deram conta que
questões ambientais não são um estorvo e que sustentabilidade não é apenas
um termo bonito para se colocar em anúncios".
A descrição é do professor do Instituto de Biologia da Unicamp, Thomas
Lewinsohn, para quem a prioridade zero do novo governo deveria ser integrar
efetivamente todas as suas ações ambientais e criar uma política que esteja
presente em todo o planejamento.
Para ele, entrariam nessa política não apenas os ministérios do Meio
Ambiente e da Agricultura, mas também outros setores como Ciência e
Tecnologia, Minas e Energia e Desenvolvimento.
"Esse é um grande desafio porque isso não ocorreu nos dois governos de Lula,
onde o que havia eram posturas antagônicas dentro da mesma gestão", afirma
Lewinsohn, que também é presidente da Associação Brasileira de Ciência
Ecológica e Conservação.
Para o professor da Unicamp, é preciso superar essas divisões. "Se não, fica
como ocorre hoje, com um lado propondo e o outro bloqueando."
"TRUNFO"
Para o professor da Faculdade de Economia da USP e coordenador do Nesa
(Núcleo de Economia Socioambiental), Ricardo Abramovay, o Brasil tem um
grande trunfo nas mãos.
"Estamos em uma posição privilegiada se compararmos com a China, União
Europeia, e Estados Unidos, porque não dependemos tanto dos combustíveis
fósseis", diz.
Segundo o professor, isso significa que as mudanças climáticas não
representam um fator de estrangulamento no desenvolvimento do país.
Abramovay afirma que se a China, por exemplo, tivesse de reduzir suas
emissões de gases que provocam o efeito estufa, o impacto seria muito maior
do que se o Brasil precisasse fazer o mesmo.
No entanto, o professor lembra que a principal questão é saber aproveitar
essa vantagem. Para ele, o país vem explorando de modo pouco inteligente seu
potencial.
"O uso sustentável da biodiversidade nunca esteve na pauta do governo, não
se incentivou a criação de cadeias produtivas, não se discute para valer o
desmatamento zero."
IMPACTOS FUTUROS
A representante do Pnuma (agência da ONU para o meio ambiente) no Brasil,
Cristina Montenegro, lembra ainda outro fator que coloca o Brasil em uma
posição mais favorável: a preparação do governo para a COP-15, em
Copenhague, que ajudou a esclarecer as áreas ambientais prioritárias para o
país.
"Mas se os problemas são bem conhecidos, o ponto-chave é resolvê-los de
maneira integrada e com estratégias sólidas."
Ela cita como exemplo a construção de uma nova hidrelétrica: "É preciso
antecipar os impactos futuros das mudanças climáticas nesse local. Analisar
se a área vai ser mais ou menos afetada, se há riscos para os recursos
hídricos. Tudo em parceria com a gestão de resíduos e saneamento".
O diretor da ONG Amigos da Terra, Roberto Smeraldi, concorda que o mais
urgente é mudar a maneira de olhar os temas ambientais.
"Eles não são empecilhos, mas sim oportunidades de desenvolvimento. Se Dilma
quer governar o país com a lógica do século 21, ela tem que perceber isso."
O grande desafio do próximo governo no setor ambiental é criar uma política
integrada, que possa abranger diversas áreas da gestão da presidente eleita
Dilma Rousseff, na opinião de especialistas em meio ambiente, economia e
relações internacionais.
Eles acreditam que a presidente eleita tem de aproveitar que chegou à mesa
da área ambiental com mais fichas que outros jogadores --como Estados
Unidos, China e União Europeia--, principalmente pelo fato de o Brasil ter
conseguido reduzir o desmatamento e ter um crescimento menos dependente de
combustíveis fósseis, por exemplo.
Os especialistas, no entanto, alertam para o risco de o país deixar passar
essa boa rodada e não avançar para o grupo de nações que "se deram conta que
questões ambientais não são um estorvo e que sustentabilidade não é apenas
um termo bonito para se colocar em anúncios".
A descrição é do professor do Instituto de Biologia da Unicamp, Thomas
Lewinsohn, para quem a prioridade zero do novo governo deveria ser integrar
efetivamente todas as suas ações ambientais e criar uma política que esteja
presente em todo o planejamento.
Para ele, entrariam nessa política não apenas os ministérios do Meio
Ambiente e da Agricultura, mas também outros setores como Ciência e
Tecnologia, Minas e Energia e Desenvolvimento.
"Esse é um grande desafio porque isso não ocorreu nos dois governos de Lula,
onde o que havia eram posturas antagônicas dentro da mesma gestão", afirma
Lewinsohn, que também é presidente da Associação Brasileira de Ciência
Ecológica e Conservação.
Para o professor da Unicamp, é preciso superar essas divisões. "Se não, fica
como ocorre hoje, com um lado propondo e o outro bloqueando."
"TRUNFO"
Para o professor da Faculdade de Economia da USP e coordenador do Nesa
(Núcleo de Economia Socioambiental), Ricardo Abramovay, o Brasil tem um
grande trunfo nas mãos.
"Estamos em uma posição privilegiada se compararmos com a China, União
Europeia, e Estados Unidos, porque não dependemos tanto dos combustíveis
fósseis", diz.
Segundo o professor, isso significa que as mudanças climáticas não
representam um fator de estrangulamento no desenvolvimento do país.
Abramovay afirma que se a China, por exemplo, tivesse de reduzir suas
emissões de gases que provocam o efeito estufa, o impacto seria muito maior
do que se o Brasil precisasse fazer o mesmo.
No entanto, o professor lembra que a principal questão é saber aproveitar
essa vantagem. Para ele, o país vem explorando de modo pouco inteligente seu
potencial.
"O uso sustentável da biodiversidade nunca esteve na pauta do governo, não
se incentivou a criação de cadeias produtivas, não se discute para valer o
desmatamento zero."
IMPACTOS FUTUROS
A representante do Pnuma (agência da ONU para o meio ambiente) no Brasil,
Cristina Montenegro, lembra ainda outro fator que coloca o Brasil em uma
posição mais favorável: a preparação do governo para a COP-15, em
Copenhague, que ajudou a esclarecer as áreas ambientais prioritárias para o
país.
"Mas se os problemas são bem conhecidos, o ponto-chave é resolvê-los de
maneira integrada e com estratégias sólidas."
Ela cita como exemplo a construção de uma nova hidrelétrica: "É preciso
antecipar os impactos futuros das mudanças climáticas nesse local. Analisar
se a área vai ser mais ou menos afetada, se há riscos para os recursos
hídricos. Tudo em parceria com a gestão de resíduos e saneamento".
O diretor da ONG Amigos da Terra, Roberto Smeraldi, concorda que o mais
urgente é mudar a maneira de olhar os temas ambientais.
"Eles não são empecilhos, mas sim oportunidades de desenvolvimento. Se Dilma
quer governar o país com a lógica do século 21, ela tem que perceber isso."
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