Coletânea de artigos selecionados por sua veracidade e importância para as questões ambientais no Brasil e no Mundo.
sábado, 23 de junho de 2012
sexta-feira, 22 de junho de 2012
Ensaio sobre a Cegueira Ambiental e Social
Nota do Blog: Este é um manifesto candente de uma extraordinaria pesquisadora da EMBRAPA, que pinta com tons de chumbo o ambiente de censura e perseguiçao que vive naquela renomada instituiçao. Vale lembrar que o Grupo de Trabalho do Codigo Florestal, montado pela SBPC e ABC, tinha quase metade de seus membros recrutados nos quadros da EMBRAPA. Eles fizeram um trabalho extraordinario, e nem por isso deixaram de sofrer pressoes e ameaças da direçao da empresa. Nao obstante, sua voz foi ouvida, porque o livro sobre o Codigo Florestal publicado pela SBPC e ABC contem sua valiosa contribuicao. Todos sabem que o problema maior nao é com a ciencia, mas com a verdade pura e simples. As lideranças retrogradas que ainda atuam livremente no Brasil nao suportariam uma confrontaçao com a verdade que a ciencia vem aflorando, entao manda baixar o sarrafo, bem ao estilo da mentalidade das capitanias hereditarias. Mas sigamos tranquilamente o caminho que nos mostra a busca da verdade. Força aí Dr Debora!
Dra. Débora F. Calheiros
Parafraseando José Saramago, tomo a liberdade de comparar o universo criado pelo autor com o que vivemos atualmente às vésperas da Rio + 20. O Brasil poderia estar à frente em termos mundiais, dando exemplo de como conservar seu patrimônio natural, crescer economicamente de forma qualitativa, detentor do que deveria ser uma combinação eficiente: uma das maiores reservas de biodiversidade e de água do planeta, associadas a uma legislação ambiental primorosa. Contudo fez opção pelo oposto.
A revisão do Código Florestal deveria ser elaborada sim, atendendo às inovações tecnológicas e ao aumento do conhecimento científico. Óbvio. Mas não da forma que foi feita, de forma meramente política para atender um setor privilegiado econômica e politicamente da sociedade brasileira, com objetivos meramente econômicos e de curtíssimo prazo.
Deveria ter sido feita com base na Ciência, com “C” maiúsculo, como o foi à época realizado o Código das Águas (1934) e o Código Florestal (1965), editados por um Ministério da Agricultura à frente de seu tempo e preocupado com a conservação dos recursos hídricos e naturais indispensáveis à própria atividade agrícola.
Muitos já falaram sobre isso. Muitos cientistas do mais alto gabarito deste país. Desde Aziz Ab’Saber (USP) a J. G. Tundisi (IEE), Luiz A. Martinelli (CENA-USP), Carlos A. Joly (UNICAMP), Carlos Nobre (INPE), Gerd Sparovek (ESALQ-USP), Jean P. Metzger (IB-USP), Yara Schaeffer-Novelli (IO-USP), Maria T. F. Piedade (INPA), Wolfgang J. Junk (INAU – Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Áreas Úmidas/UFMT), Paulo T. de Sousa Jr. (INAU/UFMT), Catia N. da Cunha (INAU/UFMT), Ennio Candotti (Museu da Amazonia), P. Girard (INAU/UFMT), L. Casssati (UNESP) entre vários outros, além de programas de pesquisa importantíssimos como o Biota FAPESP e o próprio INAU, bem como instituições que deveriam ser referência como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e, salienta-se, até a própria agência governamental das Águas (ANA).
De minha parte, humildemente, também me incluo neste grupo, como doutora em Ciências, pesquisadora da área de Limnologia (estudo de ambientes aquáticos continentais), Ecotoxicologia (contaminação ambiental por pesticidas) e Etnoecologia (estudo do conhecimento das comunidades e povos tradicionais sobre o funcionamento ecológico de seus ambientes), especificamente na área de ecologia de rios e planícies de inundação do Pantanal Mato-Grossense há mais de 20 anos.
Pergunta-se: Para que serve, então, a Ciência? Para que milhões de reais são gastos em pesquisa, em programas de pós-graduação para a formação de novos cientistas na área de recursos hídricos e ecologia? O que acontece com um país que renega e desrespeita a opinião unânime de seus mais importantes cientistas, em pleno Século XXI e não no obscurantismo medieval ou ditatorial, mas sim, acredita-se, em plena vigência da democracia? E tudo isso, pasmem, às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio + 20), com o país e o mundo clamando por melhor qualidade de vida e sustentabilidade?
Mais de dois milhões de assinaturas de brasileiros clamando pelo Veto. Manifestações veementemente críticas de ONGs de importância nacional e internacional, de movimentos sociais como a Via Campesina, dos ex-ministros do Meio Ambiente, da OAB e de tantos outros congregados num movimento histórico denominado Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável. Posição unânime de cientistas renomados.
Mas nada disso vale quando não há sensibilidade política para a causa humanista, base da conservação ambiental, optando-se por garantir novamente o privilégio de poucos em detrimento de toda a sociedade e reforçando incoerentemente a pobreza. Como diria Juan M. Alier em seu “Ecologismo dos Pobres” (1992): apropriação e exploração inconsequentes dos recursos naturais pelas leis capitalistas de mercado.
Contudo a liberdade de expressão científica e cidadã foram asseguradas. Todos os cientistas puderam se manifestar livremente e oficialmente sobre o tema. Já esta prerrogativa não nos foi autorizada. O que faço aqui pode gerar ainda mais represálias.
Mas entendo que a liberdade de expressão é assegurada constitucionalmente e na Declaração Universal de Direitos Humanos, e a liberdade de pensamento e expressão científicos são, além de base filosófica da Ciência, um direito e um dever profissional. Um dever de todos os gestores e órgãos públicos como determina o Artigo 225 da Constituição Federal e o Código de Ética Profissional dos servidores em órgãos da Administração Pública: “VIII – Toda pessoa tem direito à verdade. O servidor não pode omiti-la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa interessada ou da Administração Pública”.
No entanto, a empresa na qual trabalho, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA, ligada ao Ministério da Agricultura, ícone da pesquisa agropecuária de nosso país, proibiu institucionalmente desde out./2010 seus pesquisadores de se manifestarem oficialmente no que se refere ao Código Florestal e “outros assuntos polêmicos”, “evitando conflitos com a posição oficial da instituição”, contrariando, inclusive, o seu próprio Código de Ética. Este fato foi noticiado na grande imprensa à época quando da realização de uma Audiência Pública sobre o tema no Senado Federal em fev./2011.
Recentemente (mar./2012), antes mesmo da aprovação do novo Código na Câmara Federal ou da sanção ou veto da Presidente, fomos informados por meio do Documento “Embrapa 2012 – Ano Embrapa para uma Agricultura Mais Verde” que a mesma “reconhece e fortalece as responsabilidades sociais e ambientais” e busca o fortalecimento da gestão que considera de “vanguarda” por meio “da implementação de ações sustentáveis, incluindo a obediência ao novo Código Florestal”.
Isso renegando e ocultando um parecer técnico de seu próprio corpo de cientistas “Síntese da Pesquisa Agropecuária na Embrapa e a Proteção Ambiental” (jul/2009), que obviamente corrobora as opiniões dos demais cientistas da área, tendo cuidado especial para as pequenas propriedades, a grande maioria das propriedades rurais do país.
Ou seja, a influência política do setor agropecuário também inibe, pressiona e censura a Ciência, numa empresa pública de pesquisa, que utilitariamente e docilmente (parafraseando um artigo crítico à instituição de Araújo e colaboradores, publicado em 2011: http://www.scielo.br/pdf/rap/v45n3/10.pdf) consente e se omite em um debate crucial para a sustentabilidade da agricultura e, portanto, ambiental do país.
Tudo isso demonstra quão frágil ainda é a democracia e as instituições governamentais brasileiras em relação à influência do capital em se apoderar dos recursos naturais em detrimento do conjunto da população brasileira, daí o fato notório de estarmos na 7ª posição em termos de economia mundial e na 84ª em termos de distribuição de renda. Apesar de alguns avanços, pouco mudamos neste aspecto desde a colonização. Cegueira irresponsável, social e ambiental, censurando e perseguindo cientistas, em pleno Século XXI.
Na verdade não está sendo apenas um embate entre ideias ruralistas e ambientalistas, mas entre ruralistas e cientistas, mas com exceção desta importante instituição pública de pesquisa de grande relevância para a produção de alimentos para o Brasil. Na verdade, trata-se de um debate entre ruralistas e uma parte significativa da sociedade brasileira, que deveria ser respeitada com base no Artigo 225 da nossa Constituição: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
(Por Conceição Lemes, Viomundo, 21/06/2012)
Dra. Débora F. Calheiros
Parafraseando José Saramago, tomo a liberdade de comparar o universo criado pelo autor com o que vivemos atualmente às vésperas da Rio + 20. O Brasil poderia estar à frente em termos mundiais, dando exemplo de como conservar seu patrimônio natural, crescer economicamente de forma qualitativa, detentor do que deveria ser uma combinação eficiente: uma das maiores reservas de biodiversidade e de água do planeta, associadas a uma legislação ambiental primorosa. Contudo fez opção pelo oposto.
A revisão do Código Florestal deveria ser elaborada sim, atendendo às inovações tecnológicas e ao aumento do conhecimento científico. Óbvio. Mas não da forma que foi feita, de forma meramente política para atender um setor privilegiado econômica e politicamente da sociedade brasileira, com objetivos meramente econômicos e de curtíssimo prazo.
Deveria ter sido feita com base na Ciência, com “C” maiúsculo, como o foi à época realizado o Código das Águas (1934) e o Código Florestal (1965), editados por um Ministério da Agricultura à frente de seu tempo e preocupado com a conservação dos recursos hídricos e naturais indispensáveis à própria atividade agrícola.
Muitos já falaram sobre isso. Muitos cientistas do mais alto gabarito deste país. Desde Aziz Ab’Saber (USP) a J. G. Tundisi (IEE), Luiz A. Martinelli (CENA-USP), Carlos A. Joly (UNICAMP), Carlos Nobre (INPE), Gerd Sparovek (ESALQ-USP), Jean P. Metzger (IB-USP), Yara Schaeffer-Novelli (IO-USP), Maria T. F. Piedade (INPA), Wolfgang J. Junk (INAU – Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Áreas Úmidas/UFMT), Paulo T. de Sousa Jr. (INAU/UFMT), Catia N. da Cunha (INAU/UFMT), Ennio Candotti (Museu da Amazonia), P. Girard (INAU/UFMT), L. Casssati (UNESP) entre vários outros, além de programas de pesquisa importantíssimos como o Biota FAPESP e o próprio INAU, bem como instituições que deveriam ser referência como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e, salienta-se, até a própria agência governamental das Águas (ANA).
De minha parte, humildemente, também me incluo neste grupo, como doutora em Ciências, pesquisadora da área de Limnologia (estudo de ambientes aquáticos continentais), Ecotoxicologia (contaminação ambiental por pesticidas) e Etnoecologia (estudo do conhecimento das comunidades e povos tradicionais sobre o funcionamento ecológico de seus ambientes), especificamente na área de ecologia de rios e planícies de inundação do Pantanal Mato-Grossense há mais de 20 anos.
Pergunta-se: Para que serve, então, a Ciência? Para que milhões de reais são gastos em pesquisa, em programas de pós-graduação para a formação de novos cientistas na área de recursos hídricos e ecologia? O que acontece com um país que renega e desrespeita a opinião unânime de seus mais importantes cientistas, em pleno Século XXI e não no obscurantismo medieval ou ditatorial, mas sim, acredita-se, em plena vigência da democracia? E tudo isso, pasmem, às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio + 20), com o país e o mundo clamando por melhor qualidade de vida e sustentabilidade?
Mais de dois milhões de assinaturas de brasileiros clamando pelo Veto. Manifestações veementemente críticas de ONGs de importância nacional e internacional, de movimentos sociais como a Via Campesina, dos ex-ministros do Meio Ambiente, da OAB e de tantos outros congregados num movimento histórico denominado Comitê Brasil em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável. Posição unânime de cientistas renomados.
Mas nada disso vale quando não há sensibilidade política para a causa humanista, base da conservação ambiental, optando-se por garantir novamente o privilégio de poucos em detrimento de toda a sociedade e reforçando incoerentemente a pobreza. Como diria Juan M. Alier em seu “Ecologismo dos Pobres” (1992): apropriação e exploração inconsequentes dos recursos naturais pelas leis capitalistas de mercado.
Contudo a liberdade de expressão científica e cidadã foram asseguradas. Todos os cientistas puderam se manifestar livremente e oficialmente sobre o tema. Já esta prerrogativa não nos foi autorizada. O que faço aqui pode gerar ainda mais represálias.
Mas entendo que a liberdade de expressão é assegurada constitucionalmente e na Declaração Universal de Direitos Humanos, e a liberdade de pensamento e expressão científicos são, além de base filosófica da Ciência, um direito e um dever profissional. Um dever de todos os gestores e órgãos públicos como determina o Artigo 225 da Constituição Federal e o Código de Ética Profissional dos servidores em órgãos da Administração Pública: “VIII – Toda pessoa tem direito à verdade. O servidor não pode omiti-la ou falseá-la, ainda que contrária aos interesses da própria pessoa interessada ou da Administração Pública”.
No entanto, a empresa na qual trabalho, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – EMBRAPA, ligada ao Ministério da Agricultura, ícone da pesquisa agropecuária de nosso país, proibiu institucionalmente desde out./2010 seus pesquisadores de se manifestarem oficialmente no que se refere ao Código Florestal e “outros assuntos polêmicos”, “evitando conflitos com a posição oficial da instituição”, contrariando, inclusive, o seu próprio Código de Ética. Este fato foi noticiado na grande imprensa à época quando da realização de uma Audiência Pública sobre o tema no Senado Federal em fev./2011.
Recentemente (mar./2012), antes mesmo da aprovação do novo Código na Câmara Federal ou da sanção ou veto da Presidente, fomos informados por meio do Documento “Embrapa 2012 – Ano Embrapa para uma Agricultura Mais Verde” que a mesma “reconhece e fortalece as responsabilidades sociais e ambientais” e busca o fortalecimento da gestão que considera de “vanguarda” por meio “da implementação de ações sustentáveis, incluindo a obediência ao novo Código Florestal”.
Isso renegando e ocultando um parecer técnico de seu próprio corpo de cientistas “Síntese da Pesquisa Agropecuária na Embrapa e a Proteção Ambiental” (jul/2009), que obviamente corrobora as opiniões dos demais cientistas da área, tendo cuidado especial para as pequenas propriedades, a grande maioria das propriedades rurais do país.
Ou seja, a influência política do setor agropecuário também inibe, pressiona e censura a Ciência, numa empresa pública de pesquisa, que utilitariamente e docilmente (parafraseando um artigo crítico à instituição de Araújo e colaboradores, publicado em 2011: http://www.scielo.br/pdf/rap/v45n3/10.pdf) consente e se omite em um debate crucial para a sustentabilidade da agricultura e, portanto, ambiental do país.
Tudo isso demonstra quão frágil ainda é a democracia e as instituições governamentais brasileiras em relação à influência do capital em se apoderar dos recursos naturais em detrimento do conjunto da população brasileira, daí o fato notório de estarmos na 7ª posição em termos de economia mundial e na 84ª em termos de distribuição de renda. Apesar de alguns avanços, pouco mudamos neste aspecto desde a colonização. Cegueira irresponsável, social e ambiental, censurando e perseguindo cientistas, em pleno Século XXI.
Na verdade não está sendo apenas um embate entre ideias ruralistas e ambientalistas, mas entre ruralistas e cientistas, mas com exceção desta importante instituição pública de pesquisa de grande relevância para a produção de alimentos para o Brasil. Na verdade, trata-se de um debate entre ruralistas e uma parte significativa da sociedade brasileira, que deveria ser respeitada com base no Artigo 225 da nossa Constituição: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
(Por Conceição Lemes, Viomundo, 21/06/2012)
quinta-feira, 21 de junho de 2012
Entrevista: “Apenas uma grande catástrofe nos forçará a mudar”
Posted on 19 June 2012 ENVOLVERDE
RIO DE JANEIRO, 18 de junho (TerraViva) Não é mais novidade que o estado ambiental da Terra é catastrófico. Contudo, entender alguns números que descrevem esta catástrofe ainda provoca um choque – por exemplo, que 30% da biodiversidade desapareceu desde 1970, e que 60% desse declínio ocorreu nas áreas tropicais do planeta.
Jonathan Baillie, um biólogo britânico, membro da Sociedade Zoológica de Londres, e chefe do programa Edge para a conservação das espécies, tem esses números alarmantes na ponta da língua. Baillie, que está no Rio de Janeiro como consultor científico para a organização Globe de legisladores ambientais, disse ao TerraViva que esses números servem como indicador do estado dramático da situação ambiental do mundo.
P: Você pinta um quadro bastante sombrio do ambiente global.
R: A humanidade está se movendo na direção absolutamente errada. Nosso modelo de produção e consumo é insustentável, e a Terra não pode mais lidar com ele. Hoje é preciso um ano e meio para que a Terra absorva o dióxido de carbono produzido e regenere os recursos renováveis que as pessoas usam em um ano. Se continuarmos a consumir os recursos do planeta nessa mesma taxa global, em 2030 vamos precisar de dois planetas para sustentar a população mundial.
P: Que soluções o senhor vê para lidar com esta insustentabilidade?
R: Tenho medo de que apenas uma grande catástrofe, que afetasse diretamente e em massa a vida das pessoas, nos obrigaria a fazer as mudanças necessárias para acabar com este declínio. O que precisamos é ter em conta o capital natural nos sistemas nacionais de contabilidade e a utilização de tecnologias limpas, para transformar comportamentos e padrões de produção e consumo.
P: Os novos números da concentração de dióxido de carbono na atmosfera sugerem que podemos ter chegado a um ponto sem retorno.
R: Uma medida recente da concentração de CO2 no Ártico registra 400 partes por milhão. Este é um pico, um marco ruim, mas é ainda um valor pontual. Durante o ano, esse valor oscila, e chega a um ponto mais baixo. Contudo, esse número significa que a acidificação dos oceanos atinge com frequência um índice que, se permanecer constante, conduziria à destruição de ecossistemas marinhos vitais.
P: Mas não é só a biodiversidade marinha que está em risco.
R: Não, em absoluto. Mais de 20% dos mamíferos estão ameaçados de extinção. Uma parcela semelhante de invertebrados também sofre o risco de extinção. No entanto, as espécies mais ameaçadas são as de anfíbios – cerca de 32% de todas as espécies de anfíbios estão listadas como ameaçadas globalmente. Quase a metade de todas as espécies conhecidas de anfíbios estão em declínio.
P: Então, quais são as soluções que você vê como capazes de reverter essa situação preocupante?
R: É absolutamente necessário incorporar o valor do capital natural nos sistemas de contas nacionais, para levar em conta os ecossistemas e seu uso no cálculo do PIB. É absolutamente necessário usar tecnologias limpas, tais como fontes renováveis de energia, para substituir as fontes antigas e poluentes.
P: O que o senhor quer dizer por capital natural?
R: Por exemplo, estimativas aproximadas dos custos causados pelo desmatamento chegam a US$ 4,5 trilhões por ano. Tais valores, que incluem a captura de carbono pelas florestas, o valor das florestas para lazer e similares, não são levados em conta no cálculo do produto interno bruto.
P: Por tecnologias limpas o senhor quer dizer a chamada bioengenharia, para tentar reduzir a acidificação das águas oceânicas?
R: Não, em absoluto. Nós certamente precisamos tentar todas as tecnologias disponíveis, mas a manipulação artificial da química da água marinha certamente não é uma solução.
P: O senhor é pessimista sobre o futuro da Terra?
R: Eu acredito que somente a ação das gerações mais jovens pode forçar os governos a finalmente cumprirem seus próprios compromissos. As gerações mais jovens vão suportar as consequências das atuais omissões e políticas equivocadas. Por isto, elas têm que forçosamente exigir dos governos que tomem medidas na direção certa, para interromper a destruição da biodiversidade e de outros recursos naturais. Envolverde/IPS
Editorial FSP: Adeus, Rio
21/06/2012
-
04h30
Malogrou a Rio+20. Não há outra forma de descrever o resultado da
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável.
Não se encontra palavra mais apropriada que "fracasso" para qualificar uma reunião cujo mérito maior foi evitar um retrocesso de duas décadas, em relação à primeira Cúpula da Terra, no mesmo Rio de Janeiro, em 1992.
Até o comedido Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU, permitiu-se afirmar que desejaria um documento final mais ambicioso. Só o governo brasileiro, no papel de anfitrião, saudou os 283 parágrafos da peça "O Futuro que Queremos" como "vitória" e "avanço".
O Itamaraty pode ter evitado um fiasco do porte da conferência do clima de Copenhague (2009), que se mostrou incapaz de produzir uma declaração conjunta. Mas falar em texto "estupendo" é um exagero que nem mesmo a proverbial presunção diplomática autorizaria.
Todo o esforço da representação brasileira foi fechar um documento de consenso antes da chegada dos chefes de Estado e de governo ao Rio, ontem. Entre hoje e amanhã, eles devem limitar-se a fazer discursos pomposos e chancelar uma declaração inócua.
A habilidade negocial brasileira se resumiu a tentar agradar a todos retirando substância do texto. A União Europeia (UE) queria uma Organização Mundial do Ambiente, mas não levou. Os EUA vetaram, com apoio do Brasil e de países emergentes.
Estes pediam um fundo de US$ 30 bilhões custeado pelos desenvolvidos. Tiveram de contentar-se com a manutenção do princípio -velho de 20 anos- das "responsabilidades comuns porém diferenciadas" (ricos e desenvolvidos devem investir mais e transferir tecnologia para combater os males do ambiente global) e com um grupo de trabalho sobre o assunto.
O máximo que se logrou acordar foi que o mundo precisa de metas quantitativas de desenvolvimento sustentável, ao estilo das Metas de Desenvolvimento do Milênio. Quantas e quais, fica para outra comissão, com prazo até 2015.
O produto mais evidente da Rio+20, ao final, talvez seja o esgotamento da via multilateral para concertar decisões de governos nacionais quanto a questões globais complexas. Como no caso da negociação sobre mudança do clima, as idas e vindas desembocam sempre nos mesmos impasses.
Seria bem mais promissor delegar a formatação de soluções para quem realmente conta, econômica e ambientalmente: EUA, UE, Brasil, China, Índia e Rússia. Mas desse futuro ninguém na ONU quer saber.
Não se encontra palavra mais apropriada que "fracasso" para qualificar uma reunião cujo mérito maior foi evitar um retrocesso de duas décadas, em relação à primeira Cúpula da Terra, no mesmo Rio de Janeiro, em 1992.
Até o comedido Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU, permitiu-se afirmar que desejaria um documento final mais ambicioso. Só o governo brasileiro, no papel de anfitrião, saudou os 283 parágrafos da peça "O Futuro que Queremos" como "vitória" e "avanço".
O Itamaraty pode ter evitado um fiasco do porte da conferência do clima de Copenhague (2009), que se mostrou incapaz de produzir uma declaração conjunta. Mas falar em texto "estupendo" é um exagero que nem mesmo a proverbial presunção diplomática autorizaria.
Todo o esforço da representação brasileira foi fechar um documento de consenso antes da chegada dos chefes de Estado e de governo ao Rio, ontem. Entre hoje e amanhã, eles devem limitar-se a fazer discursos pomposos e chancelar uma declaração inócua.
A habilidade negocial brasileira se resumiu a tentar agradar a todos retirando substância do texto. A União Europeia (UE) queria uma Organização Mundial do Ambiente, mas não levou. Os EUA vetaram, com apoio do Brasil e de países emergentes.
Estes pediam um fundo de US$ 30 bilhões custeado pelos desenvolvidos. Tiveram de contentar-se com a manutenção do princípio -velho de 20 anos- das "responsabilidades comuns porém diferenciadas" (ricos e desenvolvidos devem investir mais e transferir tecnologia para combater os males do ambiente global) e com um grupo de trabalho sobre o assunto.
O máximo que se logrou acordar foi que o mundo precisa de metas quantitativas de desenvolvimento sustentável, ao estilo das Metas de Desenvolvimento do Milênio. Quantas e quais, fica para outra comissão, com prazo até 2015.
O produto mais evidente da Rio+20, ao final, talvez seja o esgotamento da via multilateral para concertar decisões de governos nacionais quanto a questões globais complexas. Como no caso da negociação sobre mudança do clima, as idas e vindas desembocam sempre nos mesmos impasses.
Seria bem mais promissor delegar a formatação de soluções para quem realmente conta, econômica e ambientalmente: EUA, UE, Brasil, China, Índia e Rússia. Mas desse futuro ninguém na ONU quer saber.
quinta-feira, 14 de junho de 2012
SBPC e ABC : Código Florestal, Avanços e Retrocessos
O debate em torno do Código
Florestal ainda não acabou. O Poder Executivo, por meio da Medida Provisória
571/2012, que complementa a Lei 12.651/2012, recentemente aprovada no Congresso
Nacional, instituiu o Novo Código Florestal brasileiro. Assim, a Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de
Ciências (ABC) continuarão contribuindo para o debate com fundamentações
científicas, tecnológicas, econômicas, sociais e ambientais sólidas para se
construir um Código Florestal evoluído e atual. Não se podem desconsiderar os
avanços no conhecimento científico e nas modernas tecnologias de sensoriamento
remoto, que servem, por exemplo, para delimitar larguras de áreas de preservação
permanente (APP) em margens de cursos de água. No entendimento da SBPC e da ABC
a discussão pautada pela disputa “ambientalistas versus ruralistas”, perde o
foco. Desde o início de nossos trabalhos temos enfatizado que, sem acordos
entre as partes perdem todos, especialmente, o Brasil.
O balanço deste longo processo, até o momento, não corresponde às nossas expectativas. Poucos ganhos e muitas perdas. Perdeu a sociedade brasileira com uma lei pouco clara e indulgente. Perdeu o meio ambiente. Perdeu a agricultura brasileira.
No entanto, não podemos deixar de reconhecer que o processo de tramitação das alterações do Código Florestal no Congresso Nacional teve um aspecto muito positivo. A sociedade se envolveu com as atividades legislativas, acompanhando e se posicionando em relação às discussões no parlamento.
Ocorreram avanços com a intervenção do Poder Executivo no texto aprovado no Legislativo. Um deles foi o resgate dos princípios que regem a lei e que nortearão a sua aplicação. Outro ponto refere-se à redefinição do conceito de pousio, resgatada do texto do Senado Federal, ao definir limites temporais ou territoriais para sua prática, evitando que um imóvel ou uma área rural permaneça em regime de pousio indefinidamente.
O balanço deste longo processo, até o momento, não corresponde às nossas expectativas. Poucos ganhos e muitas perdas. Perdeu a sociedade brasileira com uma lei pouco clara e indulgente. Perdeu o meio ambiente. Perdeu a agricultura brasileira.
No entanto, não podemos deixar de reconhecer que o processo de tramitação das alterações do Código Florestal no Congresso Nacional teve um aspecto muito positivo. A sociedade se envolveu com as atividades legislativas, acompanhando e se posicionando em relação às discussões no parlamento.
Ocorreram avanços com a intervenção do Poder Executivo no texto aprovado no Legislativo. Um deles foi o resgate dos princípios que regem a lei e que nortearão a sua aplicação. Outro ponto refere-se à redefinição do conceito de pousio, resgatada do texto do Senado Federal, ao definir limites temporais ou territoriais para sua prática, evitando que um imóvel ou uma área rural permaneça em regime de pousio indefinidamente.
Reconhecemos que foi um avanço o
veto ao texto que deixava sem nenhuma proteção, salgados, apicuns e alguns
sistemas úmidos. Porém, a MP 571/2012 restitui o capítulo III, do texto do
Senado, que trata do uso ecologicamente sustentável dos apicuns e salgados,
permitindo o desenvolvimento de atividades de carcinicultura e salinas.
Foi mantida a intervenção ou a supressão da vegetação nativa, mesmo que em caráter excepcional, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, com a finalidade de execução de obras habitacionais em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda. Reiteramos nosso posicionamento anterior, que é eticamente injustificável manter populações de baixa renda nessas áreas.
Quanto às APPs ocorreram alguns ganhos, como o reconhecimento das áreas úmidas. No entanto, a relevância das nascentes e olhos d’água intermitentes foi desconsiderada.
Foi mantida a intervenção ou a supressão da vegetação nativa, mesmo que em caráter excepcional, em locais onde a função ecológica do manguezal esteja comprometida, com a finalidade de execução de obras habitacionais em áreas urbanas consolidadas ocupadas por população de baixa renda. Reiteramos nosso posicionamento anterior, que é eticamente injustificável manter populações de baixa renda nessas áreas.
Quanto às APPs ocorreram alguns ganhos, como o reconhecimento das áreas úmidas. No entanto, a relevância das nascentes e olhos d’água intermitentes foi desconsiderada.
Os retrocessos são significativos. Por exemplo, a questão da
largura do leito de rio foi novamente ignorada, mantendo a referência do leito
regular para delimitação de APPs, a despeito das evidências científicas da
importância de se considerar o leito mais alto dos rios. Este é um assunto
muito importante, em especial para o Pantanal e Amazônia que irão perder a
proteção de milhares de quilômetros quadrados de suas florestas de
várzeas.
O uso de espécies exóticas na recomposição de APPs, só seria
aceitável se fosse de forma temporária e consorciada com espécies nativas para
estimular a sucessão ecológica dos ecossistemas florestais. No entanto, a
proposta do Executivo não faz esta ressalva, deixando a possibilidade de
restaurar as APPs com espécies exóticas e/ou monoculturas de forma
indiscriminada e por tempo indeterminado.
Esperávamos que o poder executivo federal enviasse ao Congresso Nacional, em um prazo de três anos, projetos de lei sobre os biomas da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal e dos Pampas, como estava constando no PLC 30/2011 do Senado. A Mata Atlântica já é regulada pela a lei 11.428/2006.
Mas, será que ainda há chances de corrigir os repetidos erros cometidos até então, durante o processo de discussão e aprovação da MP 571/2012? Será que o Congresso irá derrubar os 12 vetos do Executivo?
Esperávamos que o poder executivo federal enviasse ao Congresso Nacional, em um prazo de três anos, projetos de lei sobre os biomas da Amazônia, do Cerrado, da Caatinga, do Pantanal e dos Pampas, como estava constando no PLC 30/2011 do Senado. A Mata Atlântica já é regulada pela a lei 11.428/2006.
Mas, será que ainda há chances de corrigir os repetidos erros cometidos até então, durante o processo de discussão e aprovação da MP 571/2012? Será que o Congresso irá derrubar os 12 vetos do Executivo?
Apesar de que as proposições feitas pela ciência foram
minimamente aceitas tanto no Legislativo como no Executivo, a Sociedade
Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira da Ciência não
se contentam com o mínimo, e vão continuar insistindo na importância de se
tratar de pontos estratégicos para o desenvolvimento sustentável do País, que
foram suprimidos da lei ou então foram alterados na MP.
Nossa conclusão é que o Brasil continua precisando de um moderno e mais completo Código Florestal, pois na sua forma atual, a Lei 12.651/2012 não está funcional, com muitas lacunas e imprecisões, gerando séria insegurança jurídica, sem oferecer a necessária sustentabilidade ambiental, o que afinal também compromete o agronegócio. A MP 571/2012, para ser responsavelmente aprovada, ainda requer importantes modificações e aperfeiçoamentos fundamentadas na ciência e tecnologia!
Se a comunidade científico-tecnológica, com seu capital acumulado de valiosos e úteis conhecimentos, não for ouvida ao longo da reta final de tão relevante construção legal para o país, o resultado poderá não levar ao futuro próspero e sustentável almejado pela sociedade, vontade tão eloquente e democraticamente expressa em manifestações em todo o País.
Nossa conclusão é que o Brasil continua precisando de um moderno e mais completo Código Florestal, pois na sua forma atual, a Lei 12.651/2012 não está funcional, com muitas lacunas e imprecisões, gerando séria insegurança jurídica, sem oferecer a necessária sustentabilidade ambiental, o que afinal também compromete o agronegócio. A MP 571/2012, para ser responsavelmente aprovada, ainda requer importantes modificações e aperfeiçoamentos fundamentadas na ciência e tecnologia!
Se a comunidade científico-tecnológica, com seu capital acumulado de valiosos e úteis conhecimentos, não for ouvida ao longo da reta final de tão relevante construção legal para o país, o resultado poderá não levar ao futuro próspero e sustentável almejado pela sociedade, vontade tão eloquente e democraticamente expressa em manifestações em todo o País.
A Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciências continuarão comprometidas
com a construção de um instrumento legal em que haja equilíbrio e vibrante
sinergia entre produção agrícola e sustentabilidade ambiental.
Cordial e Respeitosamente,
HELENA B. NADER Presidente da SBPC,
JACOB PALIS Presidente da ABC e
JOSÉ ANTÔNIO ALEIXO DA SILVA Coordenador do Grupo Trabalho do Código Florestal
terça-feira, 12 de junho de 2012
Servidores do IBAMA denunciam pressões de Governo Federal por Licenças de obras do PAC
[fonte Amazonia]
Em carta divulgada no dia 31 de maio, servidores do Ibama, Instituto Chico Mendes (ICMBio) e Ministério do Meio Ambiente (MMA) denunciam as situações de assédio moral e falta de autonomia que sofrem para que grandes projetos de infraestrutura sejam aprovados sem os devidos requisitos ambientais e sociais exigidos pela lei.
Eles afirmam que situações graves já se tornaram cotidianas, como por exemplo, a alteração de pareceres, diminuição e retirada de condicionantes de licenças ambientais e a articulação para que vistoriais e autuações não sejam realizadas.
Segundo a carta, o objetivo do manifesto é “ revelar a todo o país, neste momento em que ele está no foco da questão ambiental, qual é a realidade que vivemos: desvalorização completa, falta de recursos, e constante pressão para validar um projeto político e econômico, que mascarado de desenvolvimento e economia verde, distribui, de forma injusta, mais degradação e desastres ambientais”.
Leia abaixo o manifesto:
Nós, servidores do IBAMA, ICMBio e MMA, queremos DENUNCIAR a pressão que estamos sofrendo diariamente em nosso cotidiano frente à política de aprovação desenfreada de grandes projetos em nosso país.
O avanço do capital em detrimento dos aspectos socioambientais está ocorrendo numa velocidade sem precedentes, e assistimos a isso percebendo, infelizmente, a passividade de quem dirige nossos órgãos.
O Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, articulado com a Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana – IIRSA, chegou trazendo inúmeros projetos de infra-estrutura por todo o país e, juntamente com eles, a obrigatoriedade da emissão de licenças ambientais que validem tais obras em prazos mínimos. Sem a real estrutura e tempo suficiente para análises adequadas, o servidor se vê sem os instrumentos necessários para a tomada de decisões sérias, que envolvem manutenção e preservação da vida de fauna, flora, populações tradicionais…vidas.
Além de todos esses problemas estruturais e técnicos, soma-se a pressão de: alterar pareceres, diminuir e retirar condicionantes de licenças, evitar vistorias e autuações, e diversas violações ao bom e devido cumprimento do exercício legal de nossas atribuições. Por fim, é recorrente que os gestores desconsiderem recomendações dos técnicos e adotem posturas e decisões contrárias. Situação gravíssima que se tornou cotidiana, embora até este momento, velada.
Questionamos a atuação da cooperação internacional no Ministério do Meio Ambiente e a forma como os organismos internacionais interferem na gestão do órgão. Também apontamos a direção privatista que MMA vem assumindo, esvaziando agendas de participação e controle social e estreitando laços com o setor privado, o que contraria o interesse público que o órgão deve defender.
Discutimos exaustivamente esta realidade no V congresso da ASIBAMA, que ocorreu em maio deste ano, no Rio de Janeiro, cidade que abrigará a Rio +20 e a Cúpula dos Povos, evento em contraposição. Todas as unidades da federação brasileira estiveram presentes no congresso e o que se ouviu dos servidores de todos os órgãos citados foi muito semelhante, demonstrando que não são casos isolados.
Rio de Janeiro, 31 de maio de 2012
http://www.asibamanacional.org.br/
Em carta divulgada no dia 31 de maio, servidores do Ibama, Instituto Chico Mendes (ICMBio) e Ministério do Meio Ambiente (MMA) denunciam as situações de assédio moral e falta de autonomia que sofrem para que grandes projetos de infraestrutura sejam aprovados sem os devidos requisitos ambientais e sociais exigidos pela lei.
Eles afirmam que situações graves já se tornaram cotidianas, como por exemplo, a alteração de pareceres, diminuição e retirada de condicionantes de licenças ambientais e a articulação para que vistoriais e autuações não sejam realizadas.
Segundo a carta, o objetivo do manifesto é “ revelar a todo o país, neste momento em que ele está no foco da questão ambiental, qual é a realidade que vivemos: desvalorização completa, falta de recursos, e constante pressão para validar um projeto político e econômico, que mascarado de desenvolvimento e economia verde, distribui, de forma injusta, mais degradação e desastres ambientais”.
Leia abaixo o manifesto:
Nós, servidores do IBAMA, ICMBio e MMA, queremos DENUNCIAR a pressão que estamos sofrendo diariamente em nosso cotidiano frente à política de aprovação desenfreada de grandes projetos em nosso país.
Estamos vivendo um momento crucial na área ambiental. Visando o
avanço desses grandes projetos e do agronegócio, diversas leis
ambientais estão sendo modificadas e aprovadas sem ampla discussão e sem
embasamento científico, com interesses puramente econômicos, sem
considerar de fato a questão socioambiental.
O avanço do capital em detrimento dos aspectos socioambientais está ocorrendo numa velocidade sem precedentes, e assistimos a isso percebendo, infelizmente, a passividade de quem dirige nossos órgãos.
Dentro desse contexto, nós, que trabalhamos diretamente com a análise
técnica desses processos, com fiscalização, e com a gestão de
áreas protegidas impactadas por eles, estamos vivendo uma situação de
assédio moral e falta de autonomia para atuarmos como se deve, com
critérios técnicos e defendendo os interesses da sociedade.
O Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, articulado com a Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana – IIRSA, chegou trazendo inúmeros projetos de infra-estrutura por todo o país e, juntamente com eles, a obrigatoriedade da emissão de licenças ambientais que validem tais obras em prazos mínimos. Sem a real estrutura e tempo suficiente para análises adequadas, o servidor se vê sem os instrumentos necessários para a tomada de decisões sérias, que envolvem manutenção e preservação da vida de fauna, flora, populações tradicionais…vidas.
Além de todos esses problemas estruturais e técnicos, soma-se a pressão de: alterar pareceres, diminuir e retirar condicionantes de licenças, evitar vistorias e autuações, e diversas violações ao bom e devido cumprimento do exercício legal de nossas atribuições. Por fim, é recorrente que os gestores desconsiderem recomendações dos técnicos e adotem posturas e decisões contrárias. Situação gravíssima que se tornou cotidiana, embora até este momento, velada.
Questionamos a atuação da cooperação internacional no Ministério do Meio Ambiente e a forma como os organismos internacionais interferem na gestão do órgão. Também apontamos a direção privatista que MMA vem assumindo, esvaziando agendas de participação e controle social e estreitando laços com o setor privado, o que contraria o interesse público que o órgão deve defender.
Discutimos exaustivamente esta realidade no V congresso da ASIBAMA, que ocorreu em maio deste ano, no Rio de Janeiro, cidade que abrigará a Rio +20 e a Cúpula dos Povos, evento em contraposição. Todas as unidades da federação brasileira estiveram presentes no congresso e o que se ouviu dos servidores de todos os órgãos citados foi muito semelhante, demonstrando que não são casos isolados.
Portanto, decidimos não mais calar diante de tais absurdos, e revelar
a todo o país, neste momento em que ele está no foco da questão
ambiental, qual é a realidade que vivemos: desvalorização completa,
falta de recursos, e constante pressão para validar um projeto político e
econômico, que mascarado de desenvolvimento e economia verde,
distribui, de forma injusta, mais degradação e desastres ambientais.
Pedimos o apoio de todos aqueles que temem pelo retrocesso ambiental
pelo qual estamos passando, para que juntos possamos realmente
contribuir com o Brasil, esse país que é formado por pessoas, matas,
animais, rios, e inúmeras riquezas naturais que merecem ser defendidas.
Rio de Janeiro, 31 de maio de 2012
http://www.asibamanacional.org.br/
segunda-feira, 11 de junho de 2012
“Somos exterminadores do futuro”, diz Marina Silva
Ex-ministra conclama sociedade a exigir mais dos líderes para salvar o planeta
Publicado:
RIO — Em sua apresentação no TEDxRio+20, no Forte Copacabana,
ex-senadora Marina Silva conclamou os participantes do evento a empurrar
os líderes que estão se omitindo em salvar o planeta. Marina disse que
desenvolvimento sustentável não existe, "mas podemos fazer uma escolha
por ele". Ela citou o filósofo francês Jean Paul Sartre para pregar que
"somos resultado do que fazemos do nosso passado, seja ele qual for",
para concluir que é sim possível fazer coisas boas para o futuro. Marina
falou da importância dos "mantenedores de utopia", numerando o
ambientalista Chico Mendes, os ex-presidentes Lula e Fernando Henrique e
sociólogo Florestan Fernandes. Para ela, é necessária uma mudança de
postura
—
Somos os exterminadores do futuro. Estamos sofrendo do mal do excesso,
estamos consumindo o planeta. Temos muito pouco tempo e uma vida
dedicada ao ter em vez do ser. Estamos a beira de aumentar em dois graus
a temperatura e comprometer a vida na terra. Precisamos nos reencontrar
— afirmou.
Segundo Marina o caminho para o que chama de "militante autoral", que é a tomada de posição, ativa, de cada um.
— Não é acreditar de forma ingênua, é acreditar na capacidade de criar hoje o futuro que nós queremos.
Segundo Marina o caminho para o que chama de "militante autoral", que é a tomada de posição, ativa, de cada um.
— Não é acreditar de forma ingênua, é acreditar na capacidade de criar hoje o futuro que nós queremos.
Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio20/somos-exterminadores-do-futuro-diz-marina-silva-5169204#ixzz1xWJbruxq
Editorial FSP: Conservar e crescer
Com pouco a apresentar na Rio+20, governo Dilma mostra que o país caminha longe do que poderia ser uma economia verde
Começam nesta semana os eventos paralelos da Rio+20, reunião de cúpula sobre o ambiente mundial que reunirá uma centena de chefes de Estado e governo entre os dias 20 e 22, no Rio de Janeiro.
O governo Dilma Rousseff se esforça para exibir credenciais verdes na véspera da conferência, mas não chega a ser convincente.
A maior crítica ao Planalto é a falta de liderança para tornar a Rio+20 um sucesso. O Itamaraty se esmera em garantir um evento sem solavancos logísticos e diplomáticos, o que é bom -mas pouco.
A conferência não produzirá tratados marcantes como as convenções sobre mudança do clima e biodiversidade adotadas na Eco-92, duas décadas atrás. O documento final será provavelmente uma declaração anódina sobre economia verde, mais um slogan que preocupação real de governos e empresas.
A presidente não é a única responsável por isso, certo. Há quem veja nas reverberações da crise financeira de 2008/09 o prenúncio de uma depressão mundial, como a da década de 1930. Tal atmosfera não favorece a propagação da pauta ambiental no âmbito da produção, a não ser nos raros casos em que seus custos são inferiores, no curto prazo, aos da inação.
Não saiu caro para Dilma Rousseff costurar os retalhos de um novo Código Florestal, no figurino da medida provisória cosida com vetos à lei desequilibrada aprovada no Congresso. Serviu para tingir de verde sua imagem, a dias da cúpula, e a multidão de estrangeiros no Rio terá dificuldade para entender como se deslindará o novelo com centenas de emendas que a bancada ruralista atou ao pacote.
O Planalto também exibiu com orgulho a menor taxa anual de desmatamento na Amazônia em quase um quarto de século: 6.418 km² (2010/2011). Uma façanha, mas não de Dilma, que contava só seis meses de governo quando a última imagem de satélite foi registrada. Colhe-se, na realidade, o fruto de uma política consistente de repressão ao desmate iniciada ainda na gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente (2003-2008). Ou seja, ao tempo em que a atual presidente lhe opunha resistência, primeiro na pasta das Minas e Energia, depois na Casa Civil.
Pesaram, também, a baixa nos preços internacionais de commodities agrícolas, como a soja, e uma espécie de trégua na abertura de áreas por proprietários rurais, na expectativa de um novo código.
No mais, há pouco a comemorar na cifra recorde, além da formidável redução da taxa anual. A área devastada corresponde ao quádruplo da superfície do município de São Paulo, onde vivem 11 milhões de pessoas. E, como assinalou o engenheiro florestal Paulo Barreto na Folha, meio bilhão de árvores foi destruído em 12 meses.
Dilma anunciou, ainda, a criação das duas primeiras unidades de conservação de seu governo, combinada com a ampliação de outras três. Localizadas todas fora da região amazônica, somam 450 km²; na era Lula, o total havia sido de 264 mil km² (quatro quintos disso em seu primeiro mandato).
A presidente também homologou, agora, 9.500 km² de terras indígenas, que contribuem para a preservação de matas. Nesse caso, não se trata de ato discricionário do Poder Executivo em favor do ambiente, mas do reconhecimento administrativo -assegurado na Constituição- de um direito ancestral, e sobre áreas já demarcadas.
O front fundiário, de resto, é o setor em que as administrações petistas menos progrediram. Criado em 2009, mal andou o programa de regularização Terra Legal. A iniciativa almejava dar títulos para estimadas 230 mil posses em áreas da União na Amazônia, de maneira a legalizá-las e permitir cobrar dos ocupantes o respeito a normas ambientais.
Segundo o jornal "Valor Econômico", apenas 2.334 títulos definitivos foram emitidos. Da meta de identificar e regularizar 490 mil km² (duas vezes a área do Estado de São Paulo), somente 73 mil km² e 37,5 mil ocupações se acham efetivamente mapeados.
A Amazônia ainda é um território livre para grileiros e madeireiros ilegais. São eles os elos iniciais da cadeia de devastação ora adormecida, mas pronta para entrar em ação ao primeiro sinal de um Código Florestal enfraquecido (na letra ou na aplicação), ou de alta nas cotações de commodities.
Todo o debate sobre o código, a começar por sua polarização, evidencia que uma parte significativa do setor produtivo brasileiro -e uma maioria barulhenta do Congresso- caminha longe do que poderia ser uma economia verde.
A própria presidente da República, com sua formação de tecnocrata no setor elétrico, prefere apontar os defeitos e custos imediatos da energia eólica, por exemplo, a destacar suas vantagens e seu potencial alternativo estratégico.
Sob essa ótica, até mesmo a tríade que a diplomacia de Dilma se desdobra por fazer prevalecer na Rio+20 -crescer, incluir, conservar- se revela mais como hierarquia: aumentar o bolo do PIB, distribuir melhor as fatias e, se possível, não fazer estrago irrecuperável no ambiente. A divergência, se tanto, com os países mais desenvolvidos, residiria na preferência destes por uma ordem alterada: crescer, conservar, incluir.
Uma economia verde, no entanto, implicaria uma inversão quase utópica de valores, para a qual nem o governo Dilma nem qualquer outro sobre a Terra parece, ou poderia estar, preparado: conservar, incluir, crescer.
Quem sabe numa Rio+40.
FSP, 10/06/2012, Editoriais, p. A2.
http://www1.folha.uol.com.br/ fsp/opiniao/47829-conservar-e- crescer.shtml
Começam nesta semana os eventos paralelos da Rio+20, reunião de cúpula sobre o ambiente mundial que reunirá uma centena de chefes de Estado e governo entre os dias 20 e 22, no Rio de Janeiro.
O governo Dilma Rousseff se esforça para exibir credenciais verdes na véspera da conferência, mas não chega a ser convincente.
A maior crítica ao Planalto é a falta de liderança para tornar a Rio+20 um sucesso. O Itamaraty se esmera em garantir um evento sem solavancos logísticos e diplomáticos, o que é bom -mas pouco.
A conferência não produzirá tratados marcantes como as convenções sobre mudança do clima e biodiversidade adotadas na Eco-92, duas décadas atrás. O documento final será provavelmente uma declaração anódina sobre economia verde, mais um slogan que preocupação real de governos e empresas.
A presidente não é a única responsável por isso, certo. Há quem veja nas reverberações da crise financeira de 2008/09 o prenúncio de uma depressão mundial, como a da década de 1930. Tal atmosfera não favorece a propagação da pauta ambiental no âmbito da produção, a não ser nos raros casos em que seus custos são inferiores, no curto prazo, aos da inação.
Não saiu caro para Dilma Rousseff costurar os retalhos de um novo Código Florestal, no figurino da medida provisória cosida com vetos à lei desequilibrada aprovada no Congresso. Serviu para tingir de verde sua imagem, a dias da cúpula, e a multidão de estrangeiros no Rio terá dificuldade para entender como se deslindará o novelo com centenas de emendas que a bancada ruralista atou ao pacote.
O Planalto também exibiu com orgulho a menor taxa anual de desmatamento na Amazônia em quase um quarto de século: 6.418 km² (2010/2011). Uma façanha, mas não de Dilma, que contava só seis meses de governo quando a última imagem de satélite foi registrada. Colhe-se, na realidade, o fruto de uma política consistente de repressão ao desmate iniciada ainda na gestão de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente (2003-2008). Ou seja, ao tempo em que a atual presidente lhe opunha resistência, primeiro na pasta das Minas e Energia, depois na Casa Civil.
Pesaram, também, a baixa nos preços internacionais de commodities agrícolas, como a soja, e uma espécie de trégua na abertura de áreas por proprietários rurais, na expectativa de um novo código.
No mais, há pouco a comemorar na cifra recorde, além da formidável redução da taxa anual. A área devastada corresponde ao quádruplo da superfície do município de São Paulo, onde vivem 11 milhões de pessoas. E, como assinalou o engenheiro florestal Paulo Barreto na Folha, meio bilhão de árvores foi destruído em 12 meses.
Dilma anunciou, ainda, a criação das duas primeiras unidades de conservação de seu governo, combinada com a ampliação de outras três. Localizadas todas fora da região amazônica, somam 450 km²; na era Lula, o total havia sido de 264 mil km² (quatro quintos disso em seu primeiro mandato).
A presidente também homologou, agora, 9.500 km² de terras indígenas, que contribuem para a preservação de matas. Nesse caso, não se trata de ato discricionário do Poder Executivo em favor do ambiente, mas do reconhecimento administrativo -assegurado na Constituição- de um direito ancestral, e sobre áreas já demarcadas.
O front fundiário, de resto, é o setor em que as administrações petistas menos progrediram. Criado em 2009, mal andou o programa de regularização Terra Legal. A iniciativa almejava dar títulos para estimadas 230 mil posses em áreas da União na Amazônia, de maneira a legalizá-las e permitir cobrar dos ocupantes o respeito a normas ambientais.
Segundo o jornal "Valor Econômico", apenas 2.334 títulos definitivos foram emitidos. Da meta de identificar e regularizar 490 mil km² (duas vezes a área do Estado de São Paulo), somente 73 mil km² e 37,5 mil ocupações se acham efetivamente mapeados.
A Amazônia ainda é um território livre para grileiros e madeireiros ilegais. São eles os elos iniciais da cadeia de devastação ora adormecida, mas pronta para entrar em ação ao primeiro sinal de um Código Florestal enfraquecido (na letra ou na aplicação), ou de alta nas cotações de commodities.
Todo o debate sobre o código, a começar por sua polarização, evidencia que uma parte significativa do setor produtivo brasileiro -e uma maioria barulhenta do Congresso- caminha longe do que poderia ser uma economia verde.
A própria presidente da República, com sua formação de tecnocrata no setor elétrico, prefere apontar os defeitos e custos imediatos da energia eólica, por exemplo, a destacar suas vantagens e seu potencial alternativo estratégico.
Sob essa ótica, até mesmo a tríade que a diplomacia de Dilma se desdobra por fazer prevalecer na Rio+20 -crescer, incluir, conservar- se revela mais como hierarquia: aumentar o bolo do PIB, distribuir melhor as fatias e, se possível, não fazer estrago irrecuperável no ambiente. A divergência, se tanto, com os países mais desenvolvidos, residiria na preferência destes por uma ordem alterada: crescer, conservar, incluir.
Uma economia verde, no entanto, implicaria uma inversão quase utópica de valores, para a qual nem o governo Dilma nem qualquer outro sobre a Terra parece, ou poderia estar, preparado: conservar, incluir, crescer.
Quem sabe numa Rio+40.
FSP, 10/06/2012, Editoriais, p. A2.
http://www1.folha.uol.com.br/
sábado, 9 de junho de 2012
Analise fria: Cumplicidade com o atraso
por Raul Silva Telles do Valle (direto doISA)
Em setembro de 2010, em plena corrida
presidencial, um grupo de organizações da sociedade civil encaminhou aos então
candidatos um conjunto de questões relativas às propostas de modificação do
Código Florestal. Já àquela época, avançava na Câmara dos Deputados o projeto
ruralista de modificação da legislação florestal e as organizações queriam
saber o que pensavam os aspirantes ao cargo maior do País.
A hoje presidenta da República, Dilma Rousseff,
questionada se apoiava ou não a anistia proposta pelo texto então em
tramitação, disse textualmente: “construímos no governo Lula um consenso de que
a eventual conversão de multas só deve ocorrer após ações efetivas de
recuperação das áreas desmatadas ilegalmente. Temos que estimular e apoiar esta
transição, dando condições técnicas e materiais para nossos agricultores
recuperarem estas áreas” (veja aqui).
A partir daí, a candidata e depois
presidenta teve a oportunidade de repetir diversas vezes que não passaria a mão
na cabeça de quem desmatou ilegalmente. Isso alimentou um sentimento difuso de
esperança na sociedade, que, depois de aprovado o projeto ruralista pelo
Congresso Nacional, passou a manifestar de forma inequívoca, por todos os meios
disponíveis, amplo apoio à presidenta para que ela cumprisse com sua palavra.
Ciente de que ela estava emparedada entre sua palavra e os anseios da
sociedade, de um lado, e os interesses de uma parte expressiva de sua base de
apoio parlamentar, os cidadãos brasileiros sinalizaram que ela poderia contar
com eles para confrontar a chantagem dos representantes da elite agrária
brasileira.
Na tarde da última sexta-feira, 25 de maio,
exatamente um ano após a aprovação do relatório Aldo Rebelo na Câmara dos
Deputados, três ministros vieram a público, com muitas palavras e nenhum
documento, para reafirmar que o projeto seria vetado. Não na sua íntegra, como
sinal de respeito ao Congresso Nacional. Mas os pontos que significassem
anistia teriam sido extirpados. Mais desmatamentos? De jeito nenhum, tudo seria
eliminado.
O Brasil dormiu desconfiado, mas
esperançoso, durante o final de semana, e acordou indignado na segunda-feira.
Com 12 vetos e uma Medida Provisória, nasceu já remendado o Código Florestal do
século 21 – e repleto de anistias.
Perguntam-se muitos: mas como? A presidenta
não disse que não aceitaria? Os ministros não afirmaram veementemente que a
anisitia havia sido retirada? Então, como alguns ainda dizem que há anistia na
lei?
A partir de agora vai começar a guerra de
comunicação. Tal como Goebbels, o Governo Federal vai insistir na tese de que
uma mentira contada mil vezes vai virar verdade. Assim, para que não fique o
dito pelo não dito, explico porque Dilma Roussef, contrariando tudo o que havia
dito até agora, assinou embaixo da maior anistia ambiental da história do país.
A ministra do Meio Ambiente, repetindo um
mantra ecoado pelos ruralistas, afirmou publicamente que o projeto não tem
anistia. Teria como objetivo, simplesmente, legalizar ocupações “antigas”,
feitas de acordo com as regras da época.
A Lei Federal 12.651, de 25 de maio de
2012, o novo Código “Florestal”, continua mantendo, no entanto, a figura de
“área rural consolidada”. Segundo o artigo 3o, ela é uma “área de imóvel rural
com ocupação antrópica preexistente a 22 de julho de 2008” (inciso IV).
Um incauto leitor da lei deve logo pensar:
“então, antes de 2008, os proprietários rurais não precisavam proteger as
florestas existentes em suas terras ou a quantidade de área protegida era
menor”. Ledo engano. Desde 1934, com o “velho” Código Florestal, o proprietário
é obrigado a manter as florestas das áreas “vulneráveis a erosões” e respeitar
os 25% da propriedade que não poderiam ser convertidos para agropecuária, o que
posteriormente veio a ser denominado de “reserva legal”.
Em 1965, como todo mundo desmatava alegando
que não sabia quais eram essas tais áreas vulneráveis, veio o “novo” Código
Florestal e deixou claro que essas áreas eram os topos de morro, as encostas
íngremes, as nascentes, as beiras de rio. E fixou padrões e metragens, para
ninguém dizer que não sabia que ali não podia desmatar.
Em 1986, houve uma alteração pontual: as
matas ciliares deveriam ser protegidas em, no mínimo, 30 metros contados das
margens, e não apenas cinco como era até então. Em 1996, veio outra
modificação: na Amazônia Legal (e só lá), a reserva legal seria aumentada de
50% para 80% do imóvel, em áreas de floresta, e diminuída de 50% para 35%, em
áreas de cerrado (clique no quadro abaixo para ampliar).
Dessa brevíssima digressão espero ter
ficado claro que um desmatamento realizado em 2008 em encostas íngremes ou
nascentes, por exemplo, assim como na área destinada à reserva legal, era
absolutamente ilegal. Mesmo que realizado dez anos antes, era ilegal. Em muitos
casos, mesmo que realizado várias décadas antes seria ilegal.
O “novíssimo” Código Florestal isenta de
recuperação todas as Áreas de “Preservação Permanente” e a grande maioria das
áreas de reserva legal que tenham sido desmatadas até 2008 (e não em 1965, 1989
ou 1996). Ou seja, desmatou, fica desmatado. Se havia multa, está anulada. Se a
área havia sido embargada, está liberada. Isso é anistia. Mas como?
O artigo 63 (não vetado) diz que nas
encostas com mais de 45º de inclinação, nas bordas de chapadas, nos topos de
morro e áreas com altitude superior a 1.800 metros de altitude – todos
protegidos desde 1965 – serão mantidas as atividades agropecuárias implantadas
até 2008. Mesmo pastagens, altamente degradadoras de áreas montanhosas, estão
permitidas. Recuperação? Zero.
O artigo 67 (não vetado) diz que, nos
imóveis de até quatro módulos fiscais, não é preciso recuperar a reserva legal
irregularmente desmatada antes de 2008 (e não em 1934 ou 1996). Isso significa
que em mais de 90% dos imóveis rurais – que ocupam 24% da área do país – não
haverá recuperação. Com as brechas que essa regra traz é muito provável que
essa anistia se estenda para parte significativa dos 10% de imóveis restantes,
impactando uma área bem maior (saiba mais).
O artigo 11-A (incluído pela MP) permite,
em seu §6º, que haja nos manguezais a “regularização das atividades e
empreendimentos de carcinicultura e salinas cuja ocupação e implantação tenha
ocorrido antes de 22 de julho de 2008”. Os manguezais, não custa lembrar, estão
indiretamente protegidos pela lei desde 1965, e diretamente desde 1993, na Mata
Atlântica, e 2002, na Amazônia. Esse artigo, além de promover essa anistia,
permite que novas áreas sejam abertas para instalação de criações de camarões,
contrariando o conselho unânime dos cientistas brasileiros (veja aqui).
Mesmo no caso das matas ciliares e
nascentes, que erroneamente foi tomado pela grande mídia como “o” caso de
anistia (como se as anteriores não existissem), e que o Governo Federal, na
pirotecnia feita no dia 25/5, usou como exemplo para dizer que “não havia mais
anistia”, ela está lá, inteirinha. O art.61-A (incluído pela MP) prevê a
“recuperação” de uma faixa de 5 a 100 metros em beiras de rio desmatadas até
2008 (e não em 1965 ou 1986), quando a área que deveria ter sido preservada
variava de 30 a 500 metros. No caso de nascentes, protegidas desde 1965, mas
cuja área exata de proteção (raio de 50 metros) foi estabelecida em 2002, a
“recuperação” vai variar de 5 a 15 metros, mesmo para desmatamentos realizados
em 2007. Nesse último caso, diga-se de passagem, a MP diminui a proteção mesmo
em relação ao texto que fora aprovado pela Câmara dos Deputados há menos de um
mês, no qual a recuperação prevista era de 30 metros. Em todos os casos, com
exceção das beiras de rio situadas em imóveis com mais de 10 módulos fiscais, a
“recuperação” será de apenas parte daquilo que deveria ter sido protegido.
E por que estou usando aspas para falar de
recuperação em beiras de rio e nascentes? Porque a MP incluiu uma novidade
surpreendente: essa – pouca – restauração poderá, agora ser feita com “espécies
lenhosas perenes ou de ciclo longo, nativas ou exóticas”. Para quem não sabe,
isso quer dizer eucalipto, laranja, café, videiras, palma de dendê etc. Ou
seja: o que era vegetação nativa, será – parcialmente – recomposto com espécies
de uso econômico e nenhuma função ambiental. Portanto, recuperação ambiental
mesmo, zero. Anistia 100%. Uma “correção” publicada hoje no Diário Oficial
determina que esse dispositivo vale apenas para áreas de até quatro módulos
fiscais.
Mas o problema da anistia não é apenas, ou
principalmente, moral. É ambiental. O “novíssimo” Código Florestal diz em seu
Art. 3º que as áreas de preservação permanente têm a função de “preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade,
facilitar o fluxo de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das
populações humanas”. Com a anistia promulgada pela Presidente Dilma Rousseff,
haverá uma grande parte dessas áreas que nunca mais cumprirão com essa função,
pois jamais voltarão a ter vegetação nativa. Em várias regiões do país há mais
APPs e reservas legais desmatadas do que preservadas (leia mais). Justamente
nessas regiões falta água, sobram enchentes, morrem nascentes, acaba a fauna. E
assim será.
Somando-se todas as anistias com todos os
pontos onde há uma diminuição na proteção das florestas que não foram ainda
derrubadas e como prenunciado aqui (leia aqui), deixamos de ter, na prática,
uma lei de proteção às florestas existentes em áreas privadas. O remendo de lei
aprovado tem todos os defeitos das leis anteriores (poucas medidas de apoio a
sua implementação), mas poucas de suas virtudes. É contraditório e complexo de
interpretar.
Ao não cumprir com a palavra empenhada
perante a sociedade, a presidenta Dilma Rousseff se tornou cúmplice do projeto
de país que a ala mais retrógrada de nossa elite econômica está desenhando. E
entrará para história como aquela que, mesmo podendo, mesmo tendo todo o apoio
da sociedade, não evitou o maior retrocesso nos padrões de proteção ambiental
da história brasileira. E talvez mundial, pois não me consta que em outros
países a proteção às florestas esteja diminuindo, muito pelo contrário. Em
pleno século 21, voltaremos a um patamar anterior ao de 1934, quando nosso
primeiro Código Florestal foi aprovado.
E a Rio +20 salvou as florestas
ALÔ, LÍDERES MUNDIAIS: vocês não precisam mais vir para o Rio em
junho, pagar metade do PIB dos seus países por um quarto de hotel e nem
enfrentar o perrengue do trânsito até a Barra. Vocês já cumpriram o
papel mais importante da Rio +20 sem precisar sair de casa: salvaram as
florestas brasileiras. Então até logo, e obrigado pelos peixes.
Como assim? — perguntará o eventual leitor deste blog. Até onde você saiba, as florestas nunca estiveram tão ameaçadas, certo? O Código Florestal novo, promulgado ontem pela presidente Dilma Rousseff com seus 12 vetos, é um desastre, certo?
Hmmm, certo. Mas em termos. Esqueça por um momento todas as cascas de banana que ficaram na legislação. Esqueça que ela praticamente sepulta o conceito de reserva legal, ao permitir soma com as áreas de preservação permanente em qualquer caso e a recomposição com 50% de espécies exóticas em qualquer caso (alô, Greenpeace, saudade do Floresta Zero?). Esqueça que ela mudou os critérios definidores de áreas de preservação permanente como topos de morro e margens de rio, liberando HOJE MESMO novos desmatamentos nessas áreas. Esqueça a polêmica tola em torno do artigo 61, a tal “escadinha” da reposição das APPs, que os ruralistas estão fingindo achar o fim do mundo, coitados, porque vai acabar com as áreas produtivas do país. BS. Nada disso importa, por um motivo simples: no Brasil, ninguém pagava multa e nem recompunha floresta, e eu aposto um boi como ninguém vai pagar multa nem recompor floresta com as novas regras.
A única coisa que importa no código DE VERDADE foi um veto que Dilma fez corretamente, e mirando a Rio +20: o Artigo 1° da lei.
Recapitulemos: o Código Florestal atual, aquele lixo de legislação cheia de remendos e alterado por MP em 1996 e que por isso mesmo PRECISAVA ser reformado (na visão dos ruralistas), tinha como princípio orientador, estabelecido em seu artigo 1°, a proteção das florestas brasileiras, bens de uso comum a todos, e impunha a limitação do exercício do direito de propriedade para isso. Ao relatar o código na desastrosa comissão especial da Câmara, em 2009, o deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) deve ter achado que esse negócio de “bem de uso comum” e “limitação do exercício do direito de propriedade” era coisa de comunista e resolveu baixar a bola do artigo 1°. No texto que saiu da Câmara em maio de 2011 para o Senado, o Código Florestal dispunha apenas sobre “as área de preservação permanente e a reserva legal”.
O que isso significa? TUDO. No mundo maravilhoso dos advogados, o princípio tem precedência sobre a própria lei. Qualquer dúvida judicial sobre a aplicação do código (e, acredite, haverá várias) pode ser decidida por juízes ou procuradores com base nos princípios. Ao destituí-lo destes, Aldo transformou uma lei ambiental numa mera disciplinadora de atividades rurais (tipo “estupra, mas não mata”). In dubio, pro motosserra. O Senado corretamente reviu isso e devolveu o caráter ambiental à lei, enfiando-lhe oito princípios, como evitar as mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável. In dubio, pro floresta. A Câmara não achou a menor graça e devolveu no segundo turno de votação o texto original.
Dilma, como você pode imaginar, não é nenhuma Rachel Carson. Não dava a menor importância para o código, apesar da promessa de campanha, um tanto vaga e feita só para a Marina sair do pé dela, de não “anistiar desmatadores”. O governo não tinha opinião formada sobre o artigo 1°, e até a reta final da segunda tramitação na Câmara achava que daria muito bem para passar sem ele. Dilma chegou a dar aval a um acordo que anistiava desmate em APP de proprietários de até 1.500 hectares. O que a fez voltar atrás? A Rio +20.
No exterior, pegou mal pacas a hesitação do Planalto em torno da lei e a aprovação do CódigoRural
Florestal pela Câmara. Mais de um diplomata europeu me disse que a
capacidade do Brasil de liderar e de cumprir compromissos — dois itens
de série do kit potência global — seria medida não em pequena parte pelo
resultado do debate florestal.
Daí a volta triunfal do Artigo 1° do Senado e o veto ao 61. A bola agora volta a quicar na quadra dos parlamentares, que, embora finjam não ter curtido a recuperação de APP, estão injuriados mesmo é com os princípios. A ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) tem pressa para aprovar logo a MP 571, que restaura os vetos ao código e complementa-o com outras provisões do texto do Senado. Izabella sabe que, depois de 22 de junho, a carruagem vira abóbora de novo.
PS: o novo Código Florestal é uma legislação parcialmente vetada e remendada por MP, que nem o antigo. Por que este Frankenstein vale e o outro não valia?
PS2: prova do que eu estou dizendo são as invectivas dos ruralistas contra o Artigo 1°, vocalizadas no blog de Ciro Siqueira, com quem mantenho uma discordância mais ou menos respeitosa.
Como assim? — perguntará o eventual leitor deste blog. Até onde você saiba, as florestas nunca estiveram tão ameaçadas, certo? O Código Florestal novo, promulgado ontem pela presidente Dilma Rousseff com seus 12 vetos, é um desastre, certo?
Hmmm, certo. Mas em termos. Esqueça por um momento todas as cascas de banana que ficaram na legislação. Esqueça que ela praticamente sepulta o conceito de reserva legal, ao permitir soma com as áreas de preservação permanente em qualquer caso e a recomposição com 50% de espécies exóticas em qualquer caso (alô, Greenpeace, saudade do Floresta Zero?). Esqueça que ela mudou os critérios definidores de áreas de preservação permanente como topos de morro e margens de rio, liberando HOJE MESMO novos desmatamentos nessas áreas. Esqueça a polêmica tola em torno do artigo 61, a tal “escadinha” da reposição das APPs, que os ruralistas estão fingindo achar o fim do mundo, coitados, porque vai acabar com as áreas produtivas do país. BS. Nada disso importa, por um motivo simples: no Brasil, ninguém pagava multa e nem recompunha floresta, e eu aposto um boi como ninguém vai pagar multa nem recompor floresta com as novas regras.
A única coisa que importa no código DE VERDADE foi um veto que Dilma fez corretamente, e mirando a Rio +20: o Artigo 1° da lei.
Recapitulemos: o Código Florestal atual, aquele lixo de legislação cheia de remendos e alterado por MP em 1996 e que por isso mesmo PRECISAVA ser reformado (na visão dos ruralistas), tinha como princípio orientador, estabelecido em seu artigo 1°, a proteção das florestas brasileiras, bens de uso comum a todos, e impunha a limitação do exercício do direito de propriedade para isso. Ao relatar o código na desastrosa comissão especial da Câmara, em 2009, o deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP) deve ter achado que esse negócio de “bem de uso comum” e “limitação do exercício do direito de propriedade” era coisa de comunista e resolveu baixar a bola do artigo 1°. No texto que saiu da Câmara em maio de 2011 para o Senado, o Código Florestal dispunha apenas sobre “as área de preservação permanente e a reserva legal”.
O que isso significa? TUDO. No mundo maravilhoso dos advogados, o princípio tem precedência sobre a própria lei. Qualquer dúvida judicial sobre a aplicação do código (e, acredite, haverá várias) pode ser decidida por juízes ou procuradores com base nos princípios. Ao destituí-lo destes, Aldo transformou uma lei ambiental numa mera disciplinadora de atividades rurais (tipo “estupra, mas não mata”). In dubio, pro motosserra. O Senado corretamente reviu isso e devolveu o caráter ambiental à lei, enfiando-lhe oito princípios, como evitar as mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável. In dubio, pro floresta. A Câmara não achou a menor graça e devolveu no segundo turno de votação o texto original.
Dilma, como você pode imaginar, não é nenhuma Rachel Carson. Não dava a menor importância para o código, apesar da promessa de campanha, um tanto vaga e feita só para a Marina sair do pé dela, de não “anistiar desmatadores”. O governo não tinha opinião formada sobre o artigo 1°, e até a reta final da segunda tramitação na Câmara achava que daria muito bem para passar sem ele. Dilma chegou a dar aval a um acordo que anistiava desmate em APP de proprietários de até 1.500 hectares. O que a fez voltar atrás? A Rio +20.
No exterior, pegou mal pacas a hesitação do Planalto em torno da lei e a aprovação do Código
Daí a volta triunfal do Artigo 1° do Senado e o veto ao 61. A bola agora volta a quicar na quadra dos parlamentares, que, embora finjam não ter curtido a recuperação de APP, estão injuriados mesmo é com os princípios. A ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) tem pressa para aprovar logo a MP 571, que restaura os vetos ao código e complementa-o com outras provisões do texto do Senado. Izabella sabe que, depois de 22 de junho, a carruagem vira abóbora de novo.
PS: o novo Código Florestal é uma legislação parcialmente vetada e remendada por MP, que nem o antigo. Por que este Frankenstein vale e o outro não valia?
PS2: prova do que eu estou dizendo são as invectivas dos ruralistas contra o Artigo 1°, vocalizadas no blog de Ciro Siqueira, com quem mantenho uma discordância mais ou menos respeitosa.
sexta-feira, 8 de junho de 2012
Os Negadores das Mudanças Climáticas encontram uma Radical à Altura: a Natureza!
by Alexandre Araújo Costa (Facebook) on Thursday, June 7, 2012 at 9:50pm ·
O
título alternativo deste artigo bem poderia conter “o IPCC é fichinha”
ou, de forma mais inclusiva, “Cientistas do Clima somos fichinha”. Isto
porque, de fato, o embate entre nós e os negadores está longe de ser
justo.
A clareza de entendimento em torno da mudança climática atual, do papel antrópico determinante e do risco envolvido foi fruto dessa acumulação de evidências. Apoiando-se em conhecimentos mais fundamentais da Física, da Química, da Astronomia, da Biologia, da Geologia e das interfaces entre elas, e sobre uma colossal quantidade de dados, análises, modelos de diversos níveis de complexidade é que a Ciência do Clima erigiu seu edifício. Nesse contexto, quando as peças se encaixam, a quantidade (as múltiplas informações parciais, mas convergentes) se transforma em qualidade (a “Big Picture”), no quebra-cabeça montado, demonstrado várias e várias vezes nos relatórios de avaliação do IPCC.
Por
outro lado, os negadores não seguem as regras do debate e do método
científicos. Pelo contrário, atacam-nos, sem cerimônia. É possível fazer
qualquer afirmação tresloucada em um blog, em uma palestra, em um
“debate” (desses que mais parecem debate eleitoral) ou em uma aparição
na mídia. A liberdade para mentir, fantasiar, tergiversar nesses casos é
quase infinita e para quem tem compromisso com a verdade científica, é
difícil dar conta até de uma pequena parcela dessas mentiras,
falsificações e tergiversações. Explicar porque determinada afirmação é
falsa dá muito mais trabalho do que fazê-la. Desnudar inveracidades,
desmistificar o “cherry-picking” (o ato de escolher um dado entre mil
que aparentemente serve de base para uma dada afirmação), localizar
sofismas não é trivial no pouco tempo ou espaço que se tem nesse
terreno. É desse terreno que os negadores gostam. É por meio dele, e não
de um debate verdadeiramente científico e honesto, que eles tentam
envenenar a opinião pública e os tomadores de decisão. Deveriam se
envergonhar. Mas não! Nesse terreno, um negador que seja um orador (ou
escritor) talentoso, cujo semblante não trema, mesmo quando faz
afirmações obviamente mentirosas como “o efeito estufa não existe” ou
“os modelos de clima não consideram as correntes oceânicas”, deita e
rola.
Poucos cientistas, portanto, terminam por entrar
nessa arena de gládio, para encararem o vale-tudo dos negadores.
Individualmente, nada se ganha ao fazê-lo, pelo contrário. Perde-se
tempo e energia que poderia estar sendo dedicada à pesquisa e à produção
científica (que infelizmente é avaliada segundo métricas quantitativas
que nem sempre refletem a real contribuição à ciência). Há também os
cientistas que acham que não é seu papel popularizar a ciência ou sequer
combater a pseudo-ciência e a anti-ciência junto ao público. Por fim,
há um fator que não se deve desprezar. Pela virulência dos ataques e
pelo grau acentuado de desonestidade dos negadores, muitos dos meus
pares simplesmente preferem não lutar no terreno deles. É preciso,
realmente, muito estômago!
Mas felizmente, os negadores
têm um adversário à altura, que não precisa, como nós, caminhar sobre
ovos! Um adversário duro, bruto, que vai direto ao assunto, que não se
intimida, que não faz juízo de valor, que não tem ideologia. É esse
adversário, e não o IPCC e o restante da comunidade da Ciência do Clima,
quem tem feito o contraponto mais cristalino aos negadores. Chama-se Natureza!
Esta não tem de se preocupar em testar múltiplas vezes suas próprias
hipóteses, nem em revisar, em um processo lento, uma análise sobre suas
próprias leis. Ela simplesmente é. Simplesmente se comporta de acordo
com suas próprias regras. Simplesmente faz! E bate duro na negação!
Chequemos, portanto, o que a Natureza nos tem afirmado. No que diz respeito às projeções do IPCC de temperatura, feitas quando da preparação do seu 4o relatório, estas têm-se confirmado de forma bastante clara, como mostra a Figura a seguir, obtida em http://www.realclimate.org/index.php/archives/2012/02/2011-updates-to-model-data-comparisons/.
A região cinza nessa Figura representa a faixa de projeções do conjunto do IPCC (de tal modo que 95% das previsões se encontra dentro dela). A linha preta é a média delas. As linhas coloridas representam observações da temperatura média global, de acordo com 3 centros de pesquisa. Baixa atividade solar e ocorrência mais frequente de La Niñas (situação em que o Pacífico Equatorial esfria) nos últimos anos podem ter diminuído a velocidade do aquecimento verificada nos anos 90, mas o que assusta é que, em condições como as dos últimos anos, nós deveríamos ter observado um resfriamento do sistema terrestre! Ou seja, ficamos com o nó na garganta, esperando o que pode vir no próximo período em que uma maior atividade solar coincidir com uma maior frequência de El Niños (quando o Pacífico Equatorial se aquece)... Tudo indica que, neste caso, ao invés de aumentarem num ritmo um pouco abaixo, mas próximo ao da média do conjunto dos modelos do IPCC, as temperaturas voltem a mostrar um aumento pronunciado.
Na verdade, mesmo que tivéssemos observado uma constância nas temperaturas ou mesmo um ligeiro resfriamento nos últimos anos, isso não poderia servir de argumento para os negadores! La Niñas e sol pouco ativo deveriam ter servido para resfriar o planeta, o que obviamente não aconteceu em função da contribuição antrópica. As figuras que mostro a seguir são para explicar, de forma didática, a sobreposição dessas duas contribuições (natural e humana). Os processos naturais, a princípio, poderiam ser considerados cíclicos, ou quase cíclicos. Há muitos ciclos, de diferentes frequências e uma boa dose de “caos” (que dá um cara de aleatoriedade a alguns processos climáticos), mas por simplicidade, assumiremos uma oscilação simples, com a temperatura subindo durante alguns anos, descendo nos anos seguintes, depois voltando a subir, e assim por diante, como na figura abaixo.
Mas existe a contribuição do homem, que é obviamente de aquecimento (como já discuti, acumular CO2 e outros gases de efeito estufa na atmosfera não tem como produzir outra coisa!). Isso seria representado por uma curva ascendente, isto é, com a temperatura sempre subindo. Como a contribuição antrópica tem-se acelerado, um gráfico da contribuição “puramente humana” poderia ter a aparência desta curva aqui:
Somando as duas contribuições, isto é, a “natural”, representada pela primeira curva e a “antrópica”, pela segunda, o que se verifica é algo bastante interessante, ilustrando em parte o que já se viu e em parte o que se deve esperar no futuro. No começo (faixa azul), o sinal humano é muito pequeno e as oscilações naturais dominam por inteiro. No período imediatamente posterior, as oscilações naturais ainda se destacam, mas o sinal humano cresce, tornando-se discernível, mesmo sendo ainda relativamente pequeno. Em seguida (faixa laranja), temos algo como aumentos acelerados de temperatura, alternados com períodos de poucas variações. No meu ponto de vista, estamos ainda nessa fase, mas duas coisas devem ser ditas. No próximo ciclo em que o sinal humano e o sinal natural estiverem ambos contribuindo para o aquecimento (como no local indicado pela seta, em nossa caricatura abaixo), deveremos experimentar um aquecimento mais acelerado do sistema climático do que aquele verificado nos anos 90. Mais ainda! No período posterior (faixa vermelha), o sinal antrópico tende a ser dominante! Isso é representado pelo final do gráfico, em que mesmo quando tivermos condições naturais (sol menos ativo, ocorrência maior de La Niñas), o aquecimento praticamente não desacelera!
Mas são outros componentes do sistema climático terrestre que, por sofrerem menos influência de oscilações naturais de alta frequência do que a atmosfera, têm-se mostrado ainda mais veementes ao “negarem a negação”.
Comparemos primeiro as projeções de elevação do nível do mar com o que tem acontecido na realidade. É fácil verificar que apenas o modelo mais "pessimista" ou "catastrofista" (não gosto desses juízos de valor) tem acompanhado a realidade (vide http://www.global-warming-forecasts.com/resources/sea-level-increase.png , reproduzida abaixo e http://www.skepticalscience.com/images/SLR_models_obs.gif). Nessa figura, as observações (representadas pelas linhas vermelha - marégrafos - e azul - satélite) estão sistematicamente acima da faixa cinza, que contém a maioria das projeções de modelos. Outro processo que tem mostrado uma realidade pior do que a das projeções do último relatório do IPCC é a do degelo do Ártico, como mostrado em http://www.realclimate.org/images/seaice11.jpg e aqui reproduzido. O degelo real (linha vermelha) tem sido mais acelerado do que qualquer projeção dos modelos (várias outras linhas). Ainda que, nesses dois casos, outros processos que não o aquecimento global antrópico possam ter contribuído para acelerar as mudanças (elevação do nível do mar e degelo) para além das piores projeções feitas pelo IPCC, a Natureza tem falado alto. A humanidade, ridiculamente, faz ouvidos moucos.
Um dos paleoclimatologistas mais respeitados do mundo e um cientista de atuação inspiradora e contangiante, o Prof. Richard Alley, da Pennsylvania State University, costuma colocar a questão de forma muito simples. A realidade pode, sim, não ser tão ruim quanto o apresentada pelo IPCC que é baseada, como mostrei em meu texto anterior (aqui), em estimativas médias de várias quantidades, processos e fenômenos.
Mas é fundamental dizer que tem a mesma chance de ser ainda pior e se o que mostrei podem não ser indícios totalmente claros nesse sentido, deveriam ao menos servir de alerta! Não agir para reduzir globalmente as emissões de gases de efeito estufa é, em tais condições, uma postura de total irracionalidade, irresponsabilidade e desprezo para com os direitos e aspirações das gerações futuras!
Postado pelo autor no facebook. Veja comentarios aqui
Corporações x ciência: um jogo sujo
Em sua coluna de maio, Jean Remy Guimarães comenta as
estratégias usadas por certos setores da indústria para enfraquecer
evidências científicas que contrariam seus interesses e cita o exemplo
de um documento divulgado recentemente que questiona o aquecimento
global.
Publicado em 18/05/2012
|
Atualizado em 18/05/2012
Cena do filme ‘Obrigado por fumar’ (2005), cujo
protagonista, principal porta-voz da indústria do tabaco, passa a
manipular informações de forma a transmitir uma imagem benéfica do
cigarro em programas de TV. (imagem: reprodução)
Estamos testemunhando uma verdadeira guerra midiática em torno da
questão das mudanças climáticas e sua relação com atividades humanas
como a emissão de gases de efeito estufa. A chamada ciência do clima
está sob fogo cerrado das corporações cuja operação implica a emissão
desses gases.
A grande mídia comenta relatórios como os do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que reúnem observações, conclusões, previsões e recomendações de alguns milhares de climatologistas de todo o mundo. Mas, diante da ignorância generalizada sobre a ciência e seus métodos, basta a opinião ou eventual evidência científica de dois ou três céticos com cargos pomposos para criar a dúvida, mesmo que estes não entendam bulhufas de clima.
Então não há consenso sobre o tema? Mudemos de canal. Poucos se dispõem a ler relatórios de 3 mil páginas. E não dá para levar o coletivo do IPCC para o show do Larry King na CNN (canal de notícias norte-americano).
Se hoje CO2, metano e óxido nitroso são as bolas da vez,
já vimos o mesmo filme no caso do tabaco, do amianto, do chumbo, da
talidomida, do benzeno, do cloreto de vinil, do cromo, do formol, do
arsênico, da atrazina, do mercúrio, do Vioxx e muitos et ceteras.
E veremos de novo, sempre que algum governo cogitar regular alguma
substância suspeita de provocar danos à saúde pública, seja ela
ocupacional ou ambiental.
Sabotar a ciência tornou-se um elemento rotineiro da política, em particular da norte-americana, com reflexos em praticamente todos os demais países. Bombardear tribunais e agências reguladoras com tsunamis de informação científica duvidosa é uma estratégia corporativa que sempre funciona, pelo menos por algum tempo. Contratar mercenários da ciência sob demanda é outra. A missão deles é inflar artificialmente as incertezas associadas às evidências científicas, evitando ou atrasando assim qualquer medida para a proteção da população.
Os primeiros arquitetos dessa estratégia foram executivos da indústria do tabaco. Já em 1969, afirmavam em memorandos internos: “Nosso produto é a dúvida, pois é a melhor forma de competir, na mente do público, com as evidências. É também uma forma de criar controvérsia”.
No caso da ‘controvérsia’ atual sobre o clima, as claras evidências sobre o aquecimento global em curso, tais como o derretimento das calotas polares e das geleiras à vista de todos, são escamoteadas por enxurradas de questionamentos sobre os métodos computacionais de previsão do aquecimento futuro.
As estratégias corporativas de fabricação da dúvida são dissecadas com precisão de médico-legista por David Michaels ao longo das 359 páginas de seu livro Doubt is their product: how industry's assault on science threatens your health (A fabricação da dúvida ou como o ataque da indústria à ciência ameaça sua saúde, em tradução livre), publicado em 2008 pela Oxford University Press. O autor foi membro do departamento de energia norte-americano durante a administração de Bill Clinton e é atualmente professor associado no Departamento de Saúde Ocupacional e Ambiental da Universidade George Washington, nos Estados Unidos. O quadro documentado é tão obscurantista que, em resenha da obra, Chris Mooney, também autor de um livro sobre o tema, chega a se perguntar para que serviu termos passado pelo Iluminismo.
As agências reguladoras são os alvos preferenciais do assédio dos fabricantes da dúvida, que as transformaram no equivalente burocrático de artérias entupidas, segundo Chris Mooney. Mas o sistema judicial também é vítima das mesmas táticas.
Decisões da Suprema Corte dos Estados Unidos em 1993, por exemplo,
atribuíram aos juízes locais o poder de decidir o que é boa ciência ou
não em casos civis. Mas a ciência em si dificilmente chega ao
conhecimento do júri, já que sobram recursos para que ela seja eliminada
logo nas etapas iniciais do processo.
A diferença em relação à época de Galileu é que hoje se tortura a ciência e não os cientistas. David Michaels propõe várias medidas para mudar esse quadro, entre elas: facilitar o acesso à justiça pelos cidadãos, já que eles pouco podem esperar das agências reguladoras; exigir a divulgação de qualquer conflito de interesse e desconsiderar os estudos assim produzidos; e recuperar o saudável hábito de levar em conta as melhores evidências disponíveis para proteger a saúde e o bem-estar públicos, em vez de esperar pela incerteza zero que jamais virá.
O artigo é um portfólio resumido de como as corporações atacam para se defender em debates sobre temas que consideram prejudiciais a seu negócio. Começa alinhando alguns ‘fatos científicos’. Por exemplo: ‘não teria havido aquecimento nos últimos 10 anos’ (veja prova do contrário). Isso é reconhecer implicitamente que não há dúvidas sobre o aquecimento de 10 anos para trás. Além disso, não se diz de onde viria essa conclusão, e nem por que as geleiras teimam em seguir derretendo.
Logo depois, a pérola: ‘o CO2 não é um poluente’. Ninguém disse que era. É um gás asfixiante. Mas você só vai desmaiar inalando uma atmosfera com 7% a 10 % de CO2 e, por enquanto, a concentração desse gás no ar é de cerca de 400 ppm (0,04%). A questão não é essa.
Outro absurdo: ‘o aumento do CO2 estimularia a produtividade agrícola’. Um bom entendedor concluirá que a redução das emissões vai provocar fome. E mais adiante se acusa a descarbonização da economia de não ser rentável, causar aumento de impostos e burocracia (regulação?) e – pecado supremo – privar os pobres países pobres dos 50 anos de prosperidade que os esperam caso se deixe tudo como está.
Esse futuro promissor estaria sendo ameaçado pelo totalitarismo alarmista do ‘establishment internacional do aquecimento’, que só quer descolar mais verbas para pesquisas acadêmicas e burocracia (regulação?) e mais doações para organizações não governamentais salvacionistas.
Não faltaram menções a Trofim Lysenko, o geneticista russo aloprado que caiu nas graças do líder da União Soviética Josef Stalin. Subtexto? Os cientistas do clima também são aloprados e seus governos também são ditatoriais. O texto termina (ufa!) com um recado explícito aos candidatos à presidência dos Estados Unidos para que ouçam o apelo dos 16 ‘cientistas de renome’ que assinam o libelo e ignorem qualquer sugestão de controle das emissões de carbono. Os nomes dos 16 e suas afiliações são então listados.
De fato, a lista impressiona qualquer leigo, mas não resiste a um
crivo mais superficial. O balaio de gatos junta vários físicos
estudiosos de fugidias partículas subatômicas, um professor de
marketing, um químico especialista em macromoléculas, astronautas (sic),
um cardiologista, um ex-executivo da multinacional de petróleo e gás
ExxonMobil, um físico especialista em ótica adaptativa (adorei o termo,
muito adequado) que achou natural testemunhar no congresso
norte-americano sobre temas agronômicos, um geólogo e vários aposentados
e ex-isso ou ex-aquilo. Alguns membros do grupo são ativistas assumidos
do ceticismo climático.
Mas o fato realmente importante é que dos 16, apenas três têm credenciais mínimas para opinar sobre o assunto, como possuir PhD, experiência e/ou publicações em revistas com comitê de leitura na área em questão.
Apesar de todos esses argumentos, as corporações manterão seu curso e seus métodos. O link do artigo acima referido já está aqui e ali na Wikipédia, o Wall Street Journal tem mais de 17 leitores e eles não visitam esta coluna.
Tudo bem, cada um sabe as companhias que escolhe. Com duplo sentido, por favor.
Jean Remy Davée Guimarães
Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Do site Ciencia Hoje
A grande mídia comenta relatórios como os do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que reúnem observações, conclusões, previsões e recomendações de alguns milhares de climatologistas de todo o mundo. Mas, diante da ignorância generalizada sobre a ciência e seus métodos, basta a opinião ou eventual evidência científica de dois ou três céticos com cargos pomposos para criar a dúvida, mesmo que estes não entendam bulhufas de clima.
Então não há consenso sobre o tema? Mudemos de canal. Poucos se dispõem a ler relatórios de 3 mil páginas. E não dá para levar o coletivo do IPCC para o show do Larry King na CNN (canal de notícias norte-americano).
Bombardear tribunais e agências reguladoras com informação científica duvidosa é uma estratégia corporativa que sempre funciona
Sabotar a ciência tornou-se um elemento rotineiro da política, em particular da norte-americana, com reflexos em praticamente todos os demais países. Bombardear tribunais e agências reguladoras com tsunamis de informação científica duvidosa é uma estratégia corporativa que sempre funciona, pelo menos por algum tempo. Contratar mercenários da ciência sob demanda é outra. A missão deles é inflar artificialmente as incertezas associadas às evidências científicas, evitando ou atrasando assim qualquer medida para a proteção da população.
Os primeiros arquitetos dessa estratégia foram executivos da indústria do tabaco. Já em 1969, afirmavam em memorandos internos: “Nosso produto é a dúvida, pois é a melhor forma de competir, na mente do público, com as evidências. É também uma forma de criar controvérsia”.
Como fabricar a dúvida
Todas as ciências são vulneráveis a esse tipo de ataque, uma vez que lidar com a incerteza é sua característica intrínseca. Qualquer estudo é sujeito a crítica, legítima ou não. A receita para enfraquecer até as conclusões científicas mais robustas é simples: destaque seletivamente as incertezas, ataque os principais estudos um por um e, o mais importante, ignore sistematicamente o peso de suas evidências.No caso da ‘controvérsia’ atual sobre o clima, as claras evidências sobre o aquecimento global em curso, tais como o derretimento das calotas polares e das geleiras à vista de todos, são escamoteadas por enxurradas de questionamentos sobre os métodos computacionais de previsão do aquecimento futuro.
As estratégias corporativas de fabricação da dúvida são dissecadas com precisão de médico-legista por David Michaels ao longo das 359 páginas de seu livro Doubt is their product: how industry's assault on science threatens your health (A fabricação da dúvida ou como o ataque da indústria à ciência ameaça sua saúde, em tradução livre), publicado em 2008 pela Oxford University Press. O autor foi membro do departamento de energia norte-americano durante a administração de Bill Clinton e é atualmente professor associado no Departamento de Saúde Ocupacional e Ambiental da Universidade George Washington, nos Estados Unidos. O quadro documentado é tão obscurantista que, em resenha da obra, Chris Mooney, também autor de um livro sobre o tema, chega a se perguntar para que serviu termos passado pelo Iluminismo.
As agências reguladoras são os alvos preferenciais do assédio dos fabricantes da dúvida, que as transformaram no equivalente burocrático de artérias entupidas, segundo Chris Mooney. Mas o sistema judicial também é vítima das mesmas táticas.
É preciso recuperar o saudável hábito de levar em
conta as melhores evidências disponíveis para proteger a saúde e o
bem-estar públicos
A diferença em relação à época de Galileu é que hoje se tortura a ciência e não os cientistas. David Michaels propõe várias medidas para mudar esse quadro, entre elas: facilitar o acesso à justiça pelos cidadãos, já que eles pouco podem esperar das agências reguladoras; exigir a divulgação de qualquer conflito de interesse e desconsiderar os estudos assim produzidos; e recuperar o saudável hábito de levar em conta as melhores evidências disponíveis para proteger a saúde e o bem-estar públicos, em vez de esperar pela incerteza zero que jamais virá.
Wall Street e os 16 que eram três
Se você quer um exemplo concreto e recente de manipulação explícita, não perca a aula magna que é o artigo de opinião publicado pelo Wall Street Journal em 26/01/2012. O texto é sugestivamente intitulado ‘No need to panic about global warming’ (em tradução livre, ‘Não há necessidade de pânico em relação ao aquecimento global’), com o subtítulo também sugestivo ‘Não há argumentos científicos convincentes para a descarbonização drástica da economia mundial’.O artigo é um portfólio resumido de como as corporações atacam para se defender em debates sobre temas que consideram prejudiciais a seu negócio. Começa alinhando alguns ‘fatos científicos’. Por exemplo: ‘não teria havido aquecimento nos últimos 10 anos’ (veja prova do contrário). Isso é reconhecer implicitamente que não há dúvidas sobre o aquecimento de 10 anos para trás. Além disso, não se diz de onde viria essa conclusão, e nem por que as geleiras teimam em seguir derretendo.
Logo depois, a pérola: ‘o CO2 não é um poluente’. Ninguém disse que era. É um gás asfixiante. Mas você só vai desmaiar inalando uma atmosfera com 7% a 10 % de CO2 e, por enquanto, a concentração desse gás no ar é de cerca de 400 ppm (0,04%). A questão não é essa.
Outro absurdo: ‘o aumento do CO2 estimularia a produtividade agrícola’. Um bom entendedor concluirá que a redução das emissões vai provocar fome. E mais adiante se acusa a descarbonização da economia de não ser rentável, causar aumento de impostos e burocracia (regulação?) e – pecado supremo – privar os pobres países pobres dos 50 anos de prosperidade que os esperam caso se deixe tudo como está.
Esse futuro promissor estaria sendo ameaçado pelo totalitarismo alarmista do ‘establishment internacional do aquecimento’, que só quer descolar mais verbas para pesquisas acadêmicas e burocracia (regulação?) e mais doações para organizações não governamentais salvacionistas.
Não faltaram menções a Trofim Lysenko, o geneticista russo aloprado que caiu nas graças do líder da União Soviética Josef Stalin. Subtexto? Os cientistas do clima também são aloprados e seus governos também são ditatoriais. O texto termina (ufa!) com um recado explícito aos candidatos à presidência dos Estados Unidos para que ouçam o apelo dos 16 ‘cientistas de renome’ que assinam o libelo e ignorem qualquer sugestão de controle das emissões de carbono. Os nomes dos 16 e suas afiliações são então listados.
Dos 16 cientistas que assinam o artigo, apenas três têm credenciais mínimas para opinar sobre o assunto
Mas o fato realmente importante é que dos 16, apenas três têm credenciais mínimas para opinar sobre o assunto, como possuir PhD, experiência e/ou publicações em revistas com comitê de leitura na área em questão.
Apesar de todos esses argumentos, as corporações manterão seu curso e seus métodos. O link do artigo acima referido já está aqui e ali na Wikipédia, o Wall Street Journal tem mais de 17 leitores e eles não visitam esta coluna.
Tudo bem, cada um sabe as companhias que escolhe. Com duplo sentido, por favor.
Jean Remy Davée Guimarães
Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Do site Ciencia Hoje
78% dos brasileiros não sabem o que é a Rio+20
O levantamento também indicou que o meio ambiente é apenas o sexto principal problema do Brasil, apontado por 13% dos entrevistados
São Paulo - Um estudo divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente na
manhã desta quarta-feira revelou que 78% da população brasileira
desconhece a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável, a Rio+20.
A pesquisa "O que o brasileiro pensa do meio ambiente e do consumo
sustentável" ouviu mais de 2 mil pessoas de todo o País. O levantamento
também indicou que o meio ambiente é apenas o sexto principal problema
do Brasil, apontado por 13% dos entrevistados. A situação da saúde (81%)
é a maior preocupação, seguida da violência (65%) e do desemprego
(34%).
Mesmo com os baixos índices, a ministra do Meio Ambiente Izabella
Teixeira destacou que houve crescimento em relação às últimas pesquisas.
Na Eco 92, quando foi realizada a primeira pesquisa, apenas 6% dos
brasileiros conheciam o evento. Hoje, são 22%. "Em 1992, o meio ambiente
sequer aparecia na lista de prioridades. Considerando que estamos
falando de todo o Brasil, este índice não é baixo. Ele representa 40
milhões de pessoas", afirmou.
De acordo com o novo levantamento do Ministério, os brasileiros também desconhecem os principais conceitos discutidos no evento. A noção de consumo sustentável é ignorada por 66% do público, e o desenvolvimento sustentável por 55% da população. Os pesquisadores percorreram casas em áreas urbanas e rurais de todas as regiões e entrevistaram pessoas maiores de 16 anos. "É muito preocupante que a população não esteja alertada. Se ela não assume sua responsabilidade cidadã, nós efetivamente não vamos conseguir alterar o padrão em que a gente vive", afirmou Moema Miranda, uma das organizadoras da Cúpula dos Povos. "É como se isso não afetasse as pessoas no cotidiano".
fonte: web site exame.com
De acordo com o novo levantamento do Ministério, os brasileiros também desconhecem os principais conceitos discutidos no evento. A noção de consumo sustentável é ignorada por 66% do público, e o desenvolvimento sustentável por 55% da população. Os pesquisadores percorreram casas em áreas urbanas e rurais de todas as regiões e entrevistaram pessoas maiores de 16 anos. "É muito preocupante que a população não esteja alertada. Se ela não assume sua responsabilidade cidadã, nós efetivamente não vamos conseguir alterar o padrão em que a gente vive", afirmou Moema Miranda, uma das organizadoras da Cúpula dos Povos. "É como se isso não afetasse as pessoas no cotidiano".
fonte: web site exame.com
quinta-feira, 7 de junho de 2012
A Destruição das Florestas do Cinturão Verde de São Paulo
A vida na cidade depende dessas florestas, elas limpam o
ar, regulam o clima e produzem água para 20 milhões de pessoas.
A prefeitura da Estância Turística de Embu das Artes acaba de modificar o Plano Diretor da cidade, autorizando a instalação de indústrias e galpões de logística em toda a área florestada do município. Permite usos industriais inclusive na Área de Proteção Ambiental (APA) Embu Verde e na Área de Proteção aos Mananciais da Guarapiranga, esta última responsável pelo abastecimento de água para 4 milhões de paulistanos.
Vamos dar um BASTA para a destruição irresponsável do meio ambiente.
Assine a petição que será encaminhada aos órgãos de Justiça do Estado e da União: PELA ANULAÇÃO DO NOVO PLANO DIRETOR DE EMBU DAS ARTES.
Embu das Artes faz parte da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de SP, declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco/ONU. A cidade ainda apresenta grandes porções de Mata Atlântica preservada, onde foram encontradas espécies animais e vegetais em risco de extinção.
O novo plano condena à morte, em poucos anos, não só as florestas de Embu, mas a própria vocação da cidade para as artes, história e turismo. Essa vocação será desfigurada às vésperas dos grandes eventos esportivos no Brasil. A prefeitura pretende transformar Embu em cidade industrial, justo nesse ano eleitoral. Um retrocesso inaceitável para o século 21.
O problema não para por aí. Outros municípios da RMSP poderão seguir esse mau exemplo, pois estão igualmente sujeitos à pressão dos especuladores imobiliários, principalmente depois do prolongamento do Rodoanel Mario Covas.
Sem a Reserva da Biosfera de SP, a vida na cidade continuará a se degenerar. Tempestades, inundações, ilhas de calor e poluição já estão incorporados ao dia a dia do paulistano, mas não sem sofrimento.
Vamos elevar o nível da apelação, trazendo milhões de vozes em protesto: Salve Embu das Artes! Salve a Reserva da Biosfera de São Paulo! O Futuro pertence a todos nós!
Wilson, Paulo, Milena, Rodolfo, Paula
Mais informações:
Jornal Salve Embu das Artes – Ed. especial da RBCVSP
http://salveembudasartes.com. br/?p=1461
Entrevista Ricardo Cardim rádio Estadão/ESPN
http://radio.estadao.com.br/ audios/audio.php?idGuidSelect= 99A5D575EB7541B9B560C0382AB32E 06
Reportagem Estadão 18/04/2012
http://salveembudasartes.com. br/?p=1241
http://www.avaaz.org/po/ petition/CINTURAO_VERDE_DE_ SAO_PAULO_PEDE_SOCORRO/?tta
A prefeitura da Estância Turística de Embu das Artes acaba de modificar o Plano Diretor da cidade, autorizando a instalação de indústrias e galpões de logística em toda a área florestada do município. Permite usos industriais inclusive na Área de Proteção Ambiental (APA) Embu Verde e na Área de Proteção aos Mananciais da Guarapiranga, esta última responsável pelo abastecimento de água para 4 milhões de paulistanos.
Vamos dar um BASTA para a destruição irresponsável do meio ambiente.
Assine a petição que será encaminhada aos órgãos de Justiça do Estado e da União: PELA ANULAÇÃO DO NOVO PLANO DIRETOR DE EMBU DAS ARTES.
Embu das Artes faz parte da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde de SP, declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco/ONU. A cidade ainda apresenta grandes porções de Mata Atlântica preservada, onde foram encontradas espécies animais e vegetais em risco de extinção.
O novo plano condena à morte, em poucos anos, não só as florestas de Embu, mas a própria vocação da cidade para as artes, história e turismo. Essa vocação será desfigurada às vésperas dos grandes eventos esportivos no Brasil. A prefeitura pretende transformar Embu em cidade industrial, justo nesse ano eleitoral. Um retrocesso inaceitável para o século 21.
O problema não para por aí. Outros municípios da RMSP poderão seguir esse mau exemplo, pois estão igualmente sujeitos à pressão dos especuladores imobiliários, principalmente depois do prolongamento do Rodoanel Mario Covas.
Sem a Reserva da Biosfera de SP, a vida na cidade continuará a se degenerar. Tempestades, inundações, ilhas de calor e poluição já estão incorporados ao dia a dia do paulistano, mas não sem sofrimento.
Vamos elevar o nível da apelação, trazendo milhões de vozes em protesto: Salve Embu das Artes! Salve a Reserva da Biosfera de São Paulo! O Futuro pertence a todos nós!
Wilson, Paulo, Milena, Rodolfo, Paula
Mais informações:
Jornal Salve Embu das Artes – Ed. especial da RBCVSP
http://salveembudasartes.com.
Entrevista Ricardo Cardim rádio Estadão/ESPN
http://radio.estadao.com.br/
Reportagem Estadão 18/04/2012
http://salveembudasartes.com.
http://www.avaaz.org/po/
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