16, novembro, 2011
Os senadores Romero Jucá (PMDB/RR) e Gim Argelo (PTB/DF) apresentaram uma emenda ao projeto de alteração do Código Florestal, onde defendem a tese da criação de “um espaço, com vocação agrícola inquestionável, correspondente a 1/5 da área dos estados situados na Amazônia Legal”.
O conceito de vocação tem uma profunda relação com a filosofia cristã. O capitalismo se apropriou deste conceito que passou a ter como função principal a de induzir as pessoas a se manterem e se especializarem em determinados ramos da economia. O que era vendido como um talento pessoal, em um determinado momento começou a servir para classificar territórios, relações e coisas. Esta opção política permitiu a criação de sistema de mercado, hoje completamente internacionalizado.
O mantra da “vocação agrícola” continua até os dias de hoje. Nas discussões de alteração do Código Florestal no Senado Federal ouve-se, de forma recorrente, a expressão “vocação agrícola”. Os senadores Romero Jucá (RO) e Gim Argelo (DF) apresentaram uma emenda ao projeto que prevê a criação de “um espaço, com vocação agrícola inquestionável, correspondente a 1/5 da área dos estados situados na Amazônia Legal”.
A proposta parte da premissa de que o aumento da produção agrícola depende da criação de um espaço correspondente a 1/5 da área dos estados, não considerando as áreas já desmatadas. Por isso, os legisladores utilizam a expressão “inquestionável”. Leia-se: liberados da fiscalização dos órgãos ambientais e imunes às multas. Os congressistas propõem que este ‘espaço vocacionado’, a ser criado por meio de Zoneamento Ecológico-Econômico, será delimitado por órgão competente, mas não indica se esses órgãos serão federais ou estaduais. Nem as regras e procedimentos para sua delimitação.
Para atrair o apoio da agricultura familiar para essa tese vocacional a proposição mantém a desobrigação das propriedades até quatro módulos fiscais de recomporem a reserva legal. Para as propriedades acima de quatro módulos, a compensação pelo restabelecimento e manutenção da área de reserva legal “poderá ser cumprida mediante contribuição financeira para fundo público”. Esta proposição de compensar financeiramente a obrigatoriedade de recompor a reserva legal está tanto na proposta aprovada na Câmara quanto no substitutivo apresentado pelo relator Senador Luís Henrique (PMDB/SC).
A modalidade de compensar a área desmatada por uma contribuição financeira (art.38, III) foi pouco questionada e foge às normas gerais que se propõe a proteção da vegetação, áreas de preservação permanente e as áreas de Reserva Legal. Apesar das disposições gerais preverem “instrumentos econômicos e financeiros para o alcance dos objetivos”, em geral, estão voltados mais para implementar um sistema de pagamento de serviços ambientais do que para servir como opção aos proprietários que desmataram e não possuem áreas para compensar as derrubadas de matas nativas.
O Senado Federal está revisando não só a proposta aprovada pela Câmara dos Deputados, mas também as emendas e interpretações que desviam o texto dos objetivos do Código Florestal. Espera-se que proposições como esta dos senadores Romero Jucá e Gim, baseada na ideia da “vocação do desmatamento”, não sejam contempladas pelo relator.
Edélcio Vigna, assessor do Inesc