quinta-feira, 20 de junho de 2013

Manifestações: a falência da representação

20/06/2013 - 03h00

FSP José Luiz Portela

Muita gente diz não entender ainda o que está acontecendo. Não é fácil, pois o movimento é heterogêneo. Não tem a simplicidade nem a linearidade das causas únicas. Há muita coisa lá dentro. Tanto em reivindicações, como em sentimentos.
Demorou, veio em turbilhão, com tudo junto, misturado. Porém, uma coisa é certa: as manifestações marcam a falência do modelo de representação em vigor. Nenhum político é alçado à condição de símbolo. Sem exceção. Nenhum partido nem parlamento. Nenhum representante legitimamente eleito representa o Brasil das ruas.
Vivemos em uma democracia representativa. Partidos foram feitos para representar correntes de pensamento. Aqui, eles existem aos borbotões. O Supremo Tribunal Federal aceitou o modelo "partidos às pencas"; uma equivocada interpretação de que isso seria a democracia. Partidos sem representação alguma, sem votos em várias eleições, que ficam na praça negociando espaços por conta de TV e que recebem fundo partidário.
E, com todos eles, 83% dos jovens são apartidários.
Democracia não é quantidade de partidos. É a quantidade de cidadãos que se sentem representados. Ninguém se sente.
Algo está muito errado. E é o sistema de representação. Com todos os penduricalhos que foram sendo apensados ao longo do tempo, enquanto os líderes políticos repousavam na certeza de que não haveria qualquer questionamento.

Alan Marques - 02.mai.2013/Folhapress
Plenário do Senado Federal vazio
Plenário do Senado Federal vazio
As pessoas cansaram-se de suportar tantas coisas. Cansaram de ser impotentes. E quem deveria lhes dar potência são os respectivos representantes.
O primeiro e principal erro é o sistema proporcional, que separa o eleitor do eleito e aproxima o candidato do agente financiador. Seja ele bom ou mau. Mas é ao financiador que o eleito presta contas. E tenta renovar a confiança. Para se eleger novamente.
A regra do jogo está errada. A melhor solução ao alcance é o voto distrital, que estabelece uma eleição majoritária em cada distrito e obriga o candidato a conviver com seus eleitores, prestar conta para se reeleger.
Outro grande problema que temos engolido é a propaganda política. Em tese, serviria para o eleitor conhecer os candidatos e efetuar a escolha.
É um meio. Passou a ser um fim. Para terem tempo de televisão, os candidatos fazem qualquer coisa para se aliarem a outros partidos. Composições esdrúxulas, encontros constrangedores são a marca da pré-campanha. Tudo isso para entregar, depois, o sacrossanto tempo de propaganda a marqueteiros, que se enriquecem transformando em emoção aquilo que a pesquisa manda o candidato dizer. Pasteurizando as propostas.
Programas de governo, que deveriam ser os fatores a distinguir os candidatos, transformam-se em commodities. E aritmética. Ganha quem faz mais isso ou mais aquilo. É tudo mais do mesmo, com números meio diferentes.

Christophe Simon/AFP
Manifestante convida população a ir para a rua durante protesto contra o aumento do preço das passagens no Rio
Manifestante convida população a ir para a rua durante protesto contra o aumento do preço das passagens no Rio
A verdade é que esse modelo furado faliu. Ninguém no poder fez a lição de casa: bancar com coragem a reforma política. Ela é a mãe de todas as reformas. Porque determina como será o sistema representativo. Quanto melhor ele for, mais os eleitores encontram canais para fazerem valer suas opiniões.
Ganha quem representa melhor a maioria. Atualmente, quase ninguém se sente representado. Eleitos vão e vêm em suas declarações. O Congresso Nacional assiste a tudo em silêncio por não saber como se encaixar na onda de inconformismo que caberia a ele expressar.
As manifestações têm muito a demonstrar, mas, duas coisas, desde logo, ficam claras:
- Recuperamos um tempo perdido. A indignação voltou. E mostrou que vale a pena lutar pelo que se acredita.
- O sistema de representação faliu. Precisamos rapidamente de outro. Precisamos de uma reforma política.