Há algum tempo respondi uma entrevista do Portal Amazônia sobre essa fabrica de água do ar (Ô), veja abaixo.
Portal da Amazônia - a perda de umidade do ar através de um processo como este prejudicaria o ambiente?
Em termos quantitativos, ou volumétricos, não, já que o volume a ser retirado seria insignificante frente aos fluxos de vapor na atmosfera Amazônica (para entender mais sobre isso leia o relatório "O Futuro Climático da Amazônia").
Mas parques industriais suscitam utilização de energia não produzida localmente, o que pode levar (e normalmente leva) a destruição ambiental. As muitas hidrelétricas planejadas para a Amazônia são exemplo deste potencial efeito destrutivo. A Ô promete evitar esse fator complicante através do uso de energias renováveis, principalmente solar fotovoltaica. Mas como se verá abaixo, o investimento proposto não se justifica perante a lógica natural.
Portal da Amazônia - se o empreendimento der certo na Amazônia a iniciativa poderia ser copiada em outros lugares?
Tentar reproduzir com maquinas, que consomem a nobre energia elétrica, processos feitos gratuitamente e abundantemente pela Natureza não me parece uma forma inteligente de interagir com o meio ambiente para obter esse recurso vital (água potável). Além disso, quanto menor a umidade relativa do ar, maior a quantidade de energia necessária na condensação, e menor a quantidade de água extraída. Um clima progressivamente mais árido, como se prevê com a remoção das florestas, inviabilizará completamente este tipo de produção de água a partir do ar continental.
Portal da Amazônia - essa água é realmente adequada para o consumo?
A água da chuva, quando a atmosfera está livre de poluentes (no meio da estação chuvosa na Amazônia por exemplo), tende para a condição de água destilada. Ingerir água destilada produz inúmeros distúrbios na bioquímica do corpo, devido a falta de nutrientes minerais essenciais. Na Natureza, atravessando a floresta, os solos e as camadas geológicas, essa água da chuva passa por elaboradíssimo (e também gratuito) processo de mineralização o que a torna saudável para consumo.
Já quando a atmosfera está contaminada por fumaça, fuligem (na estação seca na Amazônia, por exemplo) e outros componentes tóxicos de poluição urbana, então a água condensada terá os mesmos contaminantes do ar, o que determina a necessidade de caros sistemas de purificação química, que por sua vez aumentam o custo, não garantem qualidade e podem aumentar ainda mais a necessidade de remineralização. E essa ultima, feita sem o concurso das complexíssimas cadeias tróficas dos micro-organismos do solo, também tenderá a ser um arremedo caro do que faz a gratuita e complexa tecnologia da Natureza.
Portal da Amazônia - a poluição do ar influenciaria na qualidade desta água?
Já respondido na questão anterior.
Conclusão:
Não faz sentido montar uma infraestrutura industrial e gastar energia para reproduzir pobre e incompletamente o que a própria Natureza faz abundantemente, de graça e de forma saudável. Se outro empreendedor montasse simples coletores de chuva, e passasse a água coletada por similar tratamento (filtragem e remineralização) teria água idêntica, com zero custo de condensação. Se outro empresario ainda abrisse um poço em solo adequado na mesma região, e passasse a água por simples filtragem, teria água idêntica, com zero custo de condensação e zero custo de remineralização.
Perdoem-me esses empreendedores, que parecem bem intencionados, mas o que vemos nesta iniciativa é o mais puro "vapor de marketing", feito para pegar carona na percepção coletiva de importância dos rios aéreos de vapor para o ciclo hidrológico.